A expressão entre marota e sinistra de João Café Filho não entrou por acaso para a galeria de fotos dos presidentes, no terceiro andar do Palácio do Planalto, em Brasília. Em vez de apoiar o governo Getúlio Vargas, o vice Café Filho aderiu à conspiração que culminou no suicídio do presidente.
Foram tantas as articulações políticas que, no auge da crise, Café Filho ficou “quase em vigília”, como noticiou O Globo: “Estamos informados de que, de sábado para domingo, teve pouquíssimas horas de sono, somente de madrugada, ainda assim em uma rede, na varanda de sua casa”.
Naquela altura, Getúlio já tinha avisado que só morto sairia o Catete, a sede do governo, no Rio. Era uma segunda-feira, dia 23 de agosto de 1954. Em junho, o impeachment do presidente havia sido barrado no Congresso por 136 votos a 35. Faltava fundamentação jurídica, mas a oposição persistiu.
A pressão pela renúncia ficou forte em agosto, depois que a investigação de um atentado envolvendo o chefe da guarda pessoal de Getúlio emparedou o governo. O presidente se recusou a renunciar. Desconfiado de traição, também descartou a proposta de dupla renúncia, anunciada por Café Filho.
O vice tinha chegado ao Catete depois de uma trajetória discreta. Goleiro do Alecrim Futebol Clube, em Natal (RN), ele se deu mal no futebol, mas se revelou como advogado. Depois, entrou para a política. Era deputado federal, no Rio, quando aderiu ao partido de Adhemar de Barros, o PSP.
Nas negociações de bastidor para a campanha de 1950, Adhemar indicou Café Filho como vice da chapa. Getúlio, por sua vez, preferia ter como vice o general Góis Monteiro, mas precisava do apoio de Adhemar e do PSP para ganhar as eleições.
“Getúlio não confiava em Café, tinha-lhe horror físico”, registrou o jornalista Samuel Wainer em suas memórias. “Getúlio certamente sentira em Café o cheiro do oportunismo, da mediocridade, da traição, numa intuição premonitória que seria dramaticamente confirmada em agosto de 1954.”
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