Desde os anos 1980, Jaime Prades experimenta a adrenalina do grafite, toda a sua pesquisa de ateliê gira em torno da poética das ruas. “Tenho a percepção clara de que o grafite, diferente de um mural, ao se inserir no palco urbano apropria-se e dialoga com os sinais e marcas da memória coletiva. As ruas são um livro que precisamos aprender a ler.” Essa “pintura” involuntária desvenda camadas e camadas de humanidade: sujeiras, excrementos, materiais de construção, lixo, madeiras, pichos, riscos, gente…
Nessa série os “Brutos”, na exposição Parede s/ Parede, ele recolhe “migalhas” urbanas. “Minha opção por suportes bastardos não é nova. No fim dos anos 1980, realizei obras sobre madeiras que encontrava nas ruas e, após interferir, protegia com parafina”.
[nggallery id=16012]
Para Jaime Prades, o diferencial entre sua arte produzida para um espaço comercial de um produzido para o espaço público pode ser um paradoxo. “Por um lado sim, porque são estratégias diferentes e por outro não, porque o que tenho a dizer e a motivação em relação ao outro é a mesma.” Na dimensão de objeto, as obras da galeria não são só comerciais e a partir das ruas as possibilidades de desdobramentos comerciais são imensas.
Tecer uma ponte entre o material e o imaterial é o que lhe interessa. “Em essência, independentemente de onde estiverem as obras, o que faço é um convite ao outro: penetrar nessa ponte no caminho inverso ao que percorri. Só assim a obra se completa.” Quando o lixo vira “obra”, ele pode ir mais longe e ela só se completa quando for vendida. “A venda em si é que fechará o ciclo que começou quando o escombro foi recolhido numa caçamba. Nesse caso, o comprador passa a ser cocriador.”
Os Pacificadores são protagonistas centrais da mostra, mas nesse percurso de 30 anos, Jaime Prades acredita que a existência deles hoje seja mais emergencial do que no passado? “Comecei a fazer os personagens nos grafites do final dos anos 1980. Num exercício permanente de síntese, cheguei aos Pacificadores.”
Pichação e agressão marcam a 7a Bienal de Berlim
Foi justamente um grupo de grafiteiros – os Pichadores de São Paulo – que geraram um ato de agressão ao serem convidados para participar da última Bienal de Berlim, com curadoria de Artur Zmijewski. Os Pichadores foram convidados para darem um workshop de grafite no prédio histórico da Igreja Santa Elizabeth, onde há semanas diversos grafiteiros e artistas trabalhavam com a comunidade em um mural coletivo. Após uma discussão, seguida por arremesso de tinta contra o curador, os Pichadores escalaram os andaimes do espaço e picharam o prédio tombado pelo patrimônio histórico e comentaram ainda que essa era a atuação deles. “Eles nos convidaram porque queriam conhecer nossa ‘pichação’. Pronto, conheceram”, disse Cripta, um dos participantes, desconsiderando e ignorando o contexto para qual foram convidados.
Esse ato de vandalismo desfaz um amplo diálogo efetivo criado entre pichadores, apoiadores e seu público nos últimos anos – inclusive, foi exatamente na Igreja Santa Elizabeth que o grafiteiro brasileiro Speto inseriu seu trabalho dignamente em 2006!
Jaime Prades comenta esse incidente da seguinte forma: “Tentar controlar a pichação é não entendê-la! Se os pichadores aceitarem se enquadrar, deixarão de ser pichadores, e serão pichados. O desejo dos curadores de refletir sobre o fenômeno é legítimo. Convidar os pichadores para fazer uma oficina é ingênuo”.
Deixe um comentário