Outro dia, divulgaram uma pesquisa apontando Nova York como a cidade mais rude dos Estados Unidos. A isso, nós, nova-iorquinos, respondemos: “Get otta here!”. Suma daqui! Podem pegar suas Samsonites e voltar para Toledo, Ohio; João Pessoa, Paraíba; Xangai, China, ou qualquer buraco do qual vocês tenham saído. Vêm para cá fazer o quê? São masoquistas? Caso seja esse o caso, que paguem ingresso para as sessões de espancamento.

Aqui somos todos cavalheiros e damas. Caso contrário, a metralhadora seria o acessório de rigor entre os nativos. Sabe lá o que é responder 218 vezes por dia se Downtown é para lá ou para cá? Ou onde fica a loja Century 21? Mas ninguém nos vê cravejando de balas essa canalhada. Pegamos o mapa empunhado pelas mãozinhas úmidas de excitação e, falando pausadamente e bem alto (achamos que estrangeiros entendem melhor quando carregamos na voz), explicamos direitinho os caminhos para os peregrinos.

Ninguém dá bola se o turista fala inglês ou não. Qualquer grunhido é imediatamente traduzido para língua de gente. Nessa cidade até os ratos são poliglotas. E por falar em nossos concidadãos roedores, corre pela internet vídeo de um ciclista nova-iorquino tirando o casaco, jogando sobre um rato que estava no meio da Oitava Avenida prestes a ser esmagado pelas rodas dos carros. O cara salvou o bicho e o levou para o bueiro mais próximo para garantir a escapada. Dizem que o bom samaritano agiu, na verdade, para a preservação da própria espécie, já que os mensageiros movidos a bicicleta são considerados ratazanas imundas pelo resto da população. Pouco importa os motivos: valeu a ação rápida do carinha.

Aqui é o único lugar do mundo onde os trens de metrô têm carros restaurantes. São, diga-se, todos os compartimentos de uma composição. Os passageiros fazem verdadeiras refeições italianas durante as viagens. Manjam antipasto, sopa, salada, primo piato, contorno, secondo, sobremesa e, caso a viagem seja um pouco mais longa, mandam para o papo uma távola de queijos. Grandes quantidades desse repasto são divididas com os companheiros de infortúnios. Sobra comida e bebida no colo de todos os que estão por perto.

E o que ganhamos com tantas mesuras? A fama de malcriados. Quando cheguei por aqui, no comecinho dos anos 1980, era possível andar por toda a Rua West Broadway, no Soho, sem encontrar mais do que meia dúzia de pessoas. Hoje, ali, nem no urinol a gente tem menos de 24 indivíduos dividindo o espaço. Tenho um amigo que mora no Soho desde que ali só tinham galpões e armazéns sem calefação, banheiros, elevadores e o mínimo de condições para habitação. Ele, arquiteto, foi reformando, melhorando o pedaço e gerenciando o prédio onde vivia uma comunidade de artistas plásticos. O cara adorava o local. No mês passado, depois de 35 anos, vendeu seu lar para um garoto rico japonês. Não aguentava mais as multidões de turistas à sua porta e a orgia consumista das lojas pretensiosas que substituíram as galerias de arte. O cara vai para Baltimore, em Mariland.

Depois, nós é que somos rudes. Fogetabouit!


Comentários

Uma resposta para “Suma daqui”

  1. Eu moro no Brasil e adoro nova york, perguntei a um amigo do Oregon pelo facebook o que ele achava da cidade, e ele respondeu: -Morei lá por 2 anos, e não gostei porque a cidade é muito rude, as pessoas são malcriadas.
    Confesso que depois de ele dizer isso, fiquei com uma pulga atras da orelha, agora que lí essa crítica entendo muitoo lado de vcs nova yorkinos acho que os turistas deveriam estudar bem os mapas antes de visitar a cidade, eu nao me perderia nessa cidade, nao em Manhattan.
    ADOREI SEU TEXTO!! concordo plenamente com o seu lado!!

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