Dez dias que abalaram o Brasil

O senador Romero Jucá fala sobre seu afastamento do ministério Temer - Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
O senador Romero Jucá fala sobre seu afastamento do ministério Temer – Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

O escândalo que eclodiu hoje com a divulgação da conversa entre Sergio Machado e Romero Jucá não só inviabiliza Jucá como um dos principais ministros de Temer e senador – o PDT já entrou com pedido de sua cassação –, mas também inviabiliza o próprio governo Temer.

A conversa confirmou o que eu e vários colunistas já tínhamos escrito durante o processo de impeachment: que o principal objetivo era colocar no poder um governo que barrasse a Lava Jato. A presidente Dilma estava deixando a Lava Jato agir, o que colocou a classe política em polvorosa, pois peixes graúdos estavam com os rabos presos.

A outra coisa que todos viram acontecer foi o ministério Temer ser composto por deputados e senadores que votaram no impeachment, numa clara troca de favores, o que foi não só uma vergonha nacional como um escárnio.

O que também confirma o teor da conversa entre Machado e Jucá é a composição do ministério, com ao menos sete integrantes envolvidos na Lava Jato, dando a entender que o novo governo seria um bunker que protegeria do processo quem nele se abrigasse.

Por todos esses motivos, com apenas dez dias no poder – dez dias que abalaram o Brasil –, o governo ficou nu.

Estamos todos vendo que 1) o principal objetivo não era combater a corrupção nem a recessão e sim encontrar uma forma de proteger os principais políticos do PMDB do tsunami da Lava Jato, motivo pelo qual tudo foi feito de forma atabalhoada, sem dar tempo para que os brasileiros raciocinassem a respeito do que estava acontecendo, insuflados principalmente pela Rede Globo, que foi a responsável por colocar nas principais ruas do país milhões de brasileiros, pois foi ela – o mais forte meio de comunicação do Brasil – que os convocou; foi esse o primeiro acordo; 2) houve um segundo acordo tácito: quem votasse pelo impeachment, deputados e senadores, seria convocado para formar o ministério, acordo esse que foi integralmente cumprido e 3) o ministério serviria de abrigo para quem estava sendo investigado na Lava Jato.

Diante desses três fatos, que eram conjecturas, mas hoje estão comprovados e tendo em vista que o próprio presidente provisório foi citado em várias delações da Lava Jato, não há como esse governo continuar, a menos que todo o ministério renuncie ou ao menos sete ministros caiam juntamente com Jucá.

No entanto, nem essa hipótese resolve a crise que hoje chegou ao ponto de ebulição máximo. Ainda que todo o governo fosse trocado não terminaria a expectativa de que a qualquer momento o próprio Temer pudesse ser atingido pelo tsunami, que se aproxima dele. Não só o tsunami da Lava Jato, mas também o da tramitação do impeachment contra ele que pode ser aberto na Câmara como também o processo que pode resultar na cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE.  

Não faltaram sinais de que esse governo poderia ser breve. Eu mesmo escrevi isso aqui várias vezes. Escrevi que Temer poderia ser conhecido como Temer, o breve. Escrevi que apressado come cru. Escrevi que os novos ministros estavam agindo como uma manada de elefantes numa loja de louças, o que suscitou um enorme movimento de rejeição a Temer resumido na frase que virou moda em todo o país: fora Temer.

Vários senadores se pronunciaram, hoje à tarde, com o propósito de encontrar uma saída para a crise que, se era grande enquanto Dilma estava no Palácio do Planalto agravou-se ainda mais agora que o Planalto foi ocupado e tomado pela tropa do PMDB. Disseram eles – Paulo Paim, João Capiberibe e até Cristóvão Buarque, o primeiro desiludido com o governo provisório, o qual ajudou a assumir – em resumo, que deveria partir de Temer a iniciativa de procurar Dilma e ambos acertarem um novo pacto que implicaria em 1) fim do governo provisório Temer; 2) fim do processo de impeachment e 3) convocação de eleições presidenciais ainda este ano.

Como diria Mané Garrincha, falta combinar com os russos. A ideia não é má, mas para se viabilizar será necessário discutir alguns detalhes. A situação mais confortável, agora é da presidente Dilma. O escândalo de hoje corrobora a sua tese de que o impeachment foi um golpe do PMDB, confirma que ela não estava barrando a Lava Jato e, portanto, aumenta as chances de ela ganhar a votação no Senado quando o julgamento do processo chegar ao final, daqui a no máximo seis meses.

No entanto, a situação do país, ao contrário da dela, não é nada confortável. O caos instalado por Temer e seus coadjuvantes aumentou ainda mais a tensão, que vem crescendo desde o ano passado, razão pela qual o clima de confronto contamina praticamente todos os setores da sociedade, os mais humildes estão apavorados com os anúncios dramáticos de cortes no Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida, Fies, Pronatec, Previdência, salário mínimo e a economia continua patinando. Ou seja: ninguém está satisfeito. Nem o pato amarelo da Fiesp.

A questão principal, se os dois aceitarem a sugestão dos senadores é como fica o governo até que aconteçam as eleições. O mais razoável, tendo em conta que o governo Temer se inviabilizou antes do que se imaginava é voltar a tudo como era dantes no quartel de Abrantes. Volta Dilma ao Planalto, Temer volta ao Jaburu, voltam os ministérios com seus respectivos ministros, volta o presidente da EBC e volta até o garçom que foi demitido enquanto ocorrem os preparativos eleitorais, tais como as convenções partidárias, as campanhas etc. etc. Claro que seria uma grande derrota para a direita brasileira, uma grande derrota para Temer, para o PMDB, mas talvez seja o único gesto capaz de recuperar um pouco da sua honra, mostrar que ele não é tão leviano assim e estancar o movimento “Fora Temer” que deve ser um espinho cravado na sua garganta.

É importante salientar que esse arranjo político só será possível com a adesão da Rede Globo. Somente ela, com seu inegável poder de persuasão, poderá convencer não só os políticos como a sociedade brasileira que esse é o melhor caminho para o país finalmente entrar nos trilhos.

Se nada disso ocorrer teremos mais seis meses de confronto, ocupações, protestos, greves, demissões, economia em queda e sabe-se lá o que mais.     


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