PrintMais de 500 horas de ensaio. Muitas dívidas, dúvidas, brigas e discussões. Centenas de e-mails, ligações e mensagens. Muito trabalho para tudo fazer sentido nesses momentos!” Reproduzida na página do Facebook do Bixiga 70, a aspa é coletiva. Sintetiza a emoção dos dez músicos perante a reação calorosa do público durante dois shows realizados no final de setembro, em São Paulo, na choperia do SESC Pompeia. A big band paulistana disponibilizou o segundo disco para download gratuito na semana anterior aos shows de lançamento no SESC quando, enfim, pôs à prova o repertório de sua tão aguardada segunda vinda e, literalmente, transformou o salão da choperia em um verdadeiro bailão. 

Mas até chegar a esse grau de empatia, os músicos se desdobraram para driblar o reducionismo a que parte da crítica os seccionou ao sugerir que o combo era apenas mais um grupo de oportunistas a surfar na onda cult do afrobeat. Lógico, o gênero musical criado e disseminado por Fela Kuti (morto em 1997, em decorrência de AIDS) foi influência inaugural para a banda. Basta dizer que o grupo se reuniu pela primeira vez, sob o nome Malaika (como um noneto), especialmente para fazer um único show com clássicos do nigeriano na quarta edição da Festa Fela (em São Paulo, a celebração é realizada anualmente desde 2006, no aniversário de Fela, 15 de outubro).

Bixiga 70 - divulgação 2013 01 - créditos Nicole Heiniger
Foto: Nicole Heiniger

O entrosamento entre os músicos e a recepção ao show foram tão motivadores que a trupe decidiu seguir adiante, tendo como “quartel-general” o estúdio Traquitana, sediado no número 70 da Rua Treze de Maio, coração do Bixiga, bairro da região central de São Paulo (daí o Bixiga 70). Tamanha foi a voltagem criativa entre eles que em menos de um ano conseguiram fechar repertório autoral para o primeiro álbum, lançado em novembro de 2011 (ocasião em que o grupo teve perfil publicado na edição 52 da Brasileiros, leia em http://bit.ly/18Q9EM9).

Gravado entre os dias 13 e 17 de maio, no mesmo Traquitana que foi “maternidade” do primogênito, o segundo álbum teve produção da própria banda (no primeiro, foi assinada por Victor Rice, que mixou este segundo)  e, novamente, a arte da capa ficou a cargo do DJ e artista plástico MZK. Antes de submeter o disco ao “polimento” final, a banda embarcou pelo Velho Mundo e atestou a força das novas composições. Foram seis shows, em cinco cidades europeias, no decorrer de julho: Gent (Bélgica), Nantes (França), Sommarscen (Suécia), dois shows em Amsterdã (Holanda) e uma apresentação no tradicional Roskilde Festival, na cidade dinamarquesa.

Às matrizes africanas de sempre, o novo álbum acrescenta sonoridades brasileiras como o carimbó paraense e o ponto de candomblé presente na faixa Deixa a Gira Girar, de domínio popular, mas gravada, em 1973, pelo grupo Os Tincoãs. Liderado pelo compositor Mateus Aleluia, Os Tincoãs são, entre outros artistas ignorados, referência cara aos músicos do Bixiga 70. Os traços da linha evolutiva defendida pelo grupo, a partir de pesquisas que nutrem essas novas composições, são perceptíveis desde os primeiros shows e disco, que contêm uma releitura instrumental de Desengano da Vista, tema extraído de Krishnanda (1968), obra-prima do percussionista Pedro “Sorongo” Santos que recentemente ganhou nova edição em LP. Energético e maduro, o segundo álbum do Bixiga 70 não deixa dúvidas: a big band segue caminho virtuoso e promete mais.


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