Um fato curioso emocionou a internet na última semana: Marc Carter, um pai britânico, partiu em busca de uma caneca para Ben, seu filho autista de 13 anos no Twitter. Motivo: Ben só utiliza a mesma caneca para beber água desde os 2 anos e ela deixou de ser fabricada. A iniciativa tem até um usuário na rede: o PMPProject, que espalhou a hashtag #CUPFORBEN.
Ben chegou a ser hospitalizado por desidratação algumas vezes na ausência da caneca, segundo o pai. Felizmente, pessoas do mundo inteiro estão enviando cópias para Ben – como este australiano. Mas por que será que o menino inglês só utiliza esta caneca? O pai poderia substitui-la por outra com o tempo? Procuramos Estevão Vadasz, psiquiatria da infância e da adolescência, e criador do PROTEA (Programa Transtornos do Espectro Autista) do Hospital das Clínicas da USP, para responder essas questões.
Segundo Vadasz, a caneca provavelmente transmite a Ben uma sensação de estabilidade, demanda que é comum entre os autistas. “Eles têm um mundo interior absolutamente caótico – com desorganização de pensamentos, de emoções, de tudo o que a mente produz. Eles precisam dessa “sameness”, a mesmice, como descreveu o ‘pai do autismo’, Leo Kanner, em 1943”, comenta.
Comportamentos repetitivos e apego a objetos, como Ben com sua caneca, organizam esse mundo caótico – explica o psiquiatra. “A mesmice traz tranquilidade e uma sensação de organização e de previsibilidade. A manutenção dos comportamentos repetitivos é conforto e é por isso que eles são cheios, vamos dizer, de manias.”
As repetições, segundo o especialista, incluem todos os tipos de rituais. O mesmo trajeto, a mesma cama, a mesma casa, a mesma roupa e a mesma comida. Também é possível que eles repitam uma mesma atividade o dia inteiro. É por isso que os autistas, em sua maioria, pioram durante as férias e ficam mais isolados, irritáveis e agressivos.
“Eu tive um paciente que só comia miojo, danoninho e guaraná – o que, do ponto de vista nutricional, é uma tragédia”, comenta o psiquiatra. Vadasz explica que levou mais de um ano para conseguir fazer uma transição e incluir novos alimentos aos poucos. “Isso exige um trabalho árduo.”
De acordo com o psiquiatra, uma maneira de se conseguir as substituições é manter o máximo de previsibilidade na rotina e, aos poucos, ir introduzindo novos elementos. Ele diz que a ABA (Applied Behavior Analysis, na sigla em inglês), que é um tipo de abordagem para autistas derivada da linha das terapias comportamentais na psicologia, ajuda no processo e tem sido o padrão-ouro no tratamento do autismo.
Nessa terapia, o especialista age como um educador e atua na perspectiva de promover uma “reaprendizagem”. Ele aplica técnicas e negocia com o paciente a substituição de comportamentos nocivos por outros, mais funcionais.
O autismo: dificuldades de adaptação social
O autismo tem diversas manifestações e, por isso, muitas vezes é tido como um espectro de transtornos – que vai desde os casos mais leves aos mais graves. Portadores da Síndrome de Asperger, por exemplo, não possuem deficiências de aprendizado e de linguagem, mas têm dificuldades de sociabilidade.
Já pacientes com quadros convulsivos e retardo mental possuem essas deficiências e quadros de saúde mais graves. De modo geral, o autismo é caracterizado por dificuldades de interação social, interesses restritos e comportamentos que se repetem.
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