Até os são-paulinos mais fanáticos, como eu, devem estar surpresos com a reviravolta do time nos gramados e na tabela de um mês para cá.
Qual foi o milagre, o que aconteceu, como explicar este fenômeno que em tão pouco tempo tirou o tricolor da ameaça de rebaixamento e o levou novamente à disputa pelo título do Brasileirão?
Fiz estas perguntas ao superintendente de futebol do clube, o médico Marco Aurélio Cunha, que encontrei por acaso, na segunda-feira passada, no café do saguão do Hospital Sírio-Libanês.
Empolgado com a reação do time, o baixinho Cunha, um dirigente muito polêmico, mas profissional, ao contrário dos outros, abriu um largo sorriso e falou meia hora sem parar, vingando-se dos jornalistas que meteram o pau na troca de Muricy por Ricardo Gomes, um técnico em quem ninguém botava fé.
“Vocês precisam entender que jogador de futebol precisa ter fome de bola, um bom motivo pra se matar em campo, comer a grama. Como estavam ganhando tudo, ficaram mal acostumados e se acomodaram. Tomaram um susto e agora, com a troca do técnico, encontraram nova motivação para brigar por um lugar no time”.
Foi mais ou menos isso, em resumo, o que ele me explicou. Ele não disse, mas ficou subentendido também que havia um desgaste entre os jogadores e Muricy, depois de três anos de convivência e muitos títulos conquistados.
Quando tudo ia bem, ninguém se importava com os gritos e xingamentos de Muricy para motivar e consertar o time à beira do campo. Mas, quando as coisas começaram a ir mal, isto só serviu para piorar o relacionamento, e o time desandou nas competições deste ano.
Por isso, talvez, a tão criticada diretoria tricolor tenha surpreendido todo mundo ao contratar Ricardo Gomes, um técnico manso, muito educado, que se veste bem e fala francês, mas de currículo meia boca, que era exatamente o contrário de Muricy. Era estranho vê-lo assistindo aos jogos, impassível, calado, como se estivesse numa ópera.
Pois não é que o São Paulo passou não só a correr atrás da bola como voltou a jogar bem e bonito, tocando de primeira, trocando passes, saindo rápido da defesa para o ataque, sem aquele marasmo irritante dos chutões para a frente e chuveirinhos na área?
Com a mesma camisa e os mesmos jogadores, foi outro São Paulo este que detonou o Goiás, vice-lider do campeonato, domingo, no Morumbi. Terminou apenas 3 a 1, mas poderíamos ter metido neles uma goleada histórica, com três bolas batendo no travessão de Harlei, e um monte de boas chances perdidas.
O Goiás simplesmente não viu a cor da bola, e não adiantou nada seu técnico, Hélio dos Anjos, passar o jogo todo se esgoelando para tentar colocar ordem no time – exatamente como acontecia com o São Paulo até outro dia.
Mais do que a quinta vitória seguida, o São Paulo reconquistou a auto-estima e a confiança, a alegria de jogar futebol, que empolgou novamente os quase 30 mil torcedores no Morumbi.
Eu mesmo voltei a vestir minha camisa tricolor cheia de estrelas, que andava meio esquecida no armário – e o fiz logo cedo, antes do jogo, é bom esclarecer.
Esta é a graça e a desgraça do futebol para quem só vê as coisas do lado de fora sem conhecer a intimidade do clube: do céu ao inferno e vice-versa, é um pulo.
Basta ver o Corinthians, que faz agora o caminho inverso ao do São Paulo, há cinco jogos sem ganhar, depois de conquistar três títulos em seguida.
Até quem é do ramo e entende do assunto, como o nosso Milton Neves, foi obrigado a reconhecer, e não teve pejo de sapecar no título do seu post de domingo no iG: “Mordi a língua ao dizer que Ricardo Gomes não daria jeito no São Paulo”.
Pois é, meus amigos, agora acabou a brincadeira. O São Paulo entrou, definitivamente, na disputa pelo título, ou melhor, pela conquista do hepta, uma palavra que os torcedores de outros times nem conhecem.
Que me perdoem o meu amigo Muricy e a minha querida neta Laura, mas a partir de agora a história é diferente. Chateado com a demissão do Muricy e a contratação do Ricardo Gomes, eu tinha prometido à neta palmeirense que iria torcer para o Palmeiras ser campeão e o São Paulo não cair.
Agora, meus amigos, o Palmeiras que se cuide. Apenas cinco pontos nos separam. Dá até vontade de fazer como o ex-presidente FHC e pedir aos leitores: esqueçam tudo o que escrevi sobre futebol este ano. Não sei como, mas o São Paulo ressuscitou. Salve o tricolor paulista!
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