“O sofrimento me fortaleceu”

“Perdi meu pai em 2004, vítima de complicações do mal de Parkinson. Logo depois, minha mãe, na entrada dos 60 anos, uma mulher ativa, adoeceu de mal de Alzheimer. Ela faleceu no ano passado (2007). Meu pai já era idoso. De certa forma, a família estava preparada, apesar do enorme sofrimento pelo qual ele passou durante dois anos vegetando em uma cama. Mas, quando minha mãe recebeu o diagnóstico, fiquei desesperada. Chorava quase diariamente prevendo a descomunal angústia pela qual ela passaria. Foi uma tragédia indescritível assistir à morte lenta e torturante de uma mulher tão forte e alegre.
Para mim, o mundo tinha se tornado cinza, a perspectiva da doença e da morte era meu ponto de vista existencial. A única saída que encontrei foi mudar. Mudar tudo, sair de São Paulo, largar profissão, minha casa recém-reformada, meus melhores amigos, um mestrado por ser concluído, ir para Brasília cuidar de minha mãe. Em meio a tanta dor, encontrei nessa mudança uma espécie de sentido para o que estava passando.
Saber que estava fazendo a coisa certa me deu forças e atraiu algo mágico para minha vida. Na minha festa de despedida, reencontrei meu antigo namorado de faculdade, a única pessoa por quem eu realmente havia me apaixonado e que eu não via havia mais de dez anos. Eu havia mandado um e-mail para ele, convidando-o para a festa e dizendo que um dia contaria aos meus netos que ele tinha sido o grande amor da minha vida. Sua resposta foi: “Que tal contarmos isso aos nossos netos?”. Poucos dias depois, estávamos viajando juntos para Brasília. Casamos e em menos de um mês veio a grande surpresa: eu estava grávida de trigêmeas (gravidez natural, sem precedentes na família). Luísa, Carolina e Isabela chegaram em agosto do ano passado, exatamente uma semana antes de minha mãe morrer.
Parece até desnecessário dizer o que é felicidade diante de uma história tão surpreendente. Sou muito feliz, sim. Aliás, sempre fui. Amar e ser amada e ainda ter três filhas de uma vez confirma minha idéia de que felicidade não tem a ver com alegria fugaz. A felicidade está na força e no mistério da vida. O sofrimento me fortaleceu. Quando assumimos que fazemos parte do clã das cicatrizes, a felicidade é perene. Ser feliz é fazer a coisa certa, buscar o essencial, não perder tempo com o que não vale a pena. A vida não pára.”

Alessandra Simões Paiva,
35 anos, Brasília (DF)


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