Vivi três tipos diferentes de Carnaval em Pernambuco, na Paraíba e em São Paulo. Um foi do estilo Entrudo e Zé Pereira, mais rural, La Ursa (“Olé, Olé, quem não dê dinheiro ao urso fica aleijado do pé”), do frevo de rua, do molha-molha, das máscaras de plástico ou de papel machê. Outro, do tipo mais urbano, dos clubes, com lança-perfume e roupas de marca. E o terceiro, de passarela – fui jurado dos desfiles das escolas de samba paulistas por três anos.

Todavia, no primeiro e segundo, cantava-se “Ô abre-alas que eu quero passar/Eu sou da lira, não posso negar” (Chiquinha Gonzaga) ou Mamãe eu Quero (Jararaca e Vicente Paiva).
O Carnaval veneziano, dos clubes, dos corsos, como o da Avenida Paulista (SP), misturou-se ao espanhol, dos bonecos grandes, da Vila Esperança (SP), de São Luiz do Paraitinga (SP), de Olinda (PE) e a toda uma tradição negra, como a dos maracatus, e até com ritos da cultura popular, como bumba meu boi e cavalo-marinho.

O Carnaval midiático tirou a poesia da boca do povo, foi formatado para a interface das TVs nacionais e estrangeiras e o “roliudianou”. O rádio também o alterou, brando, e o fez melhor articulado pelo meio fonográfico e pela cultura popular.

A imagem, pouco a pouco, tirou o som do gênero musical, dos sambas fora das escolas, das marchas, dos frevos de Capiba e Nelson Ferreira (PE). Emudeceram Ângela Maria, Isaurinha Garcia, Marlene, Emilinha Borba, Zé Kéti, Claudionor Germano, Cauby Peixoto, Germano Mathias, Geraldo Filme, Ataulfo Alves, Herivelto Martins, Dalva de Oliveira, a orquestra Tabajara, entre outros, do gosto popular.

O bloco do Eu Sozinho, do Rio de Janeiro, vem desaparecendo junto com o do Clovis, de Santos (SP), os mascarados em turmas. Restam troças, papangus (PE), afoxés, cambiadas (homens travestidos de mulher), enfim, a manifestação popular integrando público e plateia.
O Carnaval baiano da Praça Castro Alves, dos trios elétricos, antes Dodô e Osmar, espetacularizou-se, dizendo o reggae, o rock, o forró, etc., o que confirmou o antropólogo Antonio Risério.

Sumiram muitos blocos e cordões, como Mocidade e Sôdade do Cordão, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, havia os da Barra Funda, Bixiga, Lavapés e tantos outros.

Muitos afoxés, ranchos, cordões e troças, como Zé Pereira, bumba meu boi, Estrela Dalva e os maracatus, estes últimos sobrevivem distantes da mídia, distribuídos por todo o País como uma espécie de resistência da cultura negra, revivendo sua, aliás, nossa, realeza africana.

Acelera aê, de Gigi, Magno Santana, Fabio O’Brian, Dan Kambaiah (BA). Eu te Amo, Porra!, de Átila (BA). Como também “Ah! Essa lembrança que ficou, momentos que não esqueci, eu cheio de fantasias“, Roberto Carlos: a Simplicidade do Rei, samba-enredo da Beija-Flor de Nilópolis (RJ). Se esses foram os sucessos da Bahia e do Rio em 2011, na forma brodueidiana, o brasileiro vem retomando, nas últimas décadas, seu espaço no bem dizer Carnaval.

A palavra carnavalesca está com nova força nos grandes centros e capitais e em seus recônditos afora, assim como desforra, temos o Cordão do Bola Preta (RJ), o Galo da Madrugada (PE), o Elefante (PE), a Pitombeira (PE), o Homem da Meia-Noite (PE), Cala a Boca e Beija Logo (SC), entre tantos outros.


*É paraibano, mestre e doutor pela ECA-USP. Professor de Teoria Literária na Anhembi-Morumbi, professor colaborador da ECA-USP, Fundação Escola de Sociologia e Política-FESP, além de contista e poeta com livros publicados (paulo@brasileiros.com.br).


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