Mesmo que muitos não saibam quem é o artista por trás da obra, milhões de pessoas certamente já observaram os rostos estampados nos vidros da estação Sumaré de Metrô, em São Paulo. Com fotos de anônimos, impressas em preto e branco, cobertas de poemas de escritores célebres, em letras coloridas, os vitrais se tornaram um símbolo da cidade e o trabalho mais conhecido de Alex Flemming. Agora, dezoito anos depois, o artista paulistano radicado em Berlim volta a criar uma grande obra em espaço público em São Paulo, dessa vez na Biblioteca Mário de Andrade, região central. Novamente, grandes rostos de pessoas comuns surgem em vitrais (de 2,8m por 1,7m), visíveis de dentro e de fora da biblioteca, mas algumas variações significativas diferenciam o trabalho atual daquele de 1998. “Não acredito em artistas que encontram uma fórmula e ficaram prazerosamente nela durante anos”, diz Flemming, que tem também uma grande exposição “retroperspectiva” em cartaz no MAC-SP. “Então eu não queria repetir a obra do metrô, tinha que ser algo novo. E aí eu fiz as fotografias de um jeito diferente”, explica.
Ao invés de fotos em preto e branco, o artista apresenta agora imagens coloridas, cada uma em uma só cor, impressas não mais na superfície do vidro, mas em seu interior. “É algo que nem era possível naquela época, por causa da tecnologia. As fotos estão dentro do vidro em três camadas, e têm uma espécie de profundidade que dá a ilusão de movimento. E como elas têm cor, modificam muito quando vistas do lado de dentro e de fora, assim como de dia e de noite. São quase auras…”, afirma ele. Além disso, dessa vez as letras não estão presentes, o que parece potencializar ainda mais as feições dos rostos dessas pessoas das mais variadas cores e etnias. “Acho a miscigenação a coisa mais importante do Brasil. O mulato, o cafuzo, o nissei casado com um branco ou com uma negra. Devemos prezar isso como uma das grandes coisas do País”, diz Flemming.
Os 16 vitrais trazem oito homens e oito mulheres fotografados pelo artista em São Paulo. “Tem um homem de gravata, um mano, uma mulher toda tatuada… São as pessoas do centro. Tem todo tipo de gente e todos são igualmente importantes”, comenta Flemming. Para ele, um dos objetivos é criar uma real identificação dos transeuntes da região com a obra, assim como já acontece na estação de metrô da Linha 2 Verde. “Apresentar trabalhos nestes espaços é muito mais interessante do que em galerias ou museus, por exemplo, porque é a arte para todos, para a população que anda pelas ruas”, diz. “E isso é você trazer a estética contemporânea para pessoas que não estão procurando por ela. Não é uma pessoa que vai ao museu, mas uma pessoa que está andando na calçada e se depara com aquelas obras. E eu espero que se identifiquem, porque a minha arte não é elitista.”
Mais uma vez, assim como na estação Sumaré, entre os 16 rostos está o do próprio Flemming. O artista que aparece com face lisa e cerca de 45 anos de idade no metrô, surge agora com barba e seus 62 anos na Biblioteca Mário de Andrade. Como explicou em entrevista recente à ARTE!Brasileiros, ao falar de sua mostra no MAC: “Minha obra sempre teve alguns temas que eu pego, disseco ele numa época, continuo minha trajetória e em outra época eu pego de novo pra dissecar mais uma vez. E isso é um aprofundamento”. Com o novo trabalho, que tem inauguração oficial no inicio de dezembro – “fico muito contente que deu tempo de a obra ser inaugurada ainda na gestão Haddad” –, Flemming aprofunda também seus laços com a cidade de São Paulo, na qual não reside há 25 anos, mas continua sentindo-se em casa. “Na minha vida eu viajei muito, desde criança. Agora, obviamente eu sou brasileiro, obviamente eu sou um paulistano, e obviamente me reporto, no final, ao cemitério da Consolação, onde quero ficar um dia.”
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