Um dia de “Jaques”, o pagador de contas

Tempos atrás, quando comecei a trabalhar em casa, virei o “Jaques”. Era só minha mulher me ver sem fazer nada, que vinha logo com aquele irrespondível pedido à queima roupa:

“Já que ce taí sem fazer nada, será que não dá pra ir no banco pagar estas contas pra nós?”.

Tinha que ir, claro. Nos últimos tempos, minha vida melhorou muito porque ela passou a pagar todas as contas pela internet, e nunca mais falamos no assunto.

Este mês, como a Mara não conseguiu pagar algumas contas porque estava passando férias com a família na praia, e a internet lá ainda funciona movida a lenha, imagino, sobraram algumas contas para pagar no banco.

Sexta de manhã, lá fui eu cumprir meus compromissos na parte que me cabe neste longevo casal que está para completar 40 anos de vida em comum.

Minha primeira parada foi nos Correios, agência da rua Estados Unidos. Sim, apesar de toda a facilidade proporcionada pela internet, ainda é preciso mandar por carta os comprovantes para receber restituição de pagamento do plano de saúde.

Como era hora de almoço, claro que o pessoal tinha saído para o almoço. Ficou só um herói lá para atender à clientela. Acontece que é justamente nesta hora que muita gente aproveita para ir aos Correios

Meia hora depois, cumprida a primeira missão, tive sorte: na agência do Banco do Brasil, na rua Augusta, estava tudo deserto no andar térreo, onde só ficam os caixas automáticos e uma mesa, deve ser do gerente, que tinha ido almoçar.

No andar de cima, onde ficam os caixas, também parecia feriado. Ali agora só funcionam dois guichês, mas logo fui atendido. Fiquei pensando para que serve uma agência tão grande e suntuosa para tão pouca gente.

Pouco mais acima, na rua Augusta, a agência do Banco Real estava fechada em pleno dia útil. Não entendi nada. Nenhum aviso, nenhum sinal de greve, e tudo vazio, portas fechadas. Dali a pouco apareceu um funcionário para me informar que a agência estava sem energia.

Virando à direta, na alameda Lorena, a agência do Santader era a última estação da minha viagem de pagador de contas da família. O mesmo cenário: tudo deserto, apenas os seguranças olhando para o vazio, que me indicaram o caminho para pagar a conta que faltava.

Era preciso pegar uma senha como nos laboratórios de exames clínicos. Tinha duas opções. Uma delas era só para idosos, deficientes, gestantes, etc., e foi nela que peguei a minha porque, de acordo com o Estatuto do Idoso, a partir dos 60 anos, temos direito à fila preferencial em qualquer lugar.

Foi a maior roubada. Esperei uma eternidade para ser atendido porque muitas empresas agora contratam pessoas de minha idade como office-boys, quer dizer, office-olds, que levam pacotes de documentos para pagar e passam horas no guichê.

Além disso, tem meus colegas aposentados, que não conseguem usar o caixa eletrônico e vão ao guichê todos os dias para conferir suas contas e levar um papo interminável com os atendentes, só para matar o tempo.

Por último, tem os malandros trouxas, que não são idosos, nem aleijados nem grávidos, mas entram na fila preferencial “por engano”. Em geral, são distintos senhores de paletó e gravata (no check-in de prioridade dos aeroportos, eles também costumam se “enganar”).

Não foi o melhor programa do mundo, confesso, mas faz parte, e é bom para a gente saber como é a dura vida de quem ainda está fora da internet e tem que pagar suas contas nos bancos.


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