Um homem de método

O Nogueira é um homem de método. Ele é assim. Se as coisas funcionam de um jeito, assim devem ser feitas as coisas. É método para fazer compras. Método para vender carro, método para escolher prato em restaurante. E assim vai. Para ele, a vida assim fica mais fácil. Há muitos anos, ele descobriu um método sueco para lidar com mulher. No princípio, desconfiou daquilo. Mas, do jeito que é, resolveu mandar bala. E mandou.

Ele inicia com uma fase de exploração que, segundo diz, leva à descoberta, que chama de platô inicial. Da descoberta, ele naturalmente vai percorrer os meandros do prazer, levado pelas circunstâncias do acaso. Nesse ponto, o Nogueira modificou um pouco o método. Interfere com as circunstâncias do acaso. Usa uns incensos. Velas. Flores.

Desse mundo dos prazeres resulta, inevitavelmente, a repetição que, segundo o método, não deve ser vista como algo negativo. Pelo contrário. É na repetição que se encontra o aperfeiçoamento e daí a maestria. Que é muito positiva. E mais. Dessa maestria resulta a possibilidade de descobrir novas habilidades. Um mundo totalmente novo.

Do desfrute das novas possibilidades, assegura o Nogueira, resulta a confiança. Tônico inigualável para o espírito. E dessa confiança emerge naturalmente o reforço da autoestima que, diz o Nogueira, é essencial. Sobretudo nas questões de mulher. É essa autoestima robusta que leva então ao cume, ao ápice, ao sentimento de segurança. Essencial à condição humana.

É com essa segurança que o Nogueira vai às novas explorações, então, com outras mulheres. Também aí, uma adaptação do Nogueira que deu muito certo. Foi assim que meu amigo pulou de galho em galho por bem uns 15 anos.

Em 2007, ele conheceu uma morena beirando os 40. Bonita e simpática. Inteligente. No princípio, o Nogueira até assustou. Pensou: Aí tem coisa! Mas, distraído, deixou-se levar.

Foi muito bem na exploração. Sem pressa chegou à descoberta e, com grande serenidade, chegou aos meandros do prazer. As coisas, como previsto, começaram a se repetir, mas ele, aderente ao método, se dedicou à maestria. Daí, como esperado, surgiu a necessidade de novas habilidades e os decorrentes ganhos. Veio naturalmente a confiança e, portanto, o reforço da autoestima. Não surpreendentemente, adveio inigualável sensação de segurança. Sentimento maior do ser humano.

Foi aí, nesse estágio superior que, inesperadamente, ele descobriu o amor. Foi aí também – curioso mundo – que a tal morena quebrou as pernas do Nogueira. Fez dele gato e sapato. Jogou o Nogueira na sarjeta e pisoteou. Acabou com a autoestima do homem. Mandou o macanudo para o ralo. Ele ficou um trapo. E, o pior, ela não largou dele. Tripudiou. Dava dó ver as olheiras do Nogueira. Nem comer comia. O corpo, então, era um fiapo.

Por três anos, ele ficou nesse fundo do poço. Nem podia ouvir falar em método. Mulher, então, nem pensar. Assustado, buscava respostas no além. Às vezes, achava que ela havia sido enviada pelas outras, que ele deixara pelo caminho. Outras vezes, achava que ela tinha parte com o Demo propriamente dito. Um desgosto.

No dia 15 de junho de 2010 – coisa mais triste -, ele sentou-se só com o vizinho para assistir à abertura da Copa do Mundo. Na primeira imagem de abertura, ele já se emocionou com o estádio cheio, as bandeiras coloridas e a comovente alegria dos afro-destituídos. Sentiu um irrefreável impulso de congraçamento. Então – Virgem Santíssima – entra a Shakira. Esvoaçante. Cantando Waka Waka e dançando descalça. Ah, o bamboleante corpo louro-mouro-latino! Bateu uma inesperada, mas imperiosa, vontade de confraternizar também com a Shakira. Aquilo foi coisa forte que pegou o Nogueira pelos grãos mesmo. Ele sarou na hora. Instantaneamente. Um milagre.

Na mesma noite, saiu com a Dolores, uma costureira colombiana que fazia a barra de suas calças. Sarado de tudo, partiu para fase um. Exploração.

*Engenheiro civil, professor titular da Escola Politécnica da USP. Dedica-se também à literatura.


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