Brasileiros – No ano passado, a Polônia foi a única nação da União Europeia a crescer. O que levou o país a isso?
Michal Boni – Foram diversas razões. A primeira é que começamos uma transformação em 1989, na transição do comunismo para a democracia. Desde então, adaptamos nossa economia permanentemente. Isso significa que os empresários e as instituições polonesas estão acostumados à necessidade de adaptação. Outra razão está conectada com algumas mudanças estruturais que o governo adotou, como revisão dos impostos e injeção de um pacote de estímulo à economia. Nós também recebemos dinheiro da União Europeia para investimentos em diversas áreas, como construção e setor de energia.
Brasileiros – O governo espera boas notícias para esse ano também?
M.B. – Com certeza. Em 2009, o crescimento da Polônia foi de 1,8%. Para este ano, esperamos um resultado entre 3% e 3,5%. Acho que só a Eslováquia vai alcançar esse número. A questão agora é saber se estamos prontos para pressionar a economia para evitar esse tipo de recessão e ao mesmo tempo criar um fundo para o crescimento. Não é uma questão fácil de responder, pois muitos países tiveram problema com endividamento público. Se compararmos a situação de alguns países europeus – como Portugal, Espanha e Irlanda – entre 2007 e 2010, a dívida pública cresceu de 25% a 65%. Na Polônia, o crescimento foi de 47% para 53%. Nossa situação está mais próxima de países como o Brasil, por exemplo, que não tiveram esse problema durante a crise.
Brasileiros – O mundo assistiu comovido à forma com que os poloneses viveram a catástrofe que matou o presidente Lech Kaczynski. O país saiu às ruas para homenagear os mortos. Durante as eleições, no entanto, não houve nenhuma manifestação popular em apoio aos candidatos. O que isso significa?
M.B. – Em abril, o presidente Kaczynski morreu no acidente aéreo, mais 95 pessoas muito importantes para a opinião pública e para a sociedade. Foi uma manifestação emocional. Eu acredito que 50% das pessoas que votaram em Kaczynski o fizeram por compaixão. A escolha não foi uma questão política. Somos uma sociedade normal, mais aberta do que antes. Por mais que não tenha havido manifestações nas ruas, eu acredito que essa eleição foi muito bem-sucedida. No início das férias, atingimos um nível de participação de 56%. Isso demonstra como as pessoas estavam determinadas a participar. Tivemos emoções fortes em abril, a sociedade ficou mais silenciosa, mas isso não é nenhum problema. Agora estamos seguindo em frente.
Brasileiros – A falta de carisma de Bronislaw Komorowski, apontada pela imprensa, pode influenciar no desenvolvimento da Polônia?
M.B. – Há países que precisam de presidentes carismáticos, porque líderes com carisma têm a possibilidade de mudar uma sociedade. É o caso do presidente Lula. Nosso primeiro-ministro Donal Tusk é um homem carismático e um ótimo líder. Mas ele decidiu não disputar essa eleição presidencial. Muitas pessoas diziam que ele poderia sair vencedor. Mas nós entendemos que essa é uma posição simbólica na Polônia, que está conectada com o início dos anos 1990, ao primeiro governo democrático. Mas de um ponto de vista prático, o poder do presidente é limitado. Ele tem o direito de veto se ele for usado de forma racional. Lech Kaczynski usava esse veto de forma não racional, ele estava representando a oposição. Isso foi prejudicial para a Polônia. A discussão com Kaczynski não estava relacionada com argumentos baseados na legislação, mas sim em um ponto de vista ideológico. Não cabe ao presidente discutir ideologia. Agora, voltamos à situação normal e temos de pensar na próxima eleição do Parlamento, em 2011.
Brasileiros – Quais mudanças serão adotadas no mandato de Komorowski?
M.B. – Agora, devemos discutir mais sobre o sistema educacional, a internet, a ciência e os negócios – discussões sobre o futuro e não sobre homens velhos ligados à história. Temos de focar o futuro da Polônia nos jovens.
Brasileiros – É possível comparar o impacto da entrada de Komorowski na presidência com a do primeiro governo democrático da Polônia?
M.B. – Eu não sei como a situação ficará, porque no final do ano teremos as eleições locais e, em 2011, a eleição do Parlamento. Não devemos adotar reformas dolorosas, mas sim continuar as medidas já em prática. Mas, em minha opinião, alguns pontos importantes, como a questão da idade de aposentadoria, deveriam ser revistos.
Brasileiros – A entrada de um liberal no governo pode significar uma Polônia mais próxima da União Europeia e do euro?
M.B. – Queremos entrar na Zona do Euro (a Polônia faz parte da União Europeia, mas não está na Zona do Euro assim como Bulgária, Dinamarca, Reino Unido, República Tcheca, Suécia, Hungria, Romênia, Estônia, Lituânia e Letônia), mas, neste momento, o euro não está tão forte. Então, acredito que a discussão sobre nossa entrada deverá ficar para 2015. Por outro lado, Komorowski será muito mais próximo da União Europeia do que Kaczynski. Mas nesse momento, nosso primeiro-ministro já mantém uma boa cooperação com os outros países do bloco. Acredito que tudo está sob controle. Nosso único obstáculo é a imprensa polonesa. Nós precisamos de um verdadeiro debate nas mídias. É muito difícil persuadir as pessoas a apresentar os argumentos do governo.
UMA HISTÓRIA MARCADA POR INVASÕES |
“A geografia é o destino do povo”, dizia Napoleão Bonaparte. A nenhum outro país europeu se aplica essa tese com tanta perfeição como à Polônia. Ao longo de sua história, o país foi alvo de diversas invasões territoriais que moldaram o desenvolvimento da nação. O primeiro Estado polaco foi fundado no século X, com um território muito semelhante ao da Polônia atual. A adoção do cristianismo e não da religião ortodoxa marcou, desde o início, sua clara diferenciação das outras nações do Leste. A sua situação estratégica no centro da Europa e as pressões sucessivas dos povos vizinhos fizeram com que, nos dez séculos de sua história, as fronteiras do país mudassem em diversas ocasiões. Seu apogeu foi atingido no século XV, com a união ao Grão-Ducado da Lituânia, criando a Comunidade Polaco-Lituana. Essa associação levou o Estado polaco à sua maior extensão territorial – quase 1 milhão de km2 – e a uma posição comercial chave na Europa, com acesso ao mar Báltico e ao mar Negro. Mas as sucessivas invasões dos turcos, suecos, prussianos e russos a fizeram perder sua independência no final do século XVIII. “A Polônia é um grande Estado, cercado de Estados ainda maiores e que possuem grande força ofensiva devido ao despotismo e à disciplina militar”, escreveu o suíço Jean-Jacques Rousseau, em 1772. Ao longo do século XIX, a Polônia viveu dividida entre Rússia, Prússia (depois Alemanha) e Áustria. Ela só recuperou a sua independência em novembro de 1918. Mas não por muito tempo. A invasão alemã na Polônia, em setembro de 1939, dá início à Segunda Guerra Mundial. O país se viu novamente dividido entre a Alemanha nazista e a União Soviética. Durante o período de invasão, perdeu cerca de 6 milhões de cidadãos. Depois da guerra, o país caiu no regime comunista imposto pelos soviéticos. Nos anos 1980, um movimento de reforma, o Solidariedade, começou a estruturar uma transição pacífica para a democracia. Em 1989, o governo comunista foi finalmente derrubado. |
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