Realismo concreto Preocupada em não  ser considerada otimista, Luiza Trajano busca na escassez  de bens do consumidor os dados para  embasar o discurso
Realismo concreto Preocupada em não
ser considerada otimista, Luiza Trajano busca na escassez
de bens do consumidor os dados para
embasar o discurso

Uma mulher de 62 anos e declarados 1,58 m de altura sai de casa todos os dias, no elegante bairro dos Jardins, na zona sul de São Paulo, e atravessa a cidade, em um percurso de uns 10 km, para chegar à Vila Guilherme, na Zona Norte. Lá, à beira da movimentada Marginal do Tietê, um dos cenários mais poluídos e congestionados da capital, está a sede de seu império, uma empresa com 24 mil funcionários, 474 mil m2 de área de vendas que, em 2013, faturou R$ 9,7 bilhões e obteve lucro bruto de R$ 2,26 bilhões.

Como seus horários são variados, não chega a ser uma rotina, mas esse é o trajeto frequente de Luiza Helena Trajano Inácio Rodrigues ou simplesmente Luiza Trajano, presidente do Magazine Luiza, sexta maior varejista do País pelo ranking do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar). No comando da empresa familiar desde 1991, quando recebeu o cetro da tia e fundadora Luiza Trajano Donato, Luiza está no magazine desde os 12 anos. Começou trabalhando nas férias escolares e entrou em definitivo para a companhia aos 18. Era conhecida como Luiza Helena, quando a tia ainda estava no comando.

Formada em Direito, Luiza Trajano recebeu a reportagem da Brasileiros na ampla sede do Magazine, para uma entrevista no fim da tarde de 19 de março. Um dia atribulado, no qual ela já havia participado de um evento da revista CartaCapital pela manhã, dado uma palestra e estava se preparando para outra, naquela mesma noite. Não por acaso, a empresária, conhecida por sua disposição, demonstrava leves sinais de cansaço, uma dose de pressa e outra de impaciência, ainda que bem disfarçada por modos gentis. Até mesmo quando se recusou a falar da barulhenta celeuma que travou com o escritor Diogo Mainardi, no programa Manhattan Connection, da Globo News, em janeiro. Além de responder a uma provocação sobre a improvável venda do Magazine Luiza para a americana Amazon, na ocasião Luiza rebateu comentários de Mainardi sobre a inadimplência. Prometeu enviar por e-mail ao apresentador, no dia seguinte, as informações que embasavam sua declaração. Cumprida a promessa, sua vitória no embate verbal lhe rendeu inesperada popularidade, e o assunto tornou-se uma das maiores audiências da internet. Chegou a agradecer aos fãs pelo Twitter o apoio recebido durante o episódio. Mas não quer mais falar sobre esse assunto. Chegou a interromper, com elegância, a pergunta por três vezes. “Parece que estou brigando com alguém, e isso é muito chato.”

Apesar do tempo curto, Luiza interrompeu a conversa logo às primeiras perguntas para retocar a maquiagem, com um batom vermelho escuro da linha Rebel, da marca americana MAC. “Uso esse porque dura muito. Não sai da boca”, justificou. Em seguida, aplicou um pó compacto da japonesa Shiseido. Fiel ao lema de que “varejo é povo, é contato com o público, simplicidade”, explicou: “Eu uso qualquer coisa. MAC, Shiseido, nacional… Boticário. Não tenho problema”.

Depois, aceitou falar de inadimplência apenas para reforçar que ela “é uma das mais baixas dos últimos anos” e voltou a interromper o diálogo para chamar o diretor financeiro do Magazine, Roberto Bellissimo, para que confirmasse a informação. O executivo disse que “a tendência tem sido de queda desde final de 2011”. Apesar de alguns dados, como os da Associação Comercial de São Paulo, apontarem alta nos primeiros