Teorias conspiratórias e alegações pseudocientíficas sobre o vírus zika podem estar colocando a população em risco, diz um artigo publicado no “Vaccine”. A pesquisa analisou conversas nas mídias sociais em tempo real e identificou que algumas acusam a vacina tríplice (contra a rubéola, caxumba e sarampo) de ser a responsável pelas anomalias em bebês – e não o zika. Outra teoria dizia que a indústria farmacêutica está “culpando” o vírus para lucrar com a venda de vacinas.
No Brasil, desde dezembro de 2015 instituições como o Ministério da Saúde, Fiocruz e Organização Mundial da Saúde trabalham para tentar esclarecer boatos sobre o zika. Nesta nota no site do ministério, de dezembro de 2015, o governo esclareceu teorias que alegavam ser as más-formações relacionadas a vacinas vencidas ou a mosquitos transgênicos. Todos os boatos foram negados com vídeos informativos.
Pesquisadores por trás do estudo, no entanto, alertam que é preciso agir mais rápido. Segundo os cientistas, autoridades de saúde devem monitorar a rede social para que respostas efetivas e rápidas sejam feitas no próprio ambiente de rede. A pesquisa foi realizada por professores pertencentes a instituições respeitadas nos Estados Unidos (George Washington University, Johns Hopkins University e University of Georgia).
A relação do zika com a microcefalia está bem documentada. Um estudo importante publicado na revista Nature provou a relação de causalidade entre os dois com métodos que incluíram mini-cérebros humanos criados em laboratório e camundongos fêmeas gestantes que foram infectadas pelo vírus. Outros estudos também atestaram a presença do vírus no líquido amniótico e provaram que ele é capaz de atravessar a placenta.
Mesmo assim, segundo os pesquisadores, a incerteza sobre a origem e os efeitos do zika ainda encontram um terreno fértil em que conspirações florescem. O artigo argumenta que esse tipo de boato pode ter um efeito duradouro sobre as decisões relacionadas à saúde das pessoas. Se indivíduos em busca de informações sobre o zika se depararem com o boato de que vacinas “causam” as anomalias, por exemplo, eles podem ser levados erroneamente a evitarem a vacina, com efeitos catastróficos para a saúde pública.
“Depois que as pessoas se convencem sobre algo, é difícil para elas mudarem suas opiniões”, disse o autor principal do artigo, Mark Dredze, professor da Johns Hopkins.
Por que as pessoas acreditam em boatos?
Um dos aspectos interessantes citados pelos especialistas no artigo da Vaccine é que muitas das teorias conspiratórias vistas na rede podem ser associadas a concepções anteriores e até a visões negativas sobre empresas que sequer estão envolvidas no caso.
Por exemplo, a ideia de que um larvicida (veneno usado contra as larvas do Aedes) poderia ser o responsável pela microcefalia, segundo os autores, encontrou espaço porque já há um discurso prévio sobre agrotóxicos e uma visão negativa sobre a Monsanto. Para se ter uma ideia do alcance da associação, a empresa não é responsável pela fabricação do larvicida, mas muitos dos boatos diziam que sim.
“O fato da Monsanto ser classificada como a “terceira empresa mais odiada na América” (…) fez com que a história do larvicida (supostamente feito pela Monsanto) fosse prontamente crível para as pessoas que já vêem a empresa negativamente”, diz o artigo.
Também a falsa ideia que vacinas vencidas poderiam estar relacionadas às más-formações tem origem, segundo o artigo, num movimento antigo que é contrário ao imunizante*. Esse movimento fez com que doenças já controladas voltassem em surtos localizados. Recentemente, surtos de sarampo ocorreram na Disney. Esse movimento também já teve seus efeitos no Brasil, quando um surto da mesma doença ocorreu em 2011, na Vila Madalena, em São Paulo.
*(Entenda um pouco mais sobre esse movimento nesta reportagem. Outra matéria –que pode ser lida aqui- mostra reação de usuários a uma foto postada por Mark Zuckerberg, criador do Facebook. Na foto, Zuckerberg dizia ter ido vacinar a filha).
Artigo mapeou o Twitter
Para investigar o impacto das teorias, a equipe americana monitorou Twitter em tempo real. O método deu uma visão rápida sobre o que as pessoas estavam falando on-line. Eles identificaram cerca de 140.000 tweets entre 1 janeiro e 29 de abril de 2016, que continham a palavras-chave “vacina” e “zika.” Eles observaram uma série de teorias da conspiração, ou alegações pseudocientíficas, questionando por que os governos queriam uma vacina.
“Mesmo que a ciência seja relativamente clara, encontramos muitas teorias de conspiração que poderiam estar afetando as decisões das pessoas “, disse o professor David Broniatowski, da George Washington University.
Os pesquisadores aconselham que autoridades de saúde pública usem ferramentas de rastreamento de rede e abordem as preocupações das pessoas em tempo real. O método reduz o tempo que entre a reação das autoridades e o boato. Embora no Brasil, por exemplo, as autoridades de saúde tenham respondido a muitas das dúvidas, muitos boatos já estavam se espalhando há algum tempo.
“Esta é uma abordagem promissora para a rápida resposta à doença e poderia ajudar a neutralizar o impacto negativo dessas teorias da conspiração no futuro”, disse Broniatowski.
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