Observar o funcionamento do mundo mental das crianças e os mecanismos que participam da construção das suas percepções e desejos ajuda a entender como a identidade se constitui. Nesse contexto, quero enfatizar a necessidade de pais e educadores prestarem maior atenção aos estímulos e ideias que as crianças estão recebendo e que nutrem seu imaginario. Estou me referindo, especialmente, aos efeitos em longo prazo da publicidade de produtos direcionada às crianças, uma intervenção, desde cedo, que as educa para o consumismo.
Essa comunicação comercial focada estimula na criança o sentimento de que ela necessita de determinado objeto para ser admirada e aceita, para pertencer. Isso ocorre em um período do desenvolvimento em as crianças aprendem a atribuir valores às coisas, simbolizando seu mundo. Isso leva à geração de hábitos e práticas, ou seja, estrutura a vida cotidiana.
Sob o estímulo da publicidade e dentro de uma cultura que prega que ser é ter, a criança e o adolescente aprendem que só será reconhecida na condição de parte do universo do consumo. Por essa lógica, são induzidos a crer que produtos de grifes integram a sua identidade, ajudando a defini-la. Passam, assim, a ter as marcas como uma espécie de segunda pele. Meninos e meninas tornam-se, sem perceber, outdoors ambulantes das marcas que deles se apropriam.
Por tudo isso e de várias maneiras, a publicidade dirigida à infância oculta a sua violência. Como vimos, ela está presente no processo que torna uma criança “socializada” para o consumo e “adequada” para uma estrutura dominante que, desde bem cedo, a criança aprende a considerar natural. Por essa lógica, quem tem os objetos valorizados é um ganhador. Os outros todos já são perdedores. Quem quer ser um perdedor?
Essa internalização consumismo como um valor central representa, claramente, a ordem do mercado participando da construção da subjetividade das crianças, adolescentes e adultos. Como um espelho onde elas vão se reconhecer. A internalização desse “estilo de vida” passa, portanto, pela construção do “hábito” de consumir e se reproduz em todas as relações. Como sabemos, hábitos são estruturais e estruturantes. E se é muito mais fácil formar hábitos na infância, é também notadamente mais difícil modificá-los na vida adulta.
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