Quando Paulo e Chico Caruso?eram pequenos, o pai fez questão de explicar a eles a razão de serem gêmeos. “Vocês sabem por que são gêmeos?”, perguntou um dia. E eles, que já sabiam a resposta, apressaram-se para mostrar ao genitor que estavam por dentro: “Sim! Sim! Porque o óvulo da mamãe, já fecundado, se dividiu em dois”. Antes que conseguissem concluir foram interrompidos. “Não! Não! Prestem atenção: vocês são gêmeos porque minha porra é foda!” A lição nunca foi esquecida e a explicação nada técnica é ainda dada pelos rapazes, hoje homens célebres, sessentões e, naturalmente, idênticos.

O tal líquido supostamente diz respeito à força do esperma que, ao fecundar o óvulo, é capaz de dividi-lo em dois ou mais, dando origem a organismos iguais, que compartilham do mesmo DNA – os gêmeos univitelinos. Ao contrário da teoria debochada de Caruso pai, a ciência não sabe exatamente por que um óvulo se divide, o que, pensando bem, deixa a hipótese de a substância ser necessariamente vigorosa ainda na luta por um lugar no universo das verdades ainda não reveladas.

“O gêmeo descobre um dia que nem todo mundo é gêmeo”, explicou Paulo Caruso, logo no início de um encontro sobre o assunto, realizado no Espaço Unibanco, em São Paulo, muito apropriadamente no dia 11/11/2011, uma sexta-feira, ocasião ainda em que foi oficializado o Sindicato dos Gêmeos.
Imediatamente, entendi que gêmeos e gays, embora categorias não excludentes, estão em pontas opostas do spectrum das primeiras revelações fundamentais. Nós, gays quarentões, passamos a infância achando que não havia no mundo outro como ele.
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A agremiação
Há alguns anos, os Caruso toparam com os gêmeos e médicos cariocas Ricardo e Alexandre Ghelman. Do encontro, saiu a ideia de fundar uma organização que misturasse humor e ciência e, sobre essas duas pedras fundamentais, ajudasse a mapear os gêmeos do País. Foi assim que nasceu o Sindicato dos Gêmeos, oficialmente inaugurado com festa que teve os ingredientes básicos: começou com a exibição de um documentário a respeito do tema, continuou com palestras científicas de Ricardo e Alexandre e terminou com um espetáculo musical dos Caruso e das irmãs gêmeas e cantoras sertanejas Célia e Celma, concebido especialmente para a ocasião: Cromossomos. Havia no recinto em que eu também estava um total de 15 pares de gêmeos.

O sindicato contempla, claro, não apenas os univitelinos, mas também os bivitelinos, resultado da fecundação de mais de um óvulo, o que faz com que os irmãos não sejam idênticos, mas compartilhem de um código genético muito semelhante. E deixa as portas abertas aos simpatizantes – categoria na qual rapidamente me enquadrei. “Nem todo mundo é tão igual e nem todo mundo é tão diferente”, disse Chico. “É a mensagem que queremos passar.” Com essa, todos podemos nos identificar.

Para Alexandre e Ricardo, a criação do sindicato é uma forma de misturar arte, cultura e ciência que pode render bom entendimento do comportamento humano. “Espero que esse projeto ajude as pessoas de forma positiva”, afirmou Alexandre.

Verdade que o universo dos gêmeos é curioso para quem está fora dele. A começar pela ligação espiritual que parece haver entre os pares. Ricardo e Alexandre, embora cientistas, fizeram questão de falar durante a festa de lançamento do sindicato que acreditam que existe mesmo uma ligação que extrapola aquilo que conseguimos entender. E os exemplos de gêmeos que sentem na pele o corte no braço do irmão ou são capazes de perceber a angústia do outro sem precisar estar perto, são inúmeros.

Da mesma forma, é comum que, antes de conseguirem falar, desenvolvam uma linguagem própria, entendida apenas por eles. Não há explicação científica para esses casos, há apenas a certeza de que existem – como confirmaram os gêmeos presentes ao evento contando experiências próprias ao microfone.

Por tantas peculiaridades, nos Estados Unidos, existe desde 1960 uma organização de mães de gêmeos. A National Organization of Mothers of Twins Clubs (NOMOTC), com 25 mil membros, foi criada para auxiliar pais de gêmeos na educação das crianças e também para ajudá-los a lidar com esse universo particular que envolve a classe (ok, eles não são uma classe, mas como já têm sindicato, vou me permitir chamá-los assim).

Como tia de gêmeas, entendo um pouco o doce drama pelo qual passam meu irmão e minha cunhada. E estando eu outro dia incumbida de ficar sozinha com as crianças por um período de algumas horas, que pareceram meses, não poderia ser mais simpatizante ao auxílio que organizações como essa se propõe a dar. Um ditado americano famoso diz: It takes a village (to raise a child). Se é preciso de uma vila para criar uma criança, é necessário uma cidade para criar gêmeos: duas mamadas, duas choradas, duas… Ou mais de duas, dependendo da sorte do casal. É apenas natural que o Sindicato dos Gêmeos cresça para também virar fonte de informação para novos pais e novos pares.

Para mostrar que nem tudo é farra, uma das primeiras iniciativas do sindicato vai ser lançar o site Gemialidade, no dia 18 de março de 2012, quando é comemorado em São Paulo o Dia dos Múltiplos, criado pelo vereador Adilson Amadeu (PTB). A intenção é deixar que gêmeos do Brasil inteiro acessem e preencham uma ficha e, com isso, facilitar um possível levantamento estatístico dos múltiplos brasileiros: onde estão, quem são, como vivem (francamente, até nós, os gays, essa classe ainda tão marginalizada, conseguimos em menos tempo ter um pouco mais de organização do que os gêmeos. Mas, para provar que torço pela iniciativa, deixo aqui uma sugestão: a criação de bares, boates e cruzeiros especialmente para vocês pode ajudar a promover união e respaldo).

E, enquanto os Caruso cuidam da divulgação bem-humorada do sindicato, os Ghelman, 48, cofundadores, querem usar a organização para começar um cadastro dos gêmeos brasileiros: “Estudar gêmeos é interessante, tanto para pesquisas genéticas quanto para comportamento”, diz Alexandre Ghelman, especialista em neurologia do comportamento. “Dá para avaliar se um fator é geneticamente determinado ou induzido pelo estilo de vida a partir do estudo de univitelinos.” Mas é de Ricardo, pediatra e mestre em morfologia, a melhor definição do que pretendem: “Se considerarmos nosso planeta-mãe como um útero para nosso desenvolvimento, com os oceanos, rios e mares como líquido amniótico, no final das contas somos todos gêmeos”. No mais, vale avisar que as declarações de Paulo aqui registradas podem ter sido dadas por Chico, e as de Ricardo, por Alexandre. Ou vice-versa.


Comentários

Uma resposta para “11/11/2011”

  1. gostaria de inscrever amanda e bruno meus sobrinhos pois achei mt interessante e divertido

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