A iniciativa do governo federal, de anunciar da forma mais espalhafatosa possível a prisão de dez pessoas suspeitas de planejar um atentado na Olimpíada, foi um erro estratégico de enormes proporções. O grupo era formado integralmente por amadores, que não dispunham nem sequer de uma arma. A exposição do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, tinha o objetivo de tranquilizar o País, mas provocou o efeito contrário. A bazófia do governo só vai estimular os terroristas profissionais a agir.
Em seus escritos, Maquiavel advertia os leitores de que as bravatas são perigosíssimas porque elas despertam a cólera dos inimigos e os induzem a lutar com todas as suas forças. E, numa passagem famosa de O Príncipe, ele recordava o risco trazido pelas “ofensas leves”, que deixavam sempre aberta a possibilidade de uma vingança.
O fundador da ciência política tratou demoradamente deste tema num dos capítulos de seus “Comentários sobre a Primeira Década de Tito Lívio”. Ali, Maquiavel escreve: “Estou convencido de que uma das maiores provas de sabedoria que se pode dar é abster-se de proferir palavras de injúria ou ameaça contra quem quer que seja; longe de enfraquecer o inimigo, a ameaça faz com que levante a guarda; a injúria acrescenta-se ao seu ódio, incitando-o a prejudicar quem o ofender”.
Em seguida, Maquiavel lista exemplos convincentes dos prejuízos que as ofensas aos inimigos podem acarretar. Um deles é o do general persa Gabas, que assediava a cidade de Amida. A forte resistência da fortaleza convenceu o militar a levantar o cerco e ir embora. Diante dos sinais de retirada, os soldados de Amida foram às muralhas e cobriram os inimigos de insultos, chamando-os de fracos e covardes. Os soldados persas se revoltaram, e Gabas retomou os combates. Conquistou a cidade em poucos dias.
Um exemplo recente de reação provocada pela propaganda governamental aconteceu no Brasil, durante o regime militar. No início de 1969, a ditadura anunciou a desarticulação completa do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro). A ofensiva midiática do Estado convenceu os demais grupos que combatiam a ditadura a reagir da forma mais dura possível. Em setembro daquele ano, um outro grupo guerrilheiro sequestrou o embaixador americano no Brasil, Charles Elbrick, e com isso conseguiu libertar 15 líderes de esquerda. Para desmoralizar a propaganda governamental, o grupo adotou o nome de MR-8. A operação mais exitosa da guerrilha durante todo o regime militar surgiu exatamente em resposta a uma operação de propaganda.
No caso da Olimpíada, a situação é ainda mais perigosa porque o Estado Islâmico encontra-se muito fragilizado: já perdeu um quarto do território que ocupava na Síria (incluindo a cidade de Palmira) e no Iraque (onde o grupo perdeu o controle sobre Fallujah). A operação da Polícia Federal, ao sinalizar que o governo brasileiro “derrotou” o movimento, impulsiona seus simpatizantes a tomar alguma atitude para desmenti-lo.
Há mais de um mês os extremistas islâmicos vêm publicando textos em português com instruções e métodos de ataques, como sequestros, uso de drones, acidentes de carro e esfaqueamento. Os alvos principais são as delegações de atletas e os turistas dos Estados Unidos, do Reino Unido, da França e de Israel.
O problema reside aí: como o recrutamento de militantes para o Estado Islâmico ocorre pela internet, a adesão ao grupo tende a variar de acordo com a repercussão de suas ações na mídia. Na tentativa de mostrar controle absoluto sobre a situação, o Planalto deu ao grupo uma visibilidade descomunal. Os riscos de um ataque aumentaram muito.
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