Quer um desse? Só daqui a pouco

Assim será o Uno Ecology, quando for fabricado em escala industrial

Cortar o cordão umbilical. Se a indústria automobilística está tradicionalmente associada a poluição ambiental e emissão de gás carbônico na atmosfera, as montadoras agora procuram se despir da imagem de vilãs e começam a abraçar a bandeira da sustentabilidade. O primeiro passo é romper com a obrigatoriedade da gasolina e multiplicar alternativas tecnológicas: carro elétrico, solar, movido a etanol, a biodiesel…

Em meio a esse movimento, a FIAT decidiu investir na proposta de fabri­­car um carro-conceito com componen­­­tes ecologicamente corretos. “Tudo co­meçou quando um fornecedor de para-choques nos apresentou um material à base de bagaço de cana, resultado da produção de açúcar e etanol”, diz Peter Fassbender, gerente de Design da montadora. “Não só o aproveitamos, como buscamos incorporar outras tecnologias renováveis e materiais recicláveis.”

“A ideia”, explica Paulo Matos, supervisor de Estratégia de Inovação da empresa, “era fazer uma leitura de como deve ser um automóvel ecológico.” Resultado: apresentado no Michelin Challenge Bibendum de 2010 – encontro anual promovido pelo fabricante de pneus francês Michelin e maior evento internacional para dar visibilidade à mobilidade sustentável –, o protótipo Uno Ecology mostrou que, se o carro ecológico ainda não pode ser visto nas ruas, a tecnologia para fabricá-lo está quase consolidada.

E mais, embora se trate de “um projeto interno, que visa tangibilizar soluções de sustentabilidade, transferindo a tecnologia do protótipo para uma linha de produção somente na medida em que a cadeia de fornecimento for se tornando mais robusta”, como explica Toshizaemom Noce, supervisor de Inovação da FIAT, algumas características reunidas no Uno Ecology começam a aparecer desde já em escala industrial, em modelos novos como o Bravo 2011-2012, que entre outras novidades incorporou o sistema TPMS (Tyre Pressure Monitoring System). Ao emitir um sinal luminoso, esse dispositivo comunica ao motorista que o automóvel está rodando com algum pneu mal calibrado – o que pode acarretar aumento de até 5% no consumo de combustível.

A maior inovação do Uno Ecology está por conta da farta utilização de fibras naturais no acabamento interno. Com bagaço de cana-de-açúcar, por exemplo, fabricaram-se as peças plásticas do automóvel, uma troca que resultou em diminuição do peso total da ordem de 8%, em relação aos modelos convencionais. Ao todo, 5 kg de fibra de vidro foram substituídos pela de cana.

Com a fibra do coco, confeccionaram-se os bancos do carro, dispensando o uso de cerca de 7 kg de espuma de poliuretano – uma substância em grande parte derivada também do petróleo. Com revestimento de látex à guisa de couro ecológico, desenvolveu-se o volante do protótipo. Com PET reciclado, foram feitos os tapetes e o tecido que reveste os bancos do Uno Ecology – um material permeável ao ar, antifungo, reciclável, que permite a recuperação energética plena no final de seu ciclo de vida. No total, 4,5 kg de tecido deram lugar a fibras obtidas a partir da reciclagem de cerca de 30 garrafas PET.

Segundo Toshizaemom Noce, ao todo calculam-se 16,5 kg de material renovável utilizados no protótipo. Mas, ao lado da substituição de matéria-prima originária do petróleo por fontes renováveis, a grande vantagem, segundo ele, está na nova maneira de enxergar o velho estigma da indústria automobilística: “Não olhamos mais a emissão de CO2 como proveniente apenas do escapamento do veículo. O grande diferencial está em levá-la em conta desde a produção dos componentes do carro até seu descarte final”, daí a necessidade de incorporar matéria-prima reciclável, de origem renovável, biodegradável e obtida por meio de um claro compromisso social, ou seja, que absorva o trabalho de coo­pe­rativas.

Motor 1.0
A proposta de reduzir o impacto ambiental do carro-conceito também resultou em inovações mecânicas. No Uno Ecology, o motor 1.0 foi especialmente concebido pela FPT – Powertrain Technologies, para rodar 100% à base de etanol e já sair de fábrica calibrado para consumir apenas esse tipo de combustível, o que lhe confere máximo desempenho energético. Segundo Paulo Matos: “Além de ser fonte de energia renovável, é uma alternativa técnica e economicamente viável que tem a vantagem de proporcionar menos emissões de CO2, em comparação a um motor convencional que utiliza gasolina – isso considerando todo o ciclo, desde o plantio da cana-de-açúcar, passando pelo seu crescimento, quando absorve CO2 durante a fotossíntese, até a utilização do veículo”.

