As histórias por trás das imagens

Foto: Lawrence H. Beitler Library of Congress, Prints & Photographs Division, Visual Materials from the NAACP Records.jpg
O CIDADÃO MEEROPOL Linchamento de dois negros registrado por Lawrence H. Beitler; imagem “descoberta” por Abel Meeropol (Biblioteca do Congresso americano, Print & Photographs Division, Visual Materials from the NAACP Records)

Em seu livro Instante Certo, a jornalista Dorrit Harazim nos remete, pelo menos aparentemete, ao tão discutido conceito do fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson (1908-2004) do “instante decisivo”, aquele átimo em que a cena se configura à sua frente e o fotógrafo aciona o disparador da câmera. Mas, ao começarmos a ler os 38 textos aqui reunidos, escritos entre 1995 e 2015 e publicados nas revistas Veja, Piauí e Zum, notamos que essa percepção é equivocada. Dorrit fala sim de fotografia, tema que conhece muito bem, mas fala muito mais das histórias que estão por trás dessas fotografias. Com um texto preciso e precioso, ela nos leva por uma narrativa que todos os críticos de imagem nos deveriam levar. Como boa jornalista, sabe que a fotografia está circunscrita a um tempo e lugar, e, portanto, a um olho do período. 

Dorrit contextualiza as fotografias e os fotógrafos, não importa se reconhecidos ou menos, se profissionais ou amadores, mas, como ela mesma afirma na introdução do livro, “são fotos que teimaram em não sair de minha memória”.

Num segundo momento, no mesmo texto, afirma que é um livro “que será de pouca serventia aos praticantes do ofício. É mais voltado para os curiosos em geral”. E aí ela se engana. O livro é voltado para todos os que trabalham com fotografia porque nos ajuda a entender os processos de elaboração das imagens. Seus textos são uma aula de história, de cultura e, por que não?, também de história da fotografia. Descobertas de imagens de arquivo, histórias de fotógrafos que ficaram conhecidos por uma única imagem, resenhas de relatos, como o livro o Clube do Bangue-Bangue, que narra a história de quatro fotógrafos sul-africanos que cobriram um dos momentos mais sangrentos do país, entre 1990 e 1994. Ou o interessante trabalho do fotógrafo chinês Li Zhensheng, que, durante 20 anos, escondeu fotos que fez denunciando o lado obscuro da Revolução Cultural Chinesa, instalada por Mao em 1976.

Ou ainda quando se refere à estetização exacerbada das imagens de guerra, discutidas no livro de David Shields, estética essa que, de alguma forma, iniciou pós 11 de Setembro de 2001, ou ainda as belíssimas imagens coloridas feitas pelo fotógra­fo russo Sergei Mikhailovich Prokudin-Gorskii no início do século XX, quando a cor na fotografia era incipiente. Não importa. É praticamente impossível termos uma leitura única da imagem, assim como também é impossível afirmar o que o fotógrafo pensava ou quis dizer no momento da foto, a não ser, é claro, que tivéssemos um depoimento do mesmo. Por isso é tão importante contextualizar uma fotografia, saber a mentalidade de cada época em que ela foi tirada e perceber que, na maioria das vezes, a estética é formadora de um discurso, e não o conteúdo. Repetindo o que escrevi antes, o livro de Dorrit Harazim é sim para fotógrafos e para todos que – e hoje são muitos – são fascinados por fotografia. Uma coletânea como essa fazia falta! Agora não mais! 

instantecerto


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