Mario Prata entrevista James Dean, o “animal selvagem”

James Dean. Foto: Reprodução
James Dean – Foto: Reprodução

Qual seria o segredo do ator James Dean, que morreu com 24 anos, há quase 60, e, como Marilyn Monroe, continua a ser pôster da garotada em todo o mundo? Fez apenas três filmes, depois de algumas pontas (algumas até sem falas) nos anos 1950, quando Hollywood vivia seu grande momento de glória. Dizem alguns que assistiram às filmagens que as cenas eram feitas quase que fala a fala, porque era um ator apenas mediano. Mas tinha o carisma de alguns de seus contemporâneos, como Marlon Brando e Paul Newman. Mesmo assim Marlon Brando dizia que ele era um ator médio e muito mal vestido. Já com Paul Newman, parece que aconteceu algo mais além de uma simples amizade.

O termo “Juventude Transviada”, sinônimo da juventude rebelde do pós-guerra americano, deve muito a James Dean. Roupas copiadas dos seus figurinos eram vendidas pelo mundo todo, mal poderia imaginar Brando, o careta. Eu mesmo, pré-adolescente do interior de São Paulo, tinha com casaco James Dean. Sim, era o nome oficial daquilo.

Dos seus três filmes: Vidas Amargas (East of Eden), 1955; Juventude Transviada (Rebel Without a Cause), também de 55; e Assim Caminha a Humanidade (Giant), de 1956 – ele só chegou a ver o primeiro (morreu em setembro de 1955) e nem ficou sabendo que foi indicado ao Oscar de Melhor Ator pelos dois últimos. Morreu em um trágico acidente de carro, um Porsche quando estava a 200 km por hora, numa rodovia estadual. Há uma lenda que ele não faleceu (o amigo que estava no outro banco sobreviveu), mas teria ficado tão deformado que se refugiou em algum canto e ainda vive, tendo hoje 83 anos. Dizem também que Elvis não morreu. Dizem.

James Byron Dean nasceu em Marion, Indiana, Califórnia em 8 de fevereiro (aquariano) de 1931. Filho único de uma família classe média e culta. A mãe lhe deu o segundo nome -– Byron – em homenagem ao grande poeta inglês Lord Byron. O pai era protético e a mãe, Mildred (quer melhor nome de mãe para um cara como James Dean?), era herdeira de fazendeiros metodistas e ricos. Aos 8 anos aprendeu violino e sapateado. Mas vamos deixar que ele mesmo nos conte tudo.

Brasileiros – Quando você resolveu ser ator, levou a coisa a sério. Largou tudo na Califórnia e foi fazer o melhor curso para atores dos Estados Unidos, em Nova York. Até hoje é uma escola cara. Seus pais bancavam?
James Dean: Não. Eu trabalhava como garçom e cobrador de ônibus. Aliás, foi assim que em poucos meses conheci toda a cidade de Nova York. Fui aluno de Lee Strasberg e sua mulher, Paula. Estiveram por lá Marlon Brando, Geraldine Page, Paul Newman, Eva Marie Saint, Jane Fonda, Al Pacino, Robert De Niro, Dustin Hoffman e a mais famosa de todos, Marilyn Monroe.

Vamos voltar um pouco no tempo. Quando você tinha 11 anos, lá em Marion, e a sua mãe havia morrido há pouco tempo, um padre da sua igreja abusou sexualmente de você.

Ele ficou me encarando. Achei que ia levar uma porrada. Levou a mão até o gravador, achei que ia desligar, recuou, se esticou na poltrona.

Como é que você sabe disso? Em toda a minha vida contei isso apenas para uma pessoa. E ela jurou que nunca contaria isso até morrer. Me lembro como se fosse hoje. Foi num dos intervalos da gravação de Assim Caminha a Humanidade. Conversei muito sobre isso com a Elizabeth Taylor. A gente ficou muito amigo. Pena que eu morri meses depois. Ela era um ano mais nova do que eu. Como você soube? Ela ainda está viva?

