Rio de Janeiro, 1973. Por influência do irmão mais velho, aos 7 anos de idade, o menino Marcelo Fróes sente-se hipnotizado pela música de Band on The Run. Lançado naquele mesmo ano, o quinto álbum solo do ex-beatle Paul McCartney foi o flerte para a paixão incondicional que o futuro advogado passou a nutrir pelo quarteto de Liverpool. “Depois dos meus pais, os Beatles são a influência mais importante da minha vida. Foram decisivos na formação de quem eu sou”, garante Fróes, hoje, aos 48 anos.

Formado em Direito pela UERJ em 1989, três anos mais tarde, ele aprofundou a atividade paralela de pesquisador musical. Um projeto idealizado em parceria com o amigo e jornalista Ricardo Pugialli foi o marco zero da virada de mesa que, depois, levou Fróes a pendurar a beca de vez. Em 1992, motivados pela efeméride de 30 anos do lançamento do primeiro compacto dos Beatles – que continha o sucesso instantâneo Love me Do e o lado b P.S. I Love You – Fróes e Pugialli decidiram apresentar ao extinto Jornal do Brasil a proposta de publicar um livro que contasse a história das três primeiras décadas dos Fab Four.

Com o aval do jornal, a missão demandou muitas pesquisas. Algumas feitas nos acervos brasileiros da EMI, multinacional que distribuiu por aqui a obra completa dos Beatles. Ambicioso, Fróes não se intimidou em fazer um pedido aparentemente descabido: solicitou a EMI que intermediasse uma entrevista com o maestro George Martin, produtor e arranjador do quarteto, tratado por muitos devotos como “Quinto Beatle”. A gravadora deu a Fróes contatos da matriz inglesa e sugeriu aos dois amigos que também visitassem a sede londrina. Independentemente da resposta, Fugialli e Fróes decidiram partir para Londres com o propósito de conhecer o mítico estúdio Abbey Road e esmiuçar os arquivos da Apple Records, gravadora de propriedade do quarteto, criada em 1968, em parceria de distribuição com a EMI e a Capitol Records.

Um dia antes de aterrissarem em solo britânico Fróes recebeu, via fax, a resposta a seu pedido. A mensagem encerrava com uma negativa. Em Londres, ao encontrar os executivos da EMI, ele logo se queixou: “Chegamos tristes, pois George Martin não vai falar com a gente. Um diretor disse, sem rodeios: ‘Pois sente sua bunda naquela cadeira, reescreva o pedido e envie o fax diretamente para ele’. Na véspera de nossa volta ao Brasil tocou o telefone do hotel e era a mulher do George, Judy Martin. Ela disse que havia recebido minha ‘cartinha’ e que, coincidentemente, o apartamento deles ficava a duas quadras de onde estávamos hospedados. Se pudéssemos recebê-lo, na manhã seguinte, George poderia nos visitar no hotel. Era noite, mas sai feito louco a procura de um Seargent Peppers para poder pedir a ele um autógrafo”, recorda.

Acordado para durar apenas 20 minutos, o encontro rendeu quase duas horas de conversa. Publicada como prefácio do livro lançado em 1992, a entrevista acabou se tornando a cereja do bolo de Os Anos da Beatlemania. Motivado pelo feito, na sequência, Fróes passou a se dedicar a um novo projeto: contar a história da Jovem Guarda. Para ele, graças a uma bela coincidência, além de ser um marco comportamental para a juventude brasileira, o movimento também foi decisivo para a pujança experimentada, depois, pela indústria fonográfica no Brasil. A Jovem Guarda explodiu no País, no exato momento em que começaram a ser fabricados aqui os primeiros LP’s e compactos de 7 polegadas, que capitularam, em 1963, a longeva história dos discos de 78rpm, com capacidade inferior de registro.

Respeitado pelo belo trabalho feito no livro sobre os Beatles, Fróes teve carta banca para fuçar o acervo de todas as grandes gravadoras e dos selos subsidiários pertencentes a elas. Foi então que aprimorou o faro para descobrir relíquias. O lançamento de A Jovem Guarda em Ritmo de Aventura ocorreu somente em 2000 por iniciativa da Editora 34. No hiato de oito anos desde seu primeiro livro, Fróes estendeu a amizade com George Martin a ponto de trazê-lo ao Rio de Janeiro, em outubro de 1993, para reger a Orquestra Sinfônica Brasileira, em um concerto do Projeto Aquarius. Em 1994, ganhou de Martin autorização para traduzir e lançar por aqui o livro Summer of Love, que conta a história dos bastidores da obra-prima Seargent Peppers Lonely Hearts Club Band, pela ótica de seu produtor e arranjador (lançado em 1995 pela editora Relume Damará, o livro ganhou o título Paz, Amor e Seargent Peppers). 

Ainda em 1994, Fróes deu início a um novo empreendimento, em sociedade com Marcos Petrillo e Hélio Fernandes Filho, o jornal International Magazine, que circulou por 15 anos. Em 1995, um novo chamado de Sir Martin foi o grande divisor de sua trajetória. O produtor dava início aos trabalhos de caça a relíquias inéditas dos Beatles para o projeto Anthology e decidiu chamar Fróes para acompanhar o processo de perto e, quem sabe, conseguir um encontro com Ringo, Paul ou George (o guitarrista morreria seis anos depois). Além do fato de ter conhecido o ídolo que fez despertar sua paixão pelos Beatles, a nova viagem a Londres foi muito além do encontro com Paul McCartney. Ao testemunhar o trabalho de Martin – feito a partir de fitas de rolo de meia polegada e quatro canais, idênticas a maioria dos registros que encontrava nos acervos brasileiros – Fróes suspeitou que, tão logo voltasse ao Brasil, abandonaria de vez o ofício de advogado. E foi este o caminho escolhido por ele ao comprar, a troco de banana, máquinas de reprodução e edição das fitas de rolo e montar um estúdio adequado para a criação de novos produtos feitos a partir de suas pesquisas. O estúdio tornou Fróes espécie de coringa da indústria fonográfica e possibilitou a chegada ao mercado de preciosidades como o álbum Technicolor dos Mutantes (segredo guardado por mais de três décadas), e caixas históricas reunindo discografia completa e materiais inéditos de gigantes como Gilberto Gil, Erasmo Carlos, Elza Soares, Vinicius de Moraes e Roberto Carlos.

Encorajado pelo xará Marcelo Castello Branco, ex-presidente da EMI, Fróes decidiu fundar seu próprio selo, em 2008. Não por acaso, deu a ele o nome Discobertas. Nesses seis anos de existência, a gravadora carioca lançou, entre caixas e CD’s avulsos, mais de 200 projetos (confira no portal: www.discobertas.com.br). Cinco títulos lançados em 2014 dão pistas da qualidade insuspeita: caixas de Wanda Sá, Moraes Moreira, Pery Ribeiro, Jackson do Pandeiro e da cantora Ângela Maria, que acaba de ter reunida por Fróes toda sua produção lançada originalmente em 78rpm, nos anos 1950, e jamais digitalizada. No fechamento desta edição, Fróes antecipou novidade quentíssima. Lançará, em setembro, mais um ítem histórico, um CD duplo com o registro de apresentação feita por Gilberto Gil e Gal Costa, na London University, em 1970,  ocasião em que o baiano estava exilado na capital inglesa. Que as “discobertas” não pare


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