Saíram os dados da ‘nova fase’ da maconha nos EUA. Uso e abuso aumentaram, diz estudo

Nos Estados Unidos, 23 estados possuem regulações para o uso da maconha medicinal. Dentre eles, 4 legalizaram a maconha também para uso recreativo. Esse tipo de política mais “permissiva”, sugere estudo publicado nesta quarta-feira (21) no JAMA Psychiatry, elevou o número de usuários e também daqueles que passaram por uma síndrome de abstinência relacionada ao uso abusivo da erva.

Essa síndrome, com diversos sintomas físicos e cognitivos, ocorre quando o uso é interrompido por usuários acostumados ao consumo de altas doses da substância (leia mais abaixo). 

Primeiro, o estudo constatou o esperado. O consumo da droga aumentou. O número de pessoas que relataram ter consumido a erva no último ano dobrou na última década. No período entre 2001 e 2002, cerca de 4,1% dos americanos relatavam ter usado a droga no último ano; entre 2013 e 2014, esse número saltou para 9,5%.

Agora, um dado importante está entre aqueles que relataram terem passado por uma síndrome de abstinência. Ele não é tão expressivo quanto o uso, mas indica, segundo os autores do estudo, que mais informações podem ser necessárias para informar a nova população usuária sobre os riscos associados ao uso frequente.

Assim, na esteira do crescimento do uso, os relatos de abuso ou dependência aumentaram (principalmente entre novos usuários). De 1,5%, entre 2001-2002; para 2,9%, entre 2013-2014.  Com isso, 3 em cada 10 americanos que usaram a erva no último ano tiveram diagnóstico de abuso (aproximadamente 6.8 milhões).

Desse número, vem uma sutileza importante. O estudo relata que esse incremento no abuso aconteceu majoritariamente entre novos usuários da maconha, o que ressalta a necessidade de um olhar mais atento para esses novos usuários. Entre consumidores antigos, contrariamente, o risco de abuso diminuiu, relataram. 

“Porque o risco para a dependência não aumentou entre os usuários, o aumento da prevalência de transtorno é devido a um aumento na prevalência de usuários na população adulta dos Estados Unidos”, escreveram.

Pesquisadores pedem que debate sobre legalização inclua informações sobre os riscos associados ao abuso. Foto: Ingimage
Pesquisadores pedem que debate sobre legalização inclua informações sobre os riscos associados ao abuso. Foto: Ingimage

A explicação para o aumento da dependência entre novos usuários, sugere o estudo, está numa percepção mais positiva dos americanos acerca da maconha, sem levar em conta os riscos.

“Pelas mudanças nas leis em relação à maconha, uma apresentação mais equilibrada sobre as consequências do uso são necessárias”, concluíram.

“Dada uma robusta conexão entre crenças sobre o risco e o atual uso, mudanças nessas crenças podem ter tido um papel importante no aumento da dependência”, escreveram.

Os pesquisadores pediram, ainda, que um otimismo acerca da legalização (principalmente no que tange ao comércio e na taxação) não se sobreponha à saúde pública. “A defesa dos  interesses da saúde e o papel da educação sobre os riscos devem fazer parte da discussão sobre a legalização da erva”, afirmam. 


Há uma síndrome da abstinência da maconha?

O entendimento formal de um diagnóstico de uma síndrome de abstinência provocada pela cannabis é relativamente novo. Ele só entrou de verdade no DSM em 2013. O DSM é a sigla em inglês para Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais. É um livro de referência usado por psiquiatras para efetuar diagnósticos e, assim, oferecer o tratamento. 

Publicado pela Associação Psiquiátrica Americana, o livro é o resultado de reuniões entre psiquiatras convidados pela associação que, baseados em estudos clínicos, fecham diretrizes que influenciam o resto do mundo. O estudo do JAMA citado acima usou o DSM como base.

A síndrome de abstinência de maconha só entrou na última edição, a quinta (2013)–ela não foi documentada em 1994, na penúltima edição -nem na sua revisão, que foi realizada em 2000. Havia uma menção à uma possível abstinência com uma justificativa sobre o porquê de não ter sido mencionada: “a sua relevância clínica é incerta”. Depois disso, no entanto, novas evidências surgiram, como esse estudo de revisão, de 2004.

Isto posto, segundo esse manual, há um conjunto de sintomas que ocorrem quando a maconha é retirada de um usuário sob altas doses frequentes da erva. Assim, dois ou mais dos seguintes sintomas seriam necessários para um diagnóstico de síndrome de abstinência de cannabis:

  • Irritabilidade, raiva ou aumento da agressividade;

  • Nervosismo ou ansiedade;

  • Dificuldade para dormir (insônia);

  • Diminuição do apetite ou perda de peso;

  • Inquietação;

  • Depressão;

E pelo menos um dos seguintes sintomas físicos (de modo significativo): dor de estômago, tremores, sudorese, febre, calafrios ou dor de cabeça.

O texto também descreve alguns sintomas “suspeitos”, descritos em estudos, mas não inteiramente investigados. São eles: sonhos perturbadores, fadiga, excesso de bocejos e dificuldade de concentração.

Vale lembrar que, de modo geral, estudos com a maconha, devido o seu status de proibição em boa parte no mundo, são poucos ou insuficientes. No próprio estudo do JAMA, os pesquisadores também pontuam que pouco se sabe sobre a eficácia dos tratamentos para esse tipo de síndrome, embora alguns estudos de revisão sugiram que a terapia cognitivo comportamental e substâncias usadas no tratamento de outras dependências possam ser eficazes.


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