O Brasil que cresce em tempos de recessão

O setor de beleza nem se ocupa com a recessão: . “Consumidores buscam indulgências em tempo de crise.”
O setor de beleza nem se ocupa com a recessão: “Consumidores buscam indulgências em tempo de crise” – Foto: EBC

O rebaixamento da nota de risco do Brasil, na quarta-feira (9), foi apenas o mais recente sintoma da crise econômica, que arrasta setores inteiros para a recessão, que, no País, deve chegar a 2,44% em 2015. Mas enquanto a indústria vê seu PIB despencar 5,3%, o comércio para e serviços dispensa funcionários, algumas empresas e ramos de atividade não apenas resistem, mas crescem em meio à crise.

Três dos quatro subsetores industriais derrapam este ano, mas o quarto nem se dá conta da recessão: o extrativismo mineral cresceu 10,4% no último trimestre – sempre segundo o IBGE e em comparação com o ano anterior. Somente a produção de minério de ferro deve avançar 60% até 2016 com a produção de 425 milhões de toneladas. A crise até reduziu o preço da matéria prima, mas ainda não houve cancelamento de projetos.

Serviços é formado por seis subsetores, todos atolados na crise, com exceção de dois. Serviços de Informação e o de Aluguel. Este último não vê sinal de esfriamento. Cresceu 2,8% entre abril e junho. Vice-presidente da Rede Secovi de Imóveis, Ricardo Paixão acredita que a crise financeira impeliu proprietários a desistirem de vender, enquanto possíveis interessados em comprar também abandonaram a ideia em razão da restrição de financiamento e aumento no valor de entrada. Ambos decidiram alugar. “O bom profissional imobiliário consegue conscientizar proprietário e locatário a chegarem a uma proposta de equilíbrio.”

Mas poucos são os setores que acumulam desempenho tão bom quanto o agronegócio: R$ 76 bilhões movimentados no segundo trimestre do ano. Para 2015, o IBGE prevê que a safra brasileira de cereais, leguminosas e oleaginosas seja 8,6% superior a 2014. Uma das razões é a manutenção dos investimentos por parte do governo federal. “Algumas coisas nós não podemos permitir que voltem atrás ou que tenham retrocesso. Dentro disso, está o agronegócio”, afirmou a presidenta Dilma Rousseff em julho para uma plateia de empresários do ramo. “É por isso que nós aumentamos, mesmo num momento de dificuldades, em 20% os recursos de financiamento.”

Até em meio ao desabastecimento energético há quem ganhe dinheiro. É o caso de quem investe em energia eólica. Enquanto o desemprego no Brasil bateu em 7,5% em julho, quem produz eletricidade com a ajuda do vento planeja gerar 56 mil empregos este ano. A expectativa da Associação Brasileira de Energia Eólica é crescer 30% ao ano até 2018 e aumentar sua fatia na geração de energia elétrica de 4% para 10% até 2020.

Outros ramos de atividade aproveitam a queda do real frente ao dólar para engordar o caixa exportando. A Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados ampliou em 9,1% suas vendas entre janeiro e junho. Uma das beneficiadas é a Docile, de Lajeado (RS), que destina para exportação o equivalente a 15% de seu faturamento. “Esta é uma área que deve se desenvolver cada vez mais para a empresa, independentemente da situação econômica nacional ou mundial”, diz o gerente de exportação, Cristian Ahlert.

Quem também parece blindado contra a crise no Brasil é o comércio feito pela internet.  O número de pedidos chegou a cair, mas o valor de cada compra cresceu em média 13%. Nos seis primeiros meses do ano, o brasileiro desembolsou pela web R$ 18,6 bilhões contra R$ 16,1 bilhões um ano antes.

Diretora Executiva do projeto E-Commerce Brasil, Vivianne Vilela diz que “o comércio eletrônico se consolida como setor importante na economia brasileira, mesmo com a instabilidade”. “Tivemos um crescimento de 33% na categoria moda, 19% na categoria casa e decoração e 12% no setor de informática”, contabiliza. “O e-commerce é uma opção muito atraente para o varejista porque o cliente está cada vez mais online. É um bom investimento sim, desde que você conheça o mercado onde vai entrar.”

Ponto fora da curva, a MRV Engenharia dribla a crise que atinge a construção civil. Enquanto o setor viu seu PIB (Produto Interno Bruto) encolher 8% no segundo trimestre, os lançamentos da empresa cresceram 3,9% no mesmo período, a maior receita líquida de sua história de 36 anos. O motivo: foco em imóveis populares (3 a 6 salários mínimos) do programa Minha Casa Minha Vida. “Nessa faixa de renda, o governo apenas regulamenta os empreendimentos”, explica o presidente da companhia, Rubens Menin. “O dinheiro vem dos recursos do Fundo de Garantia”, garantido pelos próximos dois anos.

Mas também há setores que crescem justamente por causa da crise. Beleza é o mais emblemático. O segmento formaliza 8 mil empresas todo mês, mesmo em ano de crise. Ao todo, são 570 mil negócios entre salões de beleza e centros de estética. Os pequenos representam 99% deste universo.

Coordenadora nacional de Beleza do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Andrezza Torres explica a teoria do “lipstick effect”, quando consumidores decidem enfrentar uma crise econômica comprando bens de luxo. “Os consumidores abrem mão de alguns produtos e serviços e preservam aqueles que trazem prazer, conforto, escape.”

Seu conselho ao empresariado é criar uma boa experiência ao consumidor, estreitando o relacionamento para fidelizar o cliente. “É um fato: consumidores buscam indulgências em tempo de crise.”


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