Causou espanto a recente decisão da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) e do Governo do Estado de São Paulo de desmatar 15 hectares do Parque Estadual da Serra do Mar – uma região de proteção ambiental – para desviar as águas da bacia do rio Itapanhaú a fim de abastecer a Região Metropolitana.
Espanto maior é a forma atabalhoada com que o governo tomou a decisão, passando por cima de leis ambientais criadas por ele próprio, realizando estudos insuficientes e optando por métodos antiquados para abastecer a Região Metropolitana de São Paulo, a justificativa para o desmate de 150 mil metros quadrados do parque, o equivalente a 15 campos de futebol em região remanescente de Mata Atlântica.
A análise é da engenheira agrônoma e ex-servidora do Ministério do Meio Ambiente e da Secretaria Meio Ambiente do Estado, Maria Cecília Wey de Brito, hoje membro do secretariado Aliança pela Água, uma entidade civil criada para discutir a segurança hídrica no Estado.
De acordo com a especialista, o governo e a Sabesp se valem de medidas ultrapassadas para abastecer a cidade. Ela se refere à preferência pelas obras de infraestrutura, caras e prejudiciais ao meio ambiente. “Não é de hoje que o Estado e a cidade optaram por essas obras. Canalização de rio, construção de represas”, enumera. “São projetos gestados por um conjunto de técnicos formados em velhas escolas que preferem esse tipo de solução, e todos sabemos que algumas tradições duram bastante para serem superadas…”
Ela explica que o projeto no Itapanhaú já estava desenhado há muitas décadas em estudos que previam cenários futuros e possíveis soluções. “Essa obra não veio com a crise. Algumas delas ficam engavetadas, às vezes para sempre, às vezes ressurgem.” Cecília Wey foi a uma reunião na Sabesp para entender a proposta. Saiu decepcionada. “Eles fizeram uma apresentação sucinta. Ficaram justificando a necessidade de mais e mais água”, recorda-se.
A especialista lamenta que outras ações tenham deixado de ser feitas nos últimos tempos. Duas delas são bem simples. “Poderiam ter diminuído os vazamentos na rede de distribuição e aplicado a Lei Florestal, que garante a preservação da fonte de água para produzir a quantidade e qualidade necessária”, diz.
Ambientalmente as consequências não se restringem à região desmatada, mas principalmente à região praiana, onde o rio deságua. “Por se tratar de um rio encachoeirado, a diminuição da vazão pode comprometer a posição de alguns animais que estavam em certa região do rio e que ficarão mais expostos, terão de migrar e se readaptar.” A mudança na quantidade de água salgada que vai adentrar o rio também pode comprometer os manguezais, uma das regiões mais biodiversas do mundo, consideradas berçários naturais para animais, aves, peixes, moluscos e crustáceos. Para se ter uma ideia, o mangue produz 95% do alimento que o homem pesca no mar.
Tão grave quanto tudo isso foi o processo que decidiu desmatar o parque. “Houve menosprezo de instrumentos obrigatórios por lei, como o plano de contingência, mas o que mais chamou atenção foi a falta de transparência.” Ela se refere às audiências públicas que validaram o desmatamento. “Todas foram marcadas para pertinho do Natal, quando nessa época há uma desmobilização natural da sociedade.”
De acordo com a diretoria de Avaliação de Impacto Ambiental da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) foi protocolado em no dia 19 de novembro de 2015 na Diretoria e também no Condephaat. “Falta a Sabesp entregar informações complementares solicitadas pela Cetesb e Fundação Florestal.”
Já a Sabesp frisou que a medida será “importante para o aumento da segurança hídrica do Sistema Produtor Alto Tietê” e que a região desmatada está inserida em uma área de 300 mil hectares. “Tudo o que vai acontecendo na Mata Atlântica é na base da formiguinha. São 15 hectares aqui, 10 hectares ali. No fim das contas, é muito mais do que se gostaria. O ideal é que não houvesse qualquer desmatamento.”
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