Mestres do Renascimento

Acervo CCBB
“San Girolamo”, 1550-80, óleo sobre tela de Bassano del Grappa, 119 x 154 cm. museale della città di Venezia e dei camuni della Gronda Lagunare, Gallerie dell’Accademia

Na exposição Mestres do Renascimento, no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo (CCBB) até 29 de setembro e, em seguida, no CCBB de Brasília, pela primeira vez o público brasileiro pode ter um panorama abrangente da arte dessa época, em um acervo com 57 obras, muitas de autores de primeira linha, procedentes dos principais museus públicos da Itália e de algumas coleções particulares, com subsídios audiovisuais que contribuem para compreender os contextos histórico e artístico.

A curadoria de Cristina Acidini e de Alessandro Del Priori evidencia as relações e as diferenças entre os diversos centros regionais por meio do arranjo espacial da mostra. O percurso se inicia com Florença, berço da arte renascentista pela retomada do naturalismo clássico, a invenção da perspectiva científica por parte de Brunelleschi, sua divulgação nos tratados de Leon Battista Alberti, fruto da revolução figurativa de Masaccio e de Donatello. Na sala, merece destaque a Virgem da Humildade, de Gentile da Fabriano, um dos maiores artistas do gótico tardio. Em contraste com a plasticidade da criança, indício do contato com a arte florentina, a elegância linear da pose da Virgem e a riqueza do fundo folhado a ouro evocam o clima aristocrático das cortes do norte da Europa. Já na segunda metade do século XV, o afresco de Sandro Botticelli figurando Santo Agostinho em seu escritório repleto de instrumentos científicos, atesta a fusão entre o ideal humanista e o religioso. O tondo com a Anunciação do mesmo mestre, por seu despojamento, sinaliza a crise dessa tentativa causada pela pregação de Girolamo Savonarola, que também aparece retratado pelo dominicano Fra Bartolomeo. O pequeno Cristo Abençoando, obra-prima dos anos florentinos de Rafael, evidencia na formação do pintor a herança de Perugino e a fascinação por Leonardo e pela escultura antiga. Na Virgem com o Menino, de Pontormo, infelizmente em estado não perfeito de conservação, percebe-se a constante meditação do pintor sobre Michelangelo na crise final da República, enquanto o gelado Retrato de Dama, de Bronzino, é um exemplo da cultura de corte sob a dinastia dos Médici. Àquela época perturbada, remonta também o desenho de fortificação de Michelangelo em que sua abordagem à arquitetura aparece radicalmente transformada por considerações funcionais, sugerindo uma instigante comparação com a modernidade.

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Na sala dedicada a Roma, o visitante se depara com o pequeno tríptico com o Juízo Final, a Ascensão e Pentecoste, obra de Beato Angelico, que a partir das propostas florentinas, conseguiu criar uma pintura religiosa solene e devota, e introduziu na cidade a linguagem renascentista. A presença de Michelangelo e de Rafael introduziu a maneira moderna. Suas interpretações do clássico são representadas pela cópia de um detalhe de uma das últimas obras do Sanzio, A Nossa Senhora, dita A Pérola, e por um estudo do mestre florentino para Porta Pia, em que a arquitetura antiga se encontra radicalmente transfigurada em nova plástica monumental, abrindo caminho para o barroco. O Retrato do Médico Arsilli, um tanto desgastado pelo tempo, obra de Sebastiano Del Piombo, afirma o papel de Roma como lugar de encontro entre as correntes artísticas oriundas dos diversos centros italianos, neste caso Florença, de Michelangelo, e Veneza, de Giorgione e Ticiano.

A produção das cidades da Itália central e setentrional relaciona-se ao surgimento da sociedade de corte. As marchetarias do Palácio Ducal de Urbino, evocando Piero della Francesca, representam cidades ideais, manifestação visível da arte do governo do príncipe, que, como a perspectiva, atribui, conforme a proporção, a medida certa para cada segmento da sociedade. Elisabetta Gonzaga, duquesa de Urbino, foi elogiada por Baldassare Castiglione em Cortesão, como o tipo ideal da mulher renascentista, centro da vida da corte, musa e protetora dos artistas. Sua imagem pintada por Rafael reafirma a importância singular do retrato nesse novo contexto aristocrático, bem como a inserção do pintor na elite social de seu tempo. Dosso Dossi, em Ferrara, tratou com ironia as regras do gênero, figurando o duque Alfonso como exemplar sublime de guerreiro, trajado de ferro, e o sorriso tolo do bufão da corte. Ainda, o lombardo Girolamo Savoldo, precursor do naturalismo de Caravaggio, pintou um jovem flautista a ponto de executar a partitura em um interior carregado de melancolia. Na comparação entre regra e invenção, ideia e habilidade executiva, típica da estética maneirista, se faz presente uma nova figura de artista, o virtuose. Uma obra de Correggio também enriquece a mostra, ao lado de uma cópia de época de Parmigianino, de uma elegância mais cortesã e extravagante, enquanto apenas um reflexo da pintura de Leonardo se vislumbra nas obras modestas de seguidores milaneses, destacando-se o anônimo autor de Leda, da Galleria Borghese.

Já a trajetória da arte renascentista vêneta é representada por muitos dos maiores mestres da laguna e dos centros da região. A alegoria pagã de Alvise Vivarini dialoga com a Sagrada Família, de Andrea Mantegna, na evocação quase arqueológica dos monumentos romanos. A deslumbrante luminosidade que invade a sala marmórea da Anunciação, de Giovanni Bellini percorre o colorismo veneziano do século posterior, identificando espaço e luz. Se as obras de Tintoretto e de Veronese atestam a chegada dos fermentos do maneirismo, ao lado dos modelos de Ticiano, o velho mestre surpreende pela sensualidade de Madalena, da Pinacoteca de Capodimonte, em Nápoles, e pelo intimismo da Nossa Senhora com o Menino, ambas executadas com grande segurança e habilidade de toque, igualada só pelos efeitos dramáticos de luz do São Jerônimo nu, de Jacopo Bassano, absorvido na perplexa contemplação do crucifixo e da vaidade do conhecimento humano perante o inexorável correr do tempo, documento da sombria crise moral que encerra a época na Itália.


Mestres do Renascimento
CCBB São Paulo. Rua Álvares Penteado, 112 – Centro – 11 3113-3651
Até 29 de setembro
CCBB Brasília. Rua SCES, trecho 2, cj. 22 – 61 3108-7600.
De 12 de outubro a 5 de janeiro de 2014

Saiba mais 


*Doutor em História da Arte pela Universitá degli Studi di Pisa e professor junto à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e professor visitante da Universidade Estadual de Campinas.

 


Comentários

2 respostas para “Mestres do Renascimento”

  1. um de meos hq que do remascentismo batizei de A,Z LOTUS e um hq, omde tenho personagen como mishelangelo e otros sao grandes da renascentismo as paginas estao disponiveis em downloads em meo sit asima o sit fison

  2. no sit asima e omde tenho ums pagnas de meos artigos de art roteiros meo e art mias sao art em hq

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