Difícil ver Edson Cabral, 50 anos, de mau humor ou minimamente estressado. O relações públicas e guia do histórico edifício Martinelli é capaz de cativar um grupo de dez a 100 turistas sem gaguejar. “Ele é um showman, não tem quem não o conheça aqui no prédio”, comenta uma de suas colegas de trabalho.
Após o almoço, às 14h de uma ensolarada e quente tarde em São Paulo, Cabral direciona um tímido turista coreano ao apertado elevador do Martinelli e aperta o número 26. Até atingir o terraço do edifício, Cabral conta que ainda não fala inglês, mas isso não o impede de se comunicar com o rapaz que dá risada. “Aqui a gente se vira. Quando vejo que tem turistas de outros países eu já pergunto para o pessoal ‘quem fala inglês aqui?’ e aí conto a história sobre o Martinelli mais devagar e alguém vai traduzindo”, conta com um sorrisão no rosto.
Era dezembro de 2001 quando a portaria do edifício ganhou Cabral como funcionário dedicado. De lá pra cá, passou de segurança do prédio a supervisor da segurança até quando em 2010 foi convidado a assumir a posição de Relações Públicas e o papel de “apresentador” do Martinelli. “Olha, eu vou fazer 51 anos de idade, e de tudo que eu fiz na minha vida, eu nunca tive uma projeção igual a que eu estou tendo. Aqui eu já falei para revista, jornal, televisão do Canadá, do Japão, da Alemanha… a gente acaba falando para o mundo. Então eu me sinto, um garoto propaganda do Martinelli”, conta um orgulhoso Cabral.
Sobre a origem do edifício e da trajetória de seu fundador, Cabral lembra datas, números e curiosidades de cor. A pesquisa sobre o prédio se deu por iniciativa própria, com buscas na internet e fontes bem mais humanas como os próprios funcionários do local e aqueles mais antigos, que já passaram pelos andares do primeiro arranha-céu do país. “Já fomos atrás de pessoas com mais de 80 anos que viveram aqui na época”, conta. E a história do “empreendedor e visionário”, como Cabral descreve o italiano Giuseppe Martinelli – fundador do edifício a quem dá nome, é contada umas dez vezes por dia: “é uma história inspiradora para mim. E é como se eu estivesse contando pela primeira vez”.
Quanto à fama de mal-assombrado que o Martinelli já ganhou, Cabral rebate com bom humor: meus cabelos nunca arrepiaram. Mas tem gente aqui que fala que já viu e ouviu coisa. Se é verídico ou não, eu que não vou atrás para saber”, afirma rindo. O edifício de 105 metros de altura, finalizado em 1934, teve sua época de ouro, onde frequentava a elite paulistana. Mas nos anos 50, em sua fase mais sombria, se tornou cortiço, prostíbulo e cenário de alguns crimes.
Paulistano nascido na região da Penha, Cabral se mudou com a esposa Vilma para o centro da cidade há alguns anos. Todos os dias, ele deixa o Brás e caminha a pé até o trabalho, onde chega às 8h. “Antes eu tinha que pegar metrô lotado, ônibus. E você sabe, eu sou da turma do Osmar, né? Os-marmiteiro”, brinca. Desde que deixou de usar o terno para trabalhar, Cabral diz estar se adequando às camisas menos formais. “Na primeira semana que deixei de usá-lo, eu me senti ridículo. Usei terno por doze anos. Foi difícil deixar, mas hoje já me sinto melhor”. E a esposa, Vilma, a quem Cabral define como sua ‘musa inspiradora’ é quem o ajuda a escolher as camisas.
Desde que foi aberto a visitações guiadas em 2010, cerca de 70 mil visitantes já passaram pelo terraço do Martinelli e ouviram as histórias e o bom-humor de Cabral. Para o próximo dia 25, aniversário da cidade de São Paulo, o carismático relações públicas já foi convocado para estar presente no 26º andar do edifício faça chuva ou faça sol:”eu folgo sábado e domingo, mas quando me convocam eu venho e venho com satisfação”.
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