Enquanto os americanos debatem sobre como responder ao massacre no mês passado em uma boate gay em Orlando, na Flórida, os brasileiros enfrentam sua própria epidemia de violência homofóbica, que, segundo alguns levantamentos, rendeu ao Brasil a classificação de lugar mais fatal do mundo para lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros. Quem opina é o jornal americano The New York Times em reportagem sobre o tema.
O diário cita as 1.600 pessoas que morreram em ataques homofóbicos nos últimos 4 anos e meio. “E esses números representam apenas a ponta do iceberg de violência e derramamento de sangue”, disse Eduardo Michels, o responsável pela compilação de dados para o Grupo Gay da Bahia.
Segundo a reportagem, essas estatísticas destoam da imagem brasileira, de sociedade aberta e tolerante, “nação que nutre expressões livres de sexualidade durante o Carnaval e realiza a maior parada gay do mundo na cidade de São Paulo”.
“Nós vivemos desta imagem de lugar aberto e tolerante”, disse Jandira Queiroz, coordenadora de mobilização da Anistia Internacional Brasil. “A violência homofóbica atingiu níveis de crise e está piorando.”
A reputação do Brasil de tolerância não é injusta, diz o texto. “Nas quase três décadas desde que a ditadura militar deu lugar à democracia, o governo brasileiro introduziu numerosas leis e políticas visando melhorar a vida das minorias.” Em 2003, o Brasil foi o primeiro país na América Latina a reconhecer uniões de mesmo sexo para fins de imigração, e foi um dos primeiros a permitir que casais gays adotassem crianças.
Alguns especialistas sugerem, no entanto, que as políticas progressistas dos governos avançaram muito à frente dos costumes sociais tradicionais. A violência homofóbica pode estar relacionada à cultura de machismo “e ao estilo de cristianismo evangélico do Brasil, exportado dos Estados Unidos, que é abertamente oposto à homossexualidade”.
As igrejas pentecostais “exercem um papel cada vez mais forte na política brasileira”. Dobrou o número de parlamentares eleitos desde 2010. Jean Wyllys, o único membro assumidamente gay do Congresso brasileiro, disse que os legisladores evangélicos, o núcleo de uma coalizão conhecida como “Bancada BBB” (Boi, Bíblia e Bala), têm impedido legislação que puniria a discriminação homofóbica e o endurecimento das penas por crimes de ódio. “Os evangélicos estão ficando cada vez mais poderosos e tomaram o Congresso”, disse.
Os políticos conservadores fazem resistência aos esforços para ensino da tolerância nas escolas e a polícia mostra pouco interesse em adotar programas de treinamento para lidar com crimes de ódio. As vítimas de violência homofóbica e transgênero dizem experimentar humilhação com frequência por parte dos agentes da lei, “alguns abertamente hostis aos pedidos para que o crime seja registrado como motivado por homofobia”.
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