Manual do perfeito midiota – 57

Foto: Ingimage
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O juiz de Direito Luís Carlos Valois, que assumiu a tarefa de negociar com os presos amotinados no sistema penitenciário de Manaus, foi acusado diretamente por dois repórteres do Estado de S. Paulo de ter “ligações” com a  facção criminosa Família do Norte, que promoveu as execuções em massa no complexo penitenciário Anísio Jobim, entre o dia 1o. e o dia 2 deste ano de 2017.

Os jornalistas Fábio Serapião e Fausto Macedo assinam o texto. Serapião ouviu o juiz depois quando ele deixava as negociações, esgotado após doze horas de extrema tensão e sem dormir. Quando foi entrevistado, por telefone, o magistrado não teve a chance de se defender da acusação. A essa altura, sabe-se agora, o massacre já havia sido executado mas a polícia ainda não tinha constatado a imensidão da barbárie.

Esse é um exemplo do jornalismo “justiceiro” e messiânico que domina as redações dos principais meios de comunicação do País.

Muitos estudiosos da mídia têm afirmado que essa ânsia de condenar sem evidências suficientes é uma das deficiências do jornalismo contemporâneo, açodado pela pressa dos meios digitais.

Mas o buraco é mais em cima: não estamos lidando com uma deficiência, mas com uma orientação do mister jornalístico.

Esse jornalismo é resultado de quase duas décadas de destruição da diversidade política nas redações: desde o início deste século, sobrevivem ou são contratados nas principais empresas de mídia apenas os profissionais que aceitam a tarefa de desmoralizar todo e qualquer protagonista da cena pública que se aproxime do perfil humanista.

Em contrapartida, qualquer imbecil que se empenhe em divulgar preconceitos, intolerância e outras bestialidades do pensamento reacionário, ganha status de filósofo.

Está em curso, como já se disse aqui em mais de uma ocasião, um projeto fascista de poder, que manipula o Congresso Nacional, abastarda o Judiciário e tem como refém um presidente da República ameaçado de perder o cargo a qualquer momento.

Na visão tacanha de seus idealizadores, o desmanche das instituições da República, que leva de roldão algumas das maiores empresas do País, concentra o poder financeiro em um ou dois bancos internacionais e criminaliza a política, são apenas danos colaterais: eles acreditam que estão construindo “uma catedral”, como declarou recentemente um jurista de alta credibilidade junto à imprensa. Uma “catedral” purista.

Esse projeto se desenrola principalmente pela negação da política e pela crença em mitos de há muito desmoralizados pela História.

Por exemplo, o de que a ordem social imposta pelo Estado produz o progresso – ainda que se esteja falando de um conceito obscuro de progresso.

Ou a crença segundo a qual uma sociedade organizada e sob controle rigoroso enfrenta melhor as crises do mundo contemporâneo.

Trata-se, evidentemente, de uma ideologia de fundo religioso, e não apenas pelo perfil de seus protagonistas mais incensados, mas principalmente pelo conjunto de valores que eles manifestam.

Por outro lado, embora seja apreciado pela mídia embalada nos valores do neoliberalismo, esse conjunto de crenças denuncia um viés anticapitalista, cujo objetivo é a criação de uma casta de funcionários cuja qualificação essencial seja não o mérito pessoal, mas a disposição para obedecer e cumprir tarefas como as que atingiram a honra do juiz Valois.

A mesma disposição que tem desequilibrado a balança da Justiça, com a frequente associação da acusação com o julgador, que deixa a terceira parte, o advogado defensor, sem chance de cumprir seu papel.

Não por acaso, velhos militantes do comunismo stalinista se alinham entre os grandes entusiastas desse projeto fascista.

Ah, sim. Enquanto isso, um bom punhado de indivíduos que simpatizam com ideias progressistas perde seu tempo discutindo nas redes sociais a natureza das relações conjugais do presidente da República e sua jovem senhora.


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