O Grupo Tribune, que detém vários títulos do jornalismo diário americano, entrou em concordata. É mais um balaio de nomes tradicionais da imprensa no papel que entra pelo cano. Nessa corporação inadimplente estão, por exemplo, o Chicago Tribune – da terra do futuro presidente – e o Los Angeles Times – que já foi o mais respeitado da Costa Oeste dos Estados Unidos. E este serve à perfeição para mostrar alguns motivos para a debacle. Uma das praças que estão em sua rota de cobertura de notícias e de circulação em bancas é a cidade de Pasadena. Lá o jornalão enfrenta a concorrência do site de informações Pasadena Now, cujos repórteres escrevem diretamente das cidades de Bangalore e Mumbai, na Índia.
Pode parecer desvantajoso cobrir eventos que ocorrem a 18 mil quilômetros de distância. O que explica o fato de a maioria dos repórteres nunca ter colocado os pés nas ruas sobre as quais escrevem. Tem mais: ganham por mês algo em torno de US$ 720, enquanto o salário médio inicial dos colegas do Los Angeles Times é de US$ 4.500. Mas, apesar dessas desigualdades, quem continua com emprego mais ou menos garantido é o escriba indiano. Um deles, que também trabalha como auxiliar de odontologia em Bangalore, declarou ao próprio Los Angeles Times que os rendimentos no jornalismo o transformaram em classe média alta na sua cidade.
A idéia dessa exportação de empregos é de um certo James Macpherson – criador do Pasadena Now, que por sua vez declara que não é jornalista, mas sim um empresário da internet. Como tal, achou seus funcionários através de classificados gratuitos na versão indiana do craigslist, o maior site de classificados do mundo. O modelo operacional implantado é singular: os repórteres assistem a entrevistas coletivas em teleconferências, buscam releases online, entrevistam fontes via e-mail, ou – num arroubo de reportagem – falam com os personagens por meio do Skype (ligação telefônica pela internet que custa tostões). E, claro, passam as noites acordados, pois a diferença de fusos horários entre a Califórnia e a Índia é de 12h50.
Para entender melhor o esquema, imagine o noticiário da cidade de Salvador, na Bahia, sendo produzido em Goa, a ex-colônia portuguesa no subcontinente asiático. Claro que não dá para ter a chamada “cor local” – qualificativo querido de editores e repórteres do jornalismo impresso. Mas quem liga para isso neste mundo virtual? O importante é colocar notícia – seja ela qual for, desde que curta e grossa – na rede. Macpherson aponta para os 45 mil acessos que seu Pasadena Now recebe por mês. Ainda não é nada comparável ao milhão de exemplares mensais de um grande jornal aqui nos Estados Unidos, nem aos mais de cem mil acessos do recém-inaugurado site da Brasileiros, mas ele chega lá… Lembre-se de que o site não suja as mãos dos leitores.
Os administradores de vários conglomerados do jornalismo americano estão considerando seriamente o modus operandi de Macpherson. Os próprios marketeiros do Grupo Tribune dizem que o caminho do futuro pode ser esse. Imagino que no Brasil existam entusiastas do modelo. Quem sabe os craigslist de Angola, Cabo Verde ou Guiné Bissau já estejam anunciando abertura de vagas para sites de cobertura metropolitana do Rio de Janeiro, São Paulo, Floresta Alta ou Chapecó Mirim. Depois da tal da reforma ortográfica e com o verificador gramatical do word qualquer auxiliar de dentista pode fazer uma reportagem.
O jornal impresso, portanto, entrou em extinção. Jornaleiros que tratem de abrir quiosques com ligação Wi-Fi. Gaiolas de passarinhos ficarão sem proteção de piso. Zeladores de prédios vão perder os trocadinhos que fazem com a reciclagem de papel. E os peixeiros que se cuidem: não vão mais ter com o que embrulhar os produtos que vendem.
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