Conheci Berlim logo após a queda do muro e não reconheci a cidade quando regressei, agora. Antes, muitos terrenos vazios, praças abandonadas, paredes pichadas e uma cor cinza que dominava a cidade. Hoje, as pichações se concentram no subúrbio, bem distante do centro reformado, modernizado e colorido.
A cidade vive há quase 20 anos em constantes obras. Andar por Berlim é como estar em um canteiro com máquinas, gruas e guindastes por todos os lados. Foram mais de 8 bilhões de dólares em investimentos na cidade. A nova arquitetura conta com edifícios mais altos e mais modernos – as torres de vidro, como dizem os berlinenses -, nítidas em locais como Potsdamer Platz, bairro da ex-Berlim oriental que há sete ou oito anos não passava de um pedaço de terra vazio e abandonado.
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O antigo vai se adaptando ao novo. Uma mistura de arquiteturas: o moderno ao lado de prédios e edifícios com mais de 50 anos de história, às vezes quase escombros, destruídos pelas bombas da Segunda Grande Guerra.
Resquícios da guerra ainda podem ser vistos. A antiga igreja Kaiser-Wilhelm-Gedächtniskirche é o maior exemplo disso. Construída em 1895 e símbolo de Berlim Ocidental, foi bombardeada em 1943. Sem um pedaço de sua torre, mas ainda com as ruínas preservadas, é uma das relíquias que sobreviveram aos ataques. São memórias da guerra. É a história nas ruas, viva e real.
Berlim é essa constante dualidade, não apenas em suas fachadas. A aceitação mútua entre as pessoas até hoje gera conflitos. Uma das frases mais ouvidas pelos seus habitantes é a de que não pode haver preconceitos entre seus moradores. Não importa de qual dos lados você veio. Separar, segregar é o que Berlim não quer mais.
Capital cultural
Turistas para todos os lados, museus em reforma, reurbanização. Berlim voltou a ser a capital da Alemanha e quer, agora, ser também a capital cultural da Europa.
A Ilha dos Museus, no rio Spree, pertencia ao lado oriental. Formada por cinco museus, abriga acervos maravilhosos, principalmente o Pergamon Museum, considerado um dos principais da Europa, com objetos vindos da Babilônia, da Grécia e da Turquia.
O Portão de Brandemburgo, antes também do lado oriental e com o antigo muro bem perto de suas colunas, foi renovado e restaurado. Suas portas unem o centro histórico da cidade ao Tiergarten, o grande parque da cidade. É símbolo de Berlim desde 1848, quando Napoleão, vitorioso, desfilou pela Alemanha. A passagem é livre para pedestres, mas os carros precisam desviar do portão. Está ao lado do Reichstag, o Parlamento Federal Alemão, que também foi revitalizado e reinaugurado em 1999.
Nessa mesma parte da cidade, encontramos a Unter den Linden, a principal avenida de Berlim leste, com mais de 250 anos e com construções famosas como a Ópera Estatal, a embaixada russa, o museu histórico, a Universidade Humboldt, o museu Guggenheim de Berlim e o Berliner Dom, entre outras. Também nessa região temos a torre de TV, ponto mais alto de Berlim e umas das torres mais altas do mundo, com uma vista incrível da cidade. São mais de 200 m de altura e lá de cima dá para compreender melhor a complexa reunião das duas partes: oriental e ocidental; prédios populares de um lado e arquitetura requintada do outro.
As obras não param e diante dos nossos olhos se ergue uma cidade cosmopolita, ao lado do rio Speer, com muita gente pelas ruas.
Salsichas e modernidade
O alemão continua comendo salsichões e tomando cerveja morna. Essas tradições não estão sendo reformadas. Fora isso, Berlim é a maior cidade da Alemanha, com uma população de 3,4 milhões de pessoas, com aproximadamente 435 mil estrangeiros, vindos de 185 países diferentes, que mantêm residência fixa na cidade e, obviamente, somam suas riquezas culturais às dos alemães.
O comércio em torno da queda do muro está por toda a parte – por somente dois euros são vendidos pedaços do muro, passaporte com vistos carimbados no Checkpoint Charlie, símbolos do comunismo em broches e chaveiros. Há ambulantes em todos os pontos turísticos de Berlim. Tudo misturado com as famosas sandálias alemãs Birkenstock, que também estão por todos os lados e são vendidas por 40 euros, em média.
Nas ruas, os carros de tecnologia alemã dominam – Mercedes, Audis e BMWs. Estradas sem limite de velocidade, sem pedágios e sem buracos. Para nenhum Schumacher reclamar!
O muro? Seguem lá alguns trechos, pichados e quebrados, para que nunca mais seja esquecida a amargura em que viveu Berlim durante tantos anos. Também pelo chão, em diversos pontos da cidade, encontram-se as marcas por onde passava o muro antigamente.
Em agosto deste ano, aconteceu o Mundial de Atletismo de Berlim, no mítico estádio olímpico da capital alemã, marcado pelos Jogos Olímpicos de 1936 durante o regime nazista. Na ocasião, Hitler queria provar a supremacia da raça ariana. Hoje, o jamaicano Usain Bolt mostrou ser o melhor corredor do mundo e ganhou uma homenagem especial: seu retrato em um pedaço do velho muro.
Fotos da história do muro e de como tudo começou e terminou estão espalhadas como verdadeiros museus ao ar livre. Painéis contam a história de Hitler, do holocausto, da Segunda Guerra, da Guerra Fria, da construção do muro, da sua queda há 20 anos, de como está Berlim hoje e como será daqui há alguns anos mais. E com certeza, não será essa Berlim de hoje. São mutações constantes que transformarão a cidade em outra, como vem acontecendo. Conhecer e estar em Berlim é sempre uma surpresa.
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