O skatista Sandro Testinha trabalhou por dez anos dando aulas de skate na Fundação Casa, que ainda se chamava Febem quando começou. Por lá, viu dos melhores aos piores trabalhos no processo de recuperação de um adolescente em situação de conflito com a lei. Quando acabou demitido, sem maiores explicações, percebeu que tinha uma missão em uma área que o Estado falha, especialmente nas periferias.
Testinha compreendeu que seu método de usar o skate como ferramenta social pela educação precisava chegar nas crianças e nos jovens muito antes da alternativa do crime ou das drogas. Com o apoio da esposa e dos filhos, criou a ONG Social Skate, que oferece, em Poá, na grande São Paulo, uma série de atividades gratuitas de skate e educação para qualquer criança que frequenta o espaço, especialmente nos fins de semana. Reconhecido pelo esforço, Testinha foi um dos premiados do Trip Transformadores de 2013, além de colecionar fãs ilustres, como o cantor Chorão e o skatista Bob Burnquist.
“A gente tá há cinco anos fazendo isso, eu não ganho um real. Meu trabalho é dar aula de skate em uma pista pública aqui em Poá para a prefeitura, eu tiro deles e trago para cá, sou tipo um Robin Hood do skate”, conta Testinha, que cobra mais trabalho dos políticos e do Estado, entidades da qual ele não espera apoio para a ONG.
Em entrevista à Brasileiros, como parte da nossa série especial sobre a redução da maioridade penal, Testinha põe as cartas na mesa: “Que revolução foi fácil? Que mudança foi fácil na história da humanidade? Só se for para pior e olha, tô há 37 anos neste mundo, e vi poucas para melhor”.
Brasileiros – Por que você é contra a redução da maioridade penal?
Sandro Testinha – Sou contra, lógico. Eu trabalhei dando aulas de skate na Fundação Casa durante dez anos e fiz algumas ações em alguns presídios, especificamente na região de Guarulhos, em São Paulo. Hoje eu tenho uma ONG que, além de oferecer esporte e educação, também faz acompanhamento familiar. Então, vejo as três frentes, os três eixos que eu citei – as casas que aplicam a medida socioeducativa para menores de idade, o sistema prisional e as famílias – e essas três frentes hoje, infelizmente, não funcionam. Se você tá em um País em que esses três sistemas não estão funcionando, só reduzir a maioridade penal não vai resolver. É basicamente isso. Você não vai tomar um remédio que não surte efeito para doença que você tem.
Basicamente, foi minha faculdade – graduação, lato sensu – essa coisa toda aí. Para ser bem direto, lá eu aprendi muito como trabalhar com crianças e adolescentes e aprendi muito do que não se deve fazer. Foram os dois lados da moeda. Vi profissionais muito bons, dedicados, porque acho que o salário lá não é ruim, mas tem que gostar porque é tenso para caramba, quem tá lá fazendo bom trabalho é porque realmente gosta de fazer aquilo. E quem tá ali só pelo salário, pela estabilidade, e acaba perdendo a cabeça porque não aguenta a pressão. Ninguém quer ficar preso, um dia que seja. As pessoas falam: “a pena lá é branda, só três anos”. Eu não acho branda. Ninguém quer fica preso um dia, quanto mais três anos. Quem tá lá se junta e vai para cima, querem enfrentar. É um conflito. Já presenciei uma rebelião e é uma coisa incrível, você vê o ódio no olhar da meninada e vê o ódio no olhar dos caras que tão ali para conter a rebelião. É ódio batendo de frente com o ódio. De onde é que vai sair uma boa solução disso daí? Não tem como.
E como anda a ONG Social Skate, a rotina de trabalho e atividades?
As atividades são no final de semana, já que a gente incentiva que a criançada esteja mais próxima da família e da escola durante a semana, mas durante a semana as portas estão abertas. E todo dia bate alguém aqui, seja pra pedir ajuda, pedir um conselho, pra bater um papo. A gente acredita que o melhor amigo do ser humano é o ser humano, então a gente está aberto todo dia a dar algum tipo de ajuda e essa ajuda pode ser uma conversa.
A gente continua batalhando de forma independente, a gente não acredita nessa ajuda política de leis de incentivo, esse tipo de coisa, porque já tivemos experiências não tão boas, onde políticos nos procuraram ofereceram aquela coisa por debaixo dos panos, enfim, coisas de Brasil. Enquanto a política não for feita da forma que nós entendemos que tem que ser feita, a gente não vai usar desses artifícios, a gente não vai contar com esse tipo de ajuda. A gente conta com a ajuda de amigos, de doadores anônimos ou declarados. A maioria vem do universo do skate mesmo, alguns artistas, pessoas simples e comuns e a gente vai planejando forma auto sustentáveis de manter a ONG, tem os bazares, tem as camisetas, campanhas. É matar um leão por dia, mas tá valendo a pena.
A criançada que frequenta a ONG, entre 6 e 17 anos, comenta a questão da redução penal?
Tem uma frase sua que é: “se o trabalho das comunidades for depende da política tradicional, a coisa não anda”. Essa reflexão persiste?
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