Berimbau universal

É inevitável não perguntar ao percussionista Rodrigo Sá como um paulistano como ele, com sotaque típico e visual urbano, aprendeu a tocar berimbau tão bem – instrumento de origem angolana trazido ao Brasil por escravos e até hoje preservado na Bahia. Ele responde: “Meu pai tocava e encostava a cabaça do instrumento na barriga da minha mãe, quando ela estava grávida de mim. Acredito que comecei ali mesmo”.

A explicação afetiva parece justificar o talento do músico. Rodrigo acaba de voltar de Davos, na Suíça, onde foi convidado para se apresentar durante o Fórum Econômico Mundial deste ano. Na plateia, lideranças econômicas e presidentes de diversos países.

Mas Rodrigo não quer ser famoso. “Não sou celebridade. Gosto de saber que, durante a minha caminhada, fiz a música brasileira ser conhecida aqui e lá fora”, diz ele, que usa o berimbau como chave para se aproximar da comunidade que admira. “Eu dei um berimbau para Gilberto Gil e conversamos durante 20 minutos. Também fiquei amigo de Carlinhos Brown assim. É uma chave que abre portas.” Além do berimbau, Rodrigo toca pandeiro e violão.

O músico já participou do Rock in Rio Lisboa, gravou disco no Japão, lançou música dentro de trio elétrico no Carnaval de Salvador, participou de competições de capoeira em Bruxelas, emplacou música na trilha da novela A Lua Me Disse (2005), da TV Globo, e teve banda de forró, a Circuladô de Fulô. Não é pouca coisa, mas ele nem pensa em parar.

Ex-aluno na Escola de Teatro Ewerton de Castro, em São Paulo, Rodrigo preferiu ser músico e dar continuidade à dinastia “berimbalística” da família. O pai Décio, que é herdeiro da tradição do baiano capoeirista Mestre Bimba (1900-1974), confecciona e estuda a fabricação de novos modelos, ao lado de um luthier (profissional especializado na construção de instrumentos de corda). Um berimbau tradicional tem um pedaço de madeira envergado, uma cabaça, uma tarracha e uma corda de aço, que é manipulada com uma pedra (ou moeda) e uma vareta. O pai inventou um berimbau de duas cordas e atualmente trabalha em um projeto de três, o “tririmbau” – o número de cordas altera o som. “Trata-se da renovação da prática”, orgulha-se o filho.

Como parte do movimento que está definindo a cara da música jovem brasileira, Rodrigo participa de uma reunião de modernos, chamada Missa, que acontece semanalmente dentro de uma casa na Vila Nova Conceição, zona sul paulistana. Ali, ele toca berimbau e faz pesquisa musical. Também acaba de lançar o álbum 5 Estrelas, produzido por Duani, com direção de arte de Gabriel Wickbold. É seu terceiro disco – ele é cantor e percussionista. “Quando comecei a viajar o mundo e descobri que tem professor de capoeira até na Tchetchênia, quis apostar nisso. Meu berimbau é minha Excalibur.”

Ele posou de smoking, segurando uma arara azul, na capa de seu último CD. “É um pouco tropicalista.” Para completar a boa mistura, o guerreiro carrega no peito uma medalha de prata com a Nossa Senhora de Guadalupe, santa padroeira da América Latina.

 


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.