Ciência boa de aprender

2012-visita-alunos-romeu-moraes-Laboratorio-Incor-CORTE-600px

Até o ano de 2010, a direção da Escola Estadual Romeu de Moraes, no bairro paulistano da Lapa, enfrentava problemas com uma de suas turmas do segundo ano do Ensino Médio. Os alunos não prestavam atenção nem respeitavam os professores durante as aulas. Até que, naquele ano, Verônica Coelho e Paulo Cunha, cientistas do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas/USP (InCor), levaram para o colégio o projeto Imunologia nas Escolas. E o comportamento dos alunos mudou de forma surpreendente. Eles começaram a se interessar pelas aulas, ficaram mais disciplinados e passaram a aceitar a autoridade dos professores. 

A explicação estava na metodologia do projeto, montada a partir de atividades mensais para discussão de conceitos de imunologia e o pensamento científico em suas mais diversas áreas. Isso é feito a partir de atividades lúdicas, debates e exercícios práticos no horário de aula em parceria com as disciplinas de Biologia e Química. Em um dos trabalhos, utilizou-se a música, a dança e colares coloridos, que representaram a transmissão do vírus para explicar como a epidemia de AIDS começou. Depois, os alunos discutiram os conceitos aprendidos e assistiram a um filme sobre o assunto. 

A iniciativa também já contava, naquela época e permanece, com um programa para formação de professores da área de Ciências Exatas e Biológicas da rede pública, que buscam desenvolver uma visão diferenciada do ensino. Verônica, coordenadora do projeto, explica que o processo de aprendizagem é a riqueza do Imunologia nas Escolas e ele pode ser utilizado em diversas áreas do conhecimento. 
Segundo Verônica, a ideia é aproximar a ciência de alunos e professores, com focos no Ensino Médio de escolas públicas. “A ciência está muito fechada em muros no Brasil”, explica a médica, ao justificar o sentido da iniciativa. Ela aposta na ideia como ferramenta de transformação e educação. Para isso, conta com 20 professores voluntários, todos os alunos de pós-graduação da USP, do Instituto de Investigação em Imunologia – Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (iii-INCT) e de outros INCTs. Os temas são decididos em reuniões entre alunos, professores, voluntários e coordenadores. 

Além dos encontros mensais, os alunos da Escola Pública Romeu de Moraes podem participar do programa de pré-iniciação científica, que faz parte do Imunologia nas Escolas. Hoje, são 11 estudantes envolvidos na iniciativa. Eles contam com orientadores pós-graduandos ou pós-doutorandos e subsídios da USP e do CNPq. Além de usarem os laboratórios da Faculdade de Medicina da USP para o desenvolvimento de pesquisas duas vezes por semana, os orientandos se reúnem uma vez por mês para discutir a evolução e o encaminhamento de seus projetos. 

Sabrina Alves Santos, da primeira turma do curso, ganhou no ano passado o terceiro lugar do Prêmio Ciências da Saúde, na Feira Brasileira de Ciência e Engenharia (FEBRACE), na Politécnica da USP. Sabrina estudou os efeitos da poluição do ar no desenvolvimento ósseo do feto e suas consequências na vida adulta. Para isso, realizou testes com camundongos no laboratório de patologia e poluição atmosférica. O contato com a área de imunologia a aproximou de seu sonho: cursar medicina. A estudante de 17 anos acreditou que sua pesquisa não seria aprovada para a competição por ser muito simples. Ela conta que ver seu nome na lista de premiados foi uma das maiores alegrias de sua vida. 

Mesmo alunos que não se interessam por Biologia ou Química são atraídos pelo projeto. Grande parte da primeira turma que participou da proposta na escola estadual não tinha pretensão de fazer um curso superior. Hoje, muitos pensam em prestar vestibular. Para Verônica, o interessante é ver como os alunos se apropriam de termos científicos, mudam a forma de encarar o mundo e se tornam mais questionadores. “Isso é fruto da educação emancipadora.”

O projeto também mudou a realidade de uma das professoras da Escola Estadual Romeu de Moraes. Priscila Carmona lecionava desde 2006 e foi surpreendida quando soube que Paulo Cunha, seu professor de faculdade, fazia parte da equipe de cientistas que queria começar o projeto na escola. Foi Priscila quem escolheu a turma mais “bagunceira” da escola para começar o projeto. “Pensei que seria interessante mostrar algo novo para motivar os alunos”, justifica. Hoje, ela parou de dar aulas e faz mestrado em Imunologia na USP, orientada por Verônica Coelho. 


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.