Pensamento ordenado ligado à psicanálise e à filosofia conceitualmente sempre envolve o outro
É preciso falar da mineira Rivane Neuenschwander. Usando suportes, texturas e materiais diferentes, a artista fala sobre entrelinhas e desentendimentos, ampliando questões sobre a linguagem e o olhar sobre o mundo. Em outubro deste ano, ela ganhou o Yanghyun, prêmio coreano que contempla artistas com obra já reconhecida, como Jamie Cameron (EUA, 1969), Isa Genzken (Alemanha, 1948), Jewyo Rhii (Coreia, 1972), Akram Zaatari (Líbano, 1966) e Abraham Cruzvillegas (México, 1968).
Rivane é como uma música, compassada e certeira. Pensamento ordenado, acredita que tem dificuldades com a comunicação, mas nos conceitos que desenvolve, envolve o outro – elemento primordial para completar sua obra. Em Primeiro Amor (2005), uma obra-performance exposta no New Museum, em Nova York, Rivane chamou um artista especialista em retrato falado, para resgatar da memória da pessoa o registro do seu primeiro amor. Em Diálogos Anônimos (2010), alterou máquinas de escrever – deixando-as apenas com pontos finais, para que os visitantes da exposição construíssem em conjunto, o silêncio. A artista conta que essa “dificuldade” na comunicação, lhe acompanha desde que era garotinha e aparece em seus trabalhos, entre dimensões e outras perspectivas. Fala sobre a percepção das coisas, de como nos posicionamos perante o mundo. “Gosto muito de psicanálise e filosofia”, diz. Talvez seja o modo que a artista enxerga o mundo e contesta os limites. Como na série Fora de Alcance (2012), exposta na Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo. As peças pairavam entre a noção de contenção e vazamentos. A uma Certa Distância (Barreiras Públicas, 2012) é uma espécie de cerca que serve para delimitar uma área, encaminhar o espectador e impedir o acesso. “Trata-se da imposição de um limite físico que se prova ineficaz, por sua permeabilidade e fragilidade”, pontua. Já em Progressões de Fogo (2012) e em Mancha de Óleo (2012), a referência é sobre os limites físicos que podem não ter efeito algum diante de catástrofes naturais. Em Monstra Marina (2012), a artista revela, por meio de moedas de sal prensado, que algumas coisas permanecem sólidas desde que se cuide bem delas – como na natureza. Rivane diz que o uso de diferentes tipos de suportes são definidos pelo conceito das obras, o que a faz transitar por várias mídias, seja desenho, pintura, fotografia ou escultura, “mas também exige muito em termos de domínio técnico e responsabilidade formal”.
Neuenschwander é descendente de suíços, tem 45 anos e dois filhos, Theo que tem 8 anos e Hannah, 6. É casada com Jochen Volz, que também trabalha com artes. Formou-se na UFMG, onde experimentou para além da academia. No ano passado, deixou a querida Belo Horizonte para viver na intensa Londres, novamente, já que em 1996 havia feito um curso no Royal College of Art (RCA), que a jogou em um cenário de criação e expectativa. Suas instalações, telas e vídeos já estiveram nas Bienais de Veneza, Santa Fé, Istambul e São Paulo. Já fez exposições individuais, em lugares como o Konsthall Malmö, na Suécia, e no Museu Irlandês de Arte Moderna, em Dublin. Está presente em acervos como o do Tate Modern, em Londres; Museu da Arte Moderna, em Nova York; e Inhotim, em Brumadinho. “Inhotim é um lugar onde projetos de caráter mais experimental e utópico são realizáveis. Fundamental em tempos de espaços cada vez mais burocratizados e encolhidos.”
No espaço, a artista desenvolveu o projeto o Continente-Nuvem (2008), uma obra cinética, que ocupava totalmente o teto da casa, com pequeninas bolas de isopor que se moviam sobre o forro transparente, fazendo alusão aos movimentos das nuvens no céu e dos mapas do globo. “Era de difícil manutenção. Contei com a ajuda de arquitetos, engenheiros, restauradores e paisagistas, além da interlocução preciosa dos curadores”, conta.
Quando pergunto sobre o cenário em que está inserida, Rivane responde que acha que existe muita ansiedade em relação ao consumo e à produção do artista, expectativa do mercado. “São muitas as feiras de arte e estas não deveriam tomar o lugar (em termos de visibilidade) de plataformas mais experimentais, como as bienais. As instituições e os museus precisam ser fortalecidos e as pessoas deveriam ser mais criteriosas.”
Quando falo de saudade, Rivane responde que sente falta da familiaridade “um sentimento mais abstrato e subjetivo”. Além do céu azul.
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