Morreu há três anos, em 2011, com 79 anos. Ainda linda como sempre.
Mas você a entrevistou, e ela contou isso?

Não, ela contou para um jornalista americano, Kevin Sessums, em 1997, e pediu que ele guardasse segredo até que ela morresse. Ela teria dito: “Eu amava muito o Jimmy. Vou te contar uma coisa, mas é ‘em off’ até eu morrer, ok?”. Ele publicou na semana em que ela morreu.
Que filho da puta!

Quem, ela?
Ele. Olha, aquilo que aconteceu com o padre apenas me ajudou a entender melhor o tempo que vivi em Hollywood. Quase todos os grande atores eram bissexuais. Naquela época existiam os ativos e passivos. E os ativos jamais se sentiam homossexuais. Te confesso que tive relação ativa! com alguns deles. Mas gostava mesmo era de corridas e mulheres.

Seria muita indiscrição minha perguntar com que atores você teve relação? Afinal, estão mortos e a maioria deles já teve a vida contada em biografia autorizada ou não. Paul Newman, por exemplo.
Não vou falar nisso, era muito amigo dele e da mulher dele. Deixa ele quieto. Mas vou te contar de um que você vai cair de costas. Lembra daquele ator que só fazia bang-bang, forte, macho, o Randolph Scott?

Não acredito? O Randolph Scott? Meu Deus! Gay?
Quando eu conheci, ele já tinha uns 60 anos. Aliás, ele sempre pareceu ser velho. Foi em um porre que tomamos, eu gostava muito ele. Sei que tudo terminou num sexo oral.

Vamos mudar de assunto, esta é uma revista séria.
Mas sexo também é um assunto sério. Tenho o maior respeito pelo Randolph. Grande ator, grande amigo. Não vejo nada de mais.

Vamos voltar às mulheres: Pier Angeli foi seu grande amor. Também uma grande atriz.
Sim, uma grande atriz. Um ano mais nova do que eu. Nascida na Itália, sabia? Mas levei um chifre que só não demorou muito para esquecer porque eu morri dois anos depois.

E quem foi que te roubou a moça?
Na verdade, ela estava querendo terminar comigo porque a família não me aceitava. Eles eram católicos. Aí, pintou um cantor filho de italianos, católico, e a família fez toda a pressão. O Vic Damone. No dia do casamento deles, eu subi com a minha moto até a porta da Igreja Católica de São Timóteo e fiquei acelerando até todos olharem para mim. Aí, arranquei a toda velocidade. Coisa de moleque, né? Fez sucesso esse cara, o italianinho?

Pouco. Sei quem foi. Fez alguns filmes também. Mas bem medíocre.
Que bom saber disso. Fico aliviado.

A que você deve seu nome ser lembrado até hoje como um dos maiores mitos de Hollywood de todos os tempos?
Não posso imaginar. Só queria ser um bom ator, um bom amigo. O elenco de Assim Caminha a Humanidade só tinha craques. O que havia de melhor em Hollywood na época: Elizabeth, Rock Hudson, Carroll Baker, Dennis Hopper, Mercedes McCambridge, Rod Taylor, Sal Mineo.

Você teve alguma coisa com a Liz Taylor?
Não, a gente era confidente. Durante as filmagens, eu estava namorando um avião chamado Ursula Andress. Não sei que fim levou.

A atriz Pier Angeli. Foto: Reprodução
A atriz Pier Angeli. Foto: Reprodução

A Mercedes ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante e você concorreu a de Melhor Ator.
Acho isso uma injustiça. O ator principal era o Rock Hudson. Tinha também o Sal Mineo, que ainda era menor de idade. Que fim levou?

Em 1976, depois de um ensaio, chegando em casa, foi esfaqueado por um assaltante. Tinha 37 anos. Era um grande ator. Também foi indicado para ator coadjuvante no filme de vocês.

