Síria: das armas químicas ao novo equilíbrio de poder

Com o acordo sobre as armas químicas da Síria, silenciaram, por enquanto, os tambores da guerra. E, naturalmente, os olhares antes concentrados, à espera do início dos bombardeios e do frisson da cobertura de guerra, se dispersam. Perde interesse a guerra sangrenta que prossegue, depois que já não cabe denunciar com tanta força o suposto uso de armas químicas, já que este não dará mais lugar a um ataque americano.

Que não haja engano: quem quer que tenha usado armas químicas cometeu um crime terrível. Mas é fato que esse uso, insistentemente posto na conta do governo sírio, ao ser elevado à condição de razão suficiente para um ataque, pareceu tornar-se a única questão relevante, inclusive moralmente. Muitos acreditaram que, se atacassem, os Estados Unidos o fariam por conta desse crime. Alguns até acreditaram que o fariam por aceitarem um dever moral.

A verdade é que um ataque responderia a outras razões, variáveis, segundo a forma que tomasse. Ou serviria apenas a preservar a reputação americana, de grande potência e de cumpridora de suas ameaças, ou buscaria enfraquecer as forças do governo diante da oposição, estabelecendo um maior equilíbrio e prolongando a guerra interna, ou teria o fim de destruir a infraestrutura do país, acelerando a sua transformação em um Estado falido.

Já a ameaça de ataque, ou era a armadilha em que o presidente americano caíra ao estabelecer o uso de armas químicas como linha vermelha a não ser cruzada, ou era a única saída que restava para tentar obter algum ganho político numa situação que escapava ao controle dos Estados Unidos e seus aliados. Um pouco das duas coisas é certamente verdade.

Vieram então os russos, e com eles os sírios e os iranianos, e ofereceram a saída da armadilha ou o acordo que permitiria aos americanos, ao mesmo tempo, manter alguma credibilidade e não embarcar diretamente em um conflito de conseqüências potencialmente trágicas.

Mas isso não é senão o que está na superfície das coisas. Junto com o acordo pelo qual a Síria se comprometia a abrir mão de seu arsenal químico, começaram a se multiplicar os sinais de que se começa a preparar uma solução negociada para o conflito sírio – ainda que, com tantos atores orientados por interesses díspares, a coisa seja tudo menos evidente. E se multiplicam os sinais de que há um movimento em direção a acertos mais profundos e mais amplos: uma aproximação dos Estados Unidos e do Irã, e do Irã com a Arábia Saudita.

O balanço, sempre provisório porque esse é um jogo que não chega ao fim, indica que a Rússia e, de modo menos evidente, a China, impuseram aos Estados Unidos, ao longo da crise síria, uma nova divisão do poder no Oriente Médio.

*Professor de Direito Internacional da GV


Comentários

Uma resposta para “Síria: das armas químicas ao novo equilíbrio de poder”

  1. PELO MENOS TEM DUAS FORÇAS DISTINTAS : EUA VAI TER QUE NEGOCIAR PELO MENOS! MEU MEDO É QUE DESARMEM A ´SIRIA PARA DEPOIS ATACAR, COMO FIZERAM NOS IRAQUE!

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