Pianos ao cair da tarde

Meus caros, Keith Jarrett, pianista norte-americano que encanta o mundo com sua técnica impecável, a arte da improvisação deslumbrante, e um humor de grande estrela, dificílimo de lidar, vai tocar amanhã aqui em São Paulo. Já tentei ir a um concerto dele, anos atrás, ingresso caro já comprado, e, na hora “h”, ele cancelou tudo por achar que o piano não estava à altura dele. Já fez coisas bem piores, quando interrompeu apresentações por conta da tossida de alguém da plateia, ou por suspeitar que estava sendo vítima de uma gravação clandestina (não estava), e coisas semelhantes. Uma eventual tossida do público presente pode irritá-lo a tal ponto, que manda distribuir balas pastilhas de menta na entrada de seus concertos. Em certos momentos, chega a lembrar David Helfgott, o pianista esquizofrênico maravilhosamente interpretado por Geoffrey Rush em Shine (valeu-lhe um Oscar), pois geme, suspira alto, faz caras e se contorce, acompanhando as notas do piano verbalmente. A plateia, sempre maravilhada, perdoa tudo, e só ouvindo às suas gravações para entender. Como sugestão, se alguém não conhece, sugiro uma gravação de seu Concerto de Colônia, Alemanha, gravado em 1975, The Köln Concert. A gravação foi autorizada por ele, e é coisa dos deuses. Já o ouvi tocar o clássico popular americano Danny Boy, e fui às lágrimas,

Ele nunca sabe o que vai tocar, diz que se inspira no país, na cidade,  na própria plateia, e a música simplesmente flui de suas mãos. Sorte de quem estará lá para ouvir. Ele vai tocar amanhã na Sala São Paulo, os ingressos custam caro (R$ 350,00 a R$ 400,00), não sei se ainda existe algum disponível, mas valem cada centavo.

A má notícia do mundo da música clássica brasileira veio do maior pianista do Brasil, um dos maiores nomes da atualidade, ninguém menos que Nelson Freire. Também Cristina Ortiz, uma de nossas rainhas no teclado, já avisou que não virá, pelas mesmas razões. Em ambos os casos, as recusas se devem à balburdia que se instaurou na Orquestra Sinfônica Brasileira depois da entrada de Roberto Minczuk, que demitiu vários músicos. Freire e Ortiz tomaram as dores dos demitidos, e cancelaram suas apresentações, no caso dele, mediante uma singela mensagem. Perde a orquestra, perdemos todos nós. Para aqueles que não sabe do que falo, ou que estão à beira das lágrimas, sugiro o maravilhoso documentário de João Moreira Salles, sobre a vida de Nelson Freire, com dois DVDs, e no qual ele toca todo o Segundo Concerto de piano de Rachmaninoff. É mais do que musica, é oração! Abraços do Cavalcanti.


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