O primeiro dia do festival de Paulínia começou com o documentário Pixote in Memoriam, de Felipe Briso e Gilberto Topczewski, que tenta compreender a anatomia do filme Pixote, a Lei do Mais Fraco, entrevistando o diretor Hector Babenco e os principais atores do longa. A ausência é o protagonista, Fernando Ramos da Silva, na época um garoto e que foi morto pela polícia, em agosto de 1987, aos 18 anos de idade.
O documentário presta uma homenagem ao filme de Babenco, que precocemente alertou sobre uma mazela da nossa fratura social brasileira: o jovem abandonado. Mas, Pixote in Memoriam vai além, e no final tenta, por meio dos entrevistados, compreender o que levou o jovem talento nato e bruto para a criminalidade e ao trágico fim de sua vida. Quando fez Pixote, Fernando não sabia ler e morreu semi
analfabeto. O documentário consegue fluir quando intercala as entrevistas com cenas de Pixote, mas peca em procurar dar explicações, por meio dos frágeis argumentos dos entrevistados, sobre a morte de Fernando. A questão já tinha sido mais bem resolvida com o filme Quem Matou Pixote?, de José Joffily.
“A melhor coisa da noite foi Tempestade”
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A frase acima foi dita por uma jornalista, quando lhe perguntaram o que tinha achado dos filmes exibidos no primeiro dia do festival. A mostra competitiva começou com o curta regional Só Não Tem Medo Quem Não Quer, de Hidalgo Romero, que fala de um assalto que termina mal.
Como todos já devem saber, os diretores, antes de se aventurarem no primeiro longa, fazem um curta para aprender o ofício de diretor. E a maioria desses diretores aproveita o curta para experimentar, ser ousado ou coisa desse tipo. Mas, muitas vezes os experimentos naufragam pela pretensão. Não é o caso do curta Só Não Tem Medo Quem Não Quer, que não ousa muita na linguagem, adequada com a história que o filme quer contar. Porém, o problema se concentra na história, que não diz a que veio. Fica na banalidade e não mostra causa e efeito de tudo aquilo.
Já o outro curta, Tempestade, de César Cabral, que a jornalista cita como a melhor coisa da noite, é um desenho animado e fala da jornada que um marujo empreende no mar para encontrar a sua amada. A animação se baseia em uma música dos Beatles. Para quem perdeu o filme no Festival de Paulínia ou não estava aqui, não fiquem tristes, porque o filme passará no Festival Anima Mundi, que está no Rio de Janeiro e acontece no final do mês em São Paulo.
Hans Staden pede ajuda aos astros
Os dois filmes de longa, o documentário Leite e Ferro, de Cláudia Priscilla (esposa do já conhecido documentarista Kiko Goifman) e o ficção As Doze Estrelas, de Luiz Alberto Pereira, agradaram o público presente ao Theatro Municipal de Paulínia.
Enquanto os jornalistas e críticos que cobrem o festival ficaram divididos com relação ao primeiro, o segundo, o longa de Gal, como é conhecido o diretor Luiz Alberto Pereira, não agradou em nada. Pelo contrário, virou a principal atração das conversas, como uma espécie de Geni, da música de Chico Buarque.
Mas vamos por partes: o documentário de Cláudia Priscilla, apesar de tratar de um assunto já bastante explorado pelos recentes documentaristas brasileiros, a vida em cárcere de presos (no caso do filme de Cláudia, são mulheres), consegue trazer outros olhares para a questão. A documentarista colocou sua câmera à disposição de algumas presas que se encontravam no Centro de Atendimento Hospitalar à Mulher
Presa (CAHMP). Essas mulheres ficam nesse local durante quatro meses, para amamentar suas crianças, e depois voltam para os presídios de origem.
Cláudia consegue tirar da brutalidade de vida dessas mulheres um lado poético, principalmente no relato de uma delas, que se autodenomina de “Tia Robin Hood”. Algumas de suas frases são desconcertantes, humanas e, principalmente, engraçadas. Quando um dos seus filhos foi internado e os médicos precisaram aplicar injeção no seu braço, foi ela quem auxiliou os enfermeiros, que não encontravam uma veia no braço da criança, por ser um recém-nascido. De prontidão, a presa pegou a criança, foi direto numa veia e conseguiu colocar a agulha. Os enfermeiros ficaram impressionados e perguntaram se ela tinha curso de enfermeira e ela respondeu na bucha: “Não, eu tenho curso de pico”, em uma alusão aos tempos em que era viciada em cocaína.
O filme que encerrou a primeira noite foi As Doze Estrelas, de Luiz Alberto Pereira, o Gal. Conta a história de um astrólogo famoso que vai trabalhar na equipe de uma novela das oito. Ele vai procurar doze atrizes, o doze do título, para entregar-lhes a sinopse da novela. E essa jornada vai “transformar” sua vida.
Gal, que já dirigiu o filme histórico Hans Staden, pouco visto, mas muito bom, procura a cada trabalho mudar não somente a temática de suas películas, mas também a maneira como as narra. Foi assim com o seu longa anterior, Tapete Vermelho, uma homenagem para Mazzaropi contada em forma de fábula.
A mistura de gêneros no seu filme As Doze Estrelas e a fraca história naufragam suas pretensões de narração em forma onírica e nonsense. No fim, é um misto de telenovela do SBT, com pitadas de Record (a maioria dos atores são oriundos do canal do bispo Edir Macedo) e mais um molho das novelas mexicanas.
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