Vejam as manchetes desta quinta-feira, 9 de setembro de 2010, nos três principais jornais do país.
Folha de S. Paulo:
“Escândalo da Receita – Investigada consultou dados do genro de Serra”.
O Estado de S. Paulo:
“Genro de Serra teve sigilo fiscal violado”.
O Globo:
“Serra reage e diz que Lula serve à estratégia `caixa-preta´do PT”.
Parece uma gincana, não há outro assunto no mundo. É como se todos os jornais tivessem o mesmo pauteiro e o mesmo editor. Embora se refira a casos de violação fiscal ocorridos no ano passado, a notícia é requentada dia a dia com algum “fato novo” que justifique a manutenção da rubrica “escândalo da receita”.
Até algumas semanas atrás, antes da disparada da candidata Dilma Roussef em todas as pesquisas, abrindo larga vantagem sobre José Serra, que chega a 33 pontos no último tracking do Vox Populi/Band/iG, a nossa velha mídia ainda procurava, de alguma forma, manter as aparências de neutralidade com aquela história de jornalismo “isento”, “apartidário”, “independente”.
Agora, que parece não ter mais jeito de virar o placar nas pesquisas com bom-mocismo, resolveram abrir o jogo e rasgar a fantasia, sem nenhum pudor. Das manchetes ao noticiário, passando pelos editoriais e colunas, a ordem é desconstruir a pessoa e a candidatura de Dilma, e bater sem piedade no governo Lula. Aonde querem chegar? Quem eles ainda pensam que enganam?
Como os números das pesquisas não reagem às doses cavalares de fatos negativos, apesar de o país da mídia viver uma interminável crise do fim do mundo, só posso acreditar que se trata de uma estratégia Jim Jones. Bater em Dilma e no PT, tudo bem, estão todos de acordo. Só não descobriram ainda como alavancar a campanha da oposição.
Um forasteiro que tenha chegado ao Brasil esta semana, e procurasse saber pelos jornais e no Jornal Nacional da TV Globo o que está acontecendo por aqui, a 24 dias da eleição presidencial, poderia imaginar que desembarcou no país errado, em algum lugar estranho e perigoso, na região mais pobre e menos democrática do continente africano.
Sob o título “O país de Lula: esgoto em baixa, consumo em alta”, o jornal O Globo, que se supera a cada dia, pinça números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2009), divulgada esta semana pelo IBGE, para concluir na chamada de capa: “O desemprego subiu na crise, mas o brasileiro comprou mais DVDs e máquinas de lavar”.
Sem explicar como um país de desempregados investe em eletrodomésticos, o jornal esqueceu de dizer que os empregos perdidos na crise do ano passado já foram recuperados, com folga, em 2010 – o que explica a teimosia das pesquisas em manter os índices de aprovação do governo Lula em torno de 80%.
Para publicar o título “O presidente Lula passou dos limites”, com direito a chamada na capa, o venerando Estadão, por sua vez, redescobriu o cientista político José Álvaro Moisés, tão conhecido que se viu obrigado a publicar uma nota “Quem é” para o leitor saber de quem se trata. Entre seus títulos acadêmicos e experiências em “teoria democrática e comportamento político”, porém, o jornal só omitiu o fato de que o professor e cientista Moisés foi sub-ministro da Cultura no governo Fernando Henrique Cardoso.
Já a Folha, que resolveu publicar um caderno especial de eleições a partir desta semana, entre tentativas de fazer humor político misturado com jornalismo sério, tem se dedicado a investigar o passado da ex-ministra Dilma Rousseff, desde os seus antepassados búlgaros, que ela nem conheceu. Até agora, estranhamente, não se interessou em fazer matérias sobre o passado dos outros candidatos, como se todo mundo tivesse a obrigação de conhecer as histórias deles.
Critérios são critérios, eles dirão, ninguém tem nada com isso. A liberdade de imprensa deles, aquela que defendem com tanto fervor, está acima de tudo – dos fatos, das leis, da isonomia e do direito da sociedade de ser informada com um mínimo de honestidade sobre o que está acontecendo.
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