‘As definições de saúde mental hoje são limitadas’, diz socióloga da saúde

Um campo da sociologia poderia ajudar o sistema de saúde a lidar melhor com a saúde mental: é a sociologia da saúde. Subaproveitado na maioria dos países e muitas vezes restrito a universidades, essa área do conhecimento poderia ajudar a orientar políticas públicas.

A sociologia da saúde mental estuda os fatores estressores sociais que, muitas vezes, podem ser o gatilho ou a estrutura para que um transtorno mental se instaure. Entre eles, estão os vários papéis sociais desempenhados pelos indivíduos hoje e períodos de transição na vida, como a procura por um novo emprego. 

Predisposições genéticas não são as únicas explicações para doenças mentais. Foto: Ingimage
Predisposições genéticas não são as únicas explicações para doenças mentais. Foto: Ingimage

Uma especialista importante nessa àrea é a socióloga Jane Mcleod, da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos. Ela é uma das organizadoras do “Handbook of the Sociology of Health, Illness, and Healing” (“O livro da Sociologia da Saúde, da Doença e da Cura”, em tradução livre), referência na área, e publicou recentemente artigo no Journal of Health and Social Behavior em que mostrava as relações entre desigualdade social e saúde mental.

 Jane explicou à Saúde!Brasileiros o que faz a sociologia da saúde e de que forma ela pode contribuir.  

Saúde!Brasileiros: Por que é tão importante para a sociologia da saúde mental?

Jane McLeod: A sociologia contribui de forma importante para o estudo da saúde mental porque ela destaca os fatores sociais e as condições que influenciam como a doença e saúde são definidas, a distruibuição da saúde mental na população e a probabilidade das pessoas receberem tratamento.

Os sociólogos estudam como e porquê as definições de doença mental mudaram com o tempo, quais subgrupos da população estão em maior risco de desenvolver problemas de saúde, quem procura o tratamento e qual a qualidade do tratamento que recebem.

Você diria que a sociologia da saúde poderia ser mais usada para melhorar a vida das pessoas?

Sim, definitivamente. As explicações hoje são limitadas e focam mais em aspectos pessoais e individuais, como a predisposição genética e biológica e perdem a maneira como o ambiente social molda a nossa vida e contribui muitas vezes para o desenvolvimento de algumas doenças. 

Hoje, a ligação mais comum entre a sociedade e a saúde citada nos estudos clínicos de saúde mental  são os chamados componentes “estressores”. Como define esses fatores e quais seriam os mais comuns na sociedade?

Essa é uma pergunta complexa, que essa entrevista não daria conta. Mas, em geral, são demandas da sociedade que excedem a possibilidade individual de atendê-las ou situações crônicas estruturais que afetam os valores pessoais e o senso de identidade. Situações de discriminação, frustrações profissionais ou transições, como procurar um novo emprego.

Também há estudos que citam uma nova natureza para os fatores estressores. Hoje, por exemplo, com a profusão de tecnologias e redes, papéis sociais que antes eram desempenhados em um determinado espaço de tempo, se fundem e as pessoas se veêm obrigadas a desempanhar vários papeis ao mesmo tempo. Esse é um outro fator estressor bem importante atualmente.

A socióloga da saúde Jane McLeod. Foto: Divulgação/Universidade de Indiana
A socióloga da saúde Jane McLeod. Foto: Divulgação/Universidade de Indiana

Eles são os únicos?

Os fatores estressores não são o único elo entre sociedade e saúde . Igualmente importante são as percepções das pessoas em relação ao papel social que representam, suas identidades, suas crenças e se eles são tratados com justiça e dignidade.

Há evidência de como esses estressores afetam o cérebro?

Temos muitos estudos feitos nessa área, mas não feito por sociólogos.

 O sistema de saúde pode se beneficiar da perspectiva sociológica?

A maioria das pessoas com problemas de saúde mental não procuram por tratamento formal – e a sociologia sabe algumas coisas que podem ajudar a desvendar o porquê. Estudamos como o sistema de saúde é definido, organizado e se, de fato, ele ajuda.

Como seria o tratamento baseado na sociologia da saúde?

Primeiro, não prescrevemos tratamentos para indivíduos, mas podemos propor mudanças no modo como a sociedade opera. Por exemplo, reduzindo a pobreza, haveria diminuição nos problemas de saúde mental em crianças.


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