A população francesa sabia bem o que queria: 74% eram contrários ao projeto de flexibilização das leis trabalhistas proposto pelo governo de François Hollande no inicio de maio, enquanto 48% não só eram contrários como defendiam o veto total do texto. Com tamanho descontentamento, os movimentos sociais franceses decidiram sair às ruas: só na semana, ocuparam as oito refinarias de petróleo francesas e todas as centrais nucleares e paralisaram boa parte dos transportes públicos. O impacto sobre o cotidiano foi tamanho que acabou dividindo a população.
O projeto de lei de Hollande facilita a demissão de funcionários e pode aumentar a jornada de trabalho para os franceses. Na segunda-feira (30), seis das oito refinarias ainda estavam ocupadas ou operando parcialmente. A principal companhia de trens – a SNCF, principal responsável pelo transporte de torcedores na Eurocopa, este ano na França – continuava em greve, alguns portos foram paralisados e, a partir da próxima quinta-feira (2), o transporte público parisiense também vai parar. Até a circulação de aviões deverá ser tumultuada nos dias que antecedem a Eurocopa, marcada para começar no dia 10 de junho.
O entregador Philippe François, 55, esperou meia-hora em uma fila para finalmente abastecer seu carro na quarta-feira (25). Teve sorte. “Outros não conseguiram achar nenhum posto com gasolina na cidade”, explicou à Brasileiros. “Criou um pânico geral entre a população”.
Estudante de ciências políticas, Camille Ely, 23, assistiu a brigas nos postos em razão do racionamento. Até a última quinta-feira (26), 20% das bombas não tinham uma única gota de gasolina. Apesar dos inconvenientes, François e Camille, como outros franceses entrevistados pela reportagem, defendem os protestos.
Mas não é o caso de Fatima H., 27, que trabalha com recursos humanos e mora em Lyon. Ela diz que viu seus hábitos mudados por causa das greves dos transportes. “Em vez de dez minutos de trajeto com o trem, levo 40. Se tento ir de carro, pego trânsito”, explica. “É a pior greve que enfrento desde que comecei a andar com o transporte”, disse.
Já as relações públicas Elodie Dupont, de Paris, não teve seu cotidiano afetado. Prefere metrô ao carro, e como mora perto do trabalho, também pode chegar andando até ele. Mas como Fatima, ela não se sente representada pelos protestos. “O problema na França é que fazemos tanta greve para tudo que, no fim, acabamos irritados.”
Para o representante comercial David Arnone, 25, “os protestos se tornaram parques de diversões para agitadores que queimam carros e lojas”. Ele diz que sindicato se apropriou do movimento para reforçar sua imagem, mas “não o representa”. Ele critica a ação nas refinarias por ter provocado a “subida no preço da gasolina”. Desempregada, Manon Leroy, 25, confirma o aumento de preços, mas apoia os sindicatos. “Acredito que as ocupações representam um meio de pressão eficaz, sobretudo economicamente. Mas acho deplorável que os preços aumentem.”
“O objetivo de nossas ações é o bloqueio da economia pela redução da sua rentabilidade e da sua produção”, explica Thibault N., sindicalista da CGT que preferiu não revelar seu sobrenome. “Todas as quintas-feiras chamamos para a greve. A nossa mensagem para o governo é que não é facilitando as demissões que o desemprego será resolvido.”
Thibault acredita que, “entre a população francesa, têm os que estão a favor dos protestos e contra a lei trabalhista, aqueles que se sentem afetados pelas greves e os que não importam”, mas que a maioria está a favor dos movimentos, mas deixa os sindicatos representá-la.
De ações concretas, Thibault conta ter participado a ocupação da sede do Partido Socialista (PS) da cidade onde trabalha, Grenoble. Ele confia que o partido socialista (do presidente Hollande) é o alvo principal dos movimentos, pois François Hollande “traiu os franceses” de ter prometido uma agenda de esquerda, mas implementado medidas liberais. Em Grenoble inclusive, houve tiros no prédio do partidona última segunda-feira (23).
Por se tratar da maior mobilização francesa desde 2010, Thibault acredita no poder das mobilizações sobretudo porque “estamos a dias do inicio da Eurocopa”, explica. “Chamamos uma greve geral para o dia 14 de junho, quatro dias após o inicio do campeonato, chamamos para greve generalizada”, disse. Thibault acredita que o governo pode considerar a retirada da lei se todos os olhos do mundo estiverem voltados para a França. “[O governo] não vai querer prejudicar a Eurocopa com as mobilizações do dia 14 de junho.”
Desempregado, Pierre-Antoine L., 28, de Besançon, no leste francês, não só apóia os protestos como participou do bloqueio de uma estrada na cidade. Cruzou muita gente irritada com os movimentos. “Preciso buscar minha filha na escola; estou com presa, saiam daqui”, foram discursos que ele ouviu durante a ocupação. “Acho que essas pessoas não entendem que tudo o que está acontecendo é culpa do governo.”
Deixe um comentário