James Dean abaixou a cabeça, começou a soluçar e depois a chorar compulsivamente. Acendeu um cigarro. Tirou um lenço branco da calça (jamais poderia imaginar que meu ídolo usava lenço. E branco, ainda por cima).

Quer parar por aqui?
Não, tudo bem. Me dá um tempinho. Será que aqui tem Jack Daniels?

Estávamos em um pequeno bar da Vila Madalena. Fui ao balcão e trouxe uma garrafa, dois copos sem gelo, como convém, e o garçom levou as cervejas que estávamos bebendo.

Olha, cara, invejo você. A Úrsula Andress se tornou um dos maiores ícones sexuais do cinema mundial. 

Ele nem deu bola, olhando para a garrafa. Era isso que ele bebia. Bebia na garrafa.

Deixa os copos pra lá. 

Tirou a tampa, levou à boca e deu um grande gole. O garçom olhou do balcão reprovando. Fui até lá e disse que eu pagava a garrafa. Ficamos ali, trocando de boca. Foi quando o garçom olhou bem para a cara dele e foi se chegando.
– Meu, tu é a cara dum cara que morreu há muitos anos, um ator. James Dean. Sem tirar nem por. Posso tirar uma foto sua. Só que o James Dean era bem mais velho. Quando você entrou, eu quase perguntei se tinha mais de 18 anos.
Isso fez James parar de uma vez de chorar. Abriu um sorriso, o garçom fez uma selfie de nós três.
– Minha mãe não vai acreditar. Tem um pôster dele na cozinha. Muito obrigado.
Saiu. James falou:

Sabe o que é? Durante as filmagens, o Sal Mineo se apaixonou por mim violentamente. Uma coisa muito forte. O Rock Hudson que o acalmava, inclusive com segundas intenções, é claro.

Este foi outro que se declarou gay depois de velho. Teve uma morte muito dolorida.
Poupe-me, por favor. A facada no Sal Mineo ainda está nas minhas costas.

Dá outro gole do gargalo. E eu, mais um.

Para encerrar, eu vou te contar uma coisa que sei que você vai gostar. Na hora do seu acidente, quando foi colocado na ambulância, meio inconsciente, você balbuciou alguma coisa. Depois, numa entrevista, o seu amigo mecânico e passageiro Rolf Wütherich, que estava ao seu lado no carro na hora do acidente, disse: “Ouvi um grito suave emitido por Jimmy, a lamúria de um menino, chamando sua mãe ou de um homem encarando Deus.”

Ele tira de novo o lenço do bolso. 

O Rolf, além de amigo e mecânico, era um poeta. Que coisa bonita. Mais um gole, vamos lá. E a Ursula, hein? Quem diria! Era uma suíça de 18 aninhos…

Quando ela ficou famosa, disse que você era “um animal selvagem”.
Isso hoje em dia é elogio?

Acho que sim.
Então, mais dois goles. Para a suissinha. Aquilo era uma potranca, como os cavalos do Rock Hudson no filme.

Tá viva. E gostosa. Quer dizer, pra 78 anos…
Ainda dá pra encarar?


Comentários

Uma resposta para “Mario Prata entrevista James Dean, o “animal selvagem””

  1. Avatar de Ubiratan Miguel
    Ubiratan Miguel

    No livro “Canções Que Minha Mãe Me Ensinou”, Marlon Brando define quem foi James Dean.
    “Ele tinha tudo a seu favor para ser um grande ator”, declarou Brando. Se um ator genial como esse fez essa declaração, estão nulas todas as outras de pessoas que consideram Dean um ator sem valor.
    Para mim, ele foi um ator excelente, a caminho de se tornar um dos melhores do cinema, se não tivesse morrido tão cedo, com a carreira mais curta de todos os mais famosos do cinema.
    Descanse em paz, James Dean!

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