O Carnaval do Rumo

Balanço da Vanguarda – Os integrantes do grupo Rumo, hoje.

Enquanto Zélia Duncan teatraliza a obra de Luiz Tatit, o grupo Rumo, liderado por este último, tem sua discografia e DVD relançados pela gravadora Dabliú. O Rumo, no início dos anos 1980, formava ao lado de Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e o grupo Premeditando o Breque, a vanguarda de um não movimento, que seria chamado “Vanguarda Paulista” ou “Geração Lira Paulistana”, em uma referência ao teatro de Pinheiros.

Era um “não movimento” porque, apesar de todos saírem da USP (menos Itamar) e se apresentarem no Lira (menos Arrigo), os respectivos trabalhos e seus autores pouco tinham em comum, exceto o desejo de independência perante a ditadura imposta pelas gravadoras – hoje extintas, ditadura e gravadoras. Arrigo popularizava atitudes da vanguarda acadêmica, misturando quadrinhos com dodecafonismo, enquanto o Premeditando fazia o caminho inverso, alçando o samba de breque à categoria de vanguarda. Os dois restantes, Itamar e Rumo, trabalhavam de maneira semelhante – tradição e vanguarda –, criando uma linguagem própria. Mas, como diz o pesquisador Zuza Homem de Mello: “Os pintores de Paris também não tinham nada em comum”. Então, que se use vanguarda paulista mesmo.

O Rumo, a exemplo de seus pares, era um grupo numeroso. Quando lançou os primeiros discos, dois de uma só vez pelo selo Lira Paulistana, Rumo e Rumo aos Antigos (1981), era formado por Luiz, o irmão Paulo Tatit, Zé Carlos Bueno, Gal Oppido, Akira Ueno, Geraldo Leite, Pedro Mourão, Hélio Ziskind, Ná Ozzetti e Ciça Tuccori, que deixou a formação em 1985, pouco antes de morrer, sendo substituída por Ricardo Breim e Fabio Tagliaferri. O cerne do grupo existia desde 1974 em torno dos estudos de Luiz Tatit, que se tornaria titular do Departamento de Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. Tatit se concentrava na entoação, na música popular, e acabou fornecendo ao grupo um jeito característico de pronunciar as palavras – “Ah, parece música do Rumo”, tornou-se comum dizer. Mas o sistema dentro do Rumo era colaborativo. As filigranas criadas pelas guitarras, violões e baixo de Paulo, Akira e Luiz, somadas às intervenções de sopro de Hélio criaram escola. Ladeira da Memória, uma das músicas mais conhecidas do grupo, é de Zé Carlos, arquiteto e compositor bissexto. Foi Pedro quem esteve por trás da vocação infantil do grupo, a partir de A Pulga e a Daninha e, mais tarde, com a Canção do Carro (originalmente de Woody Guthrie) – Hélio, com Cocoricó e Castelo Ra Tim Bum, entre outros, e Paulo, com o selo Palavra Cantada, seguiriam nessa linha.

Capa do álbum de estreia Rumo, lançado em 1981, que ganhou nova edição. Ao lado capa do DVD lançado pelo grupo em 2004

Coube a Geraldo Leite, aquele do Carnaval do Geraldo (Luiz Tatit) do primeiro disco, a vocação para pesquisa que o grupo sempre manteve (daí o título Rumo aos Antigos). Um desses achados é Chequerê, de Sinhô, do disco citado. Até hoje a interpretação de Ná é de provocar internação no InCor. Geraldo é responsável pelo recente CD Sopa de Conchas, que traz músicas criadas entre 1934 e 1946 (de Noel Rosa, Ary Barroso, Lamartine Babo, Wilson Batista, entre outros), interpretadas por “os amigos do Rumo” (na verdade eles mesmos, acompanhados por músicos de estúdio). A exemplo da coletânea O Sumo do Rumo, o Sopa está fora desse lançamento completado por Diletantismo (1983), Caprichoso (1985), Quero Passear (1988) e Ao Vivo (1991). O DVD é de 2004.


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