O pouco tempo de Michel Temer já foi implacável para o SUS. Quando tomou passe como interino, Temer retirou 2,5 bilhões do Ministério da Saúde, nomeou ministro Ricardo Barros (PP/PR) ligado a planos de saúde, e pôs em curso Proposta de Emenda Constitucional, a PEC 241, apresentada no dia 15 de junho, que promete congelar os recursos do governo em saúde e educação nos próximos 20 anos. Com propostas pré-Constituição de 1988 e um projeto político de Estado mínimo travestido de necessidade – a de que é preciso rever o tamanho do SUS por conta da crise – Temer poderá deixar um estrago que será muito maior que seus dois anos e alguns meses no poder.
Não será fácil defender a saúde em meio a um projeto político que não se preocupa em esconder que jogará todas as contas na crise fiscal nos mais pobres – quando, sob o pretexto da crise, retira recursos de áreas prioritárias, enquanto projetos como a taxação de grandes fortunas, adotados até por países como os Estados Unidos, passam ao largo de qualquer debate. Crise para quem?
Crise para os 150 milhões de brasileiros que dependem unicamente do sistema, crise para quem ficará aguardando consulta por meses e cirurgias por anos. Crise para quem ficar nos corredores. Crise para as mães de bebês com microcefalia… Essa é a verdadeira crise.
Que fique registrado. Essas mortes serão jogadas nessa conta do SUS que nunca fecha e não numa abstração sobre a “ineficiência do sistema público e a eficiência do setor privado”. Há problemas de gestão? Até há, mas ela não está numa dicotomia rasa entre o privado e o público, em que pese para o público toda a ineficiência e para o privado, os louvores. A Unimed Paulistana foi o quê? Um exemplo de exímia gestão?
No fim, não é preciso muito para saber que o que falta ao SUS é dinheiro mesmo. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, o Brasil é um dos poucos sistemas universais do mundo em que os gastos privados superam o público. O país gastou em 2012, durante o governo Dilma, US$ 512 por cidadão por ano. Isso fica abaixo da média mundial, de US$ 602, mas já foi pior: em 2000, o gasto foi de US$ 107. Resta saber o que será do Brasil nesse relatório da OMS no pós-Temer: com o que já foi apresentado, tudo indica que ainda pior do que era na era Dilma – situação que já não era nada boa, diga-se de passagem.
A PEC 241, citada acima, está em trâmite na Câmara Federal – nela, investimentos em saúde e educação deixam de ter como base a arrecadação e a receita. Não importa se a população vai aumentar, se vai ter Zika… o investimento será o mesmo, independente de a economia crescer. A medida é considerada inconstitucional –e por isso muitos são os movimentos que a consideram pré-Constituição de 1988- porque infringe o princípio do “não-retrocesso”.
Não foi por falta de resistência. O movimento de defesa do SUS é fortíssimo e envolve movimentos populares e articulações em bairros, como os Fóruns Populares. A resistência entre sanitaristas também foi grande – começou com protestos e levantes em defesa da democracia, passou pelas ocupações ao Ministério da Saúde pelo País, pelas cartas assinadas por diversos especialistas e associações…
A esquerda e os movimentos de saúde agora têm um desafio. Com a posse de Michel Temer, qual será a estratégia? Continuar a negar o seu governo, como ocorreu nas ocupações das sedes estaduais do Ministério da Saúde pelo Brasil, ou tentar dialogar para que recursos não sejam retirados do Sistema Único de Saúde? Será difícil escolher uma única pauta com todo um projeto político que jamais passaria pelo escrutínio de quem construiu a saúde pública no Brasil.
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