Ainda em relação à mobilidade sustentável, o protótipo contou com dispositivos que ajudam o motor a poupar combustível. É o caso do teto solar fotovoltaico, constituído de células no painel posterior que ajudam a recarregar a bateria, reduzindo o esforço do motor para gerar energia e, consequentemente, economizando gasolina. Projetado para gerar uma potência elétrica de 35 W, levando em consideração uma exposição de oito horas diárias ao sol durante 30 dias, esse teto inspirou o Sky Dome do FIAT Punto, já incorporado ao modelo.

Outra tecnologia visando a economia de combustível, igualmente presente no carro-conceito, é a película anti-infravermelho. Ao reter o calor, ela consegue diminuir a necessidade de usar o ar condicionado na potência máxima, o que representa uma redução do consumo de combustível de, aproximadamente, 1%, em comparação à utilização do ar condicionado na carga total, para manter a mesma temperatura.

O start-stop é uma tecnologia que foi igualmente introduzida no Uno Ecology, para gerar consumo menor de combustível. Usado em alguns modelos europeus, mas ainda inédito no Brasil, o sistema desliga o motor do veículo quando o motorista para em um semáforo e o religa automaticamente quando o pedal da embreagem for acionado, resultando em economia de gasolina de cerca de 5% na malha urbana.

Até o momento, essas são as principais soluções de mobilidade com materiais alternativos, reutilizáveis e não poluentes de que dispõem a montadora.

Promissoras, inovadoras, não deixam de provocar questionamentos: afinal, se a tecnologia que permite menor poluição ambiental por parte da indústria automobilística já está consolidada, por que não usá-la em larga escala?

O supervisor de Estratégia de Inovação da FIAT responde: “A tecnologia está aí, mas a indústria ainda não tem fôlego para dar conta de uma escala industrial. Dependemos da maturação da cadeia de fornecimento”, afirma Paulo Matos, destacando que só em relação aos substitutos das peças de plástico, a FIAT mantém parceria com seis fornecedores. Em outras palavras, é preciso dar tempo para que as cooperativas que fazem coleta de matéria-prima e recicláveis se estruturem, atendam às exigências da legalidade trabalhista e possam prover as montadoras com grandes quantidades.

Enquanto a sociedade não se organiza para isso, do lado da montadora, a área de Inovação “dá seguimento ao conceito Uno Ecology, monitorando as novidades no mercado”, informa Matos.

Mais que tudo, ela sinaliza uma nova mentalidade corporativa, avalia Peter Fassbender: “Para produzir ideias, fomentamos processos internos que estimulem a cooperação e o empreendedorismo dos nossos funcionários, por meio de uma plataforma na intranet em que eles podem apresentar suas sugestões. Outra fonte importante de ideias são as feiras da Pequena Empresa, que promovemos regularmente na fábrica para que nossos fornecedores se sintam encorajados a trazer soluções inovadoras e modernas em suas respectivas áreas de atuação”.

Mas a grande iniciativa geradora de ideias é, de acordo com o designer: “Uma abordagem centrada no fator humano e no contato com o cliente, que permite interpretar que tipo de experiência de dirigir um automóvel o consumidor espera ter”.

Localizado no Centro de Desenvolvimento Giovanni Agnelli, em Betim, Minas Gerais, o núcleo de Inovação da FIAT e seus 800 profissionais não só se dedicam a desenvolver novos produtos e tecnologias que atendam necessidades, mas tratam de se manter antenados para captar tendências e se antecipar a elas. “Criando conceitos, e não só tecnologia, os designers da FIAT vão além e inovam: passam para o papel formas de ver o mundo apontadas pelo mercado”, explica Fassbender.

É justamente esse olhar para os anseios do mercado que projeta os automóveis da FIAT na direção de um horizonte sem poluição ambiental, no mais curto prazo e o quanto antes. Um trabalho de formiga que dá mais oxigênio à indústria automobilística. E, certamente, lança menos gás carbônico sobre a humanidade. I


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