Não é somente para mulheres

Dar conselhos a mulheres de todas as idades, principalmente as casadas, foi uma forma que os jornais encontraram para atrair o interesse feminino nas décadas de 1950-60. Não foram poucas as sessões dedicadas ao tema. Nelson Rodrigues (1912-1980), por exemplo, transformou-se em Mirna no Diário da Noite, em que, na pele de uma experiente jovem senhora, cunhou frases geniais, como esta que deu nome a um livro: “Não se pode amar e ser feliz ao mesmo tempo”. Havia, no entanto, mulheres de verdade, como Tereza Penna (1927-2006), da revista O Cruzeiro. E a escritora Clarice Lispector (1920-1977) que, sob os pseudônimos Tereza Quadros e Helen Palmer e como ghost writer da atriz e modelo Ilka Soares, cuidou das colunas dos jornais Comício, Correio da Manhã e Diário da Noite.

Eram sugestões sentimentais típicas daqueles anos de pré-revolução sexual e de uma sociedade secularmente moralista com as mulheres, principalmente. Mas Clarice ousava ao orientar e ao fazer reflexões que iam desde aulas de sedução a sugestões interessantes de culinária e beleza ou trabalhar fora de casa – temas ainda tão presentes em 2013.

A partir de 27 de outubro, esses textos são mote para a série de TV com oito episódios Correio Feminino, a ser exibida pela Rede Globo, aos domingos, no Fantástico – com o mesmo tratamento de superprodução de A Vida Como Ela É, de Nelson Rodrigues, com direção de Daniel Filho e marco da teledramaturgia brasileira na década de 1990. O seriado foi criado e dirigido por Luiz Fernando Carvalho e adaptado por Maria Camargo, com colaboração de Carla Madeira. A atriz Maria Fernanda Cândido faz Helen Palmer. Os quadros são narrados pela atriz como programa de rádio, cuja voz representa Helen, figura afetuosa e disposta a socorrer leitoras aflitas. Na representação de três gerações de mulheres, a top model Cintia Dicker será a “lolita”; a ex-modelo Luiza Brunet, a “mulher madura”; e a atriz Alessandra Maestrini, a “mulher jovem”. Elas simbolizam as várias facetas do feminino no universo de Clarice.

As historinhas são embaladas por uma saudosa trilha sonora da época e muita criatividade na edição. “É sempre uma responsabilidade muito grande lidar com o original, e aumenta ainda mais porque é Clarice Lispector”, observa Maria Camargo. “Mas gostar bastante da obra ajuda, torna-se um detalhe importante.”

A reportagem da Brasileiros assistiu ao episódio de estreia, Aulinha de Sedução. Mistura de linguagem de videoclipe e publicidade com história em quadrinhos, o programa é de um apuro técnico e estético como raramente se viu na teledramaturgia brasileira. O registro das cenas em HD ressalta as cores, que ganham mais vivacidade pela ênfase no rosa e no vermelho, tão presentes no universo feminino.

O visual completa o roteiro, costurado com frases de Clarice, ditas em formas de conselho a uma mulher de meia-idade para alimentar o casamento por meio da sedução: “Sedução, mas com sutileza para todos nós”; “Não continuar seduzindo o marido é um erro”; “Você pode ser irresistível sem ser bela”; “Não existe mulher feia”. Ao final, uma mensagem: “O mundo de hoje é da mulher inteligente. E o amor também”. Ela escreveu isso há meio século. Como se fosse ontem.
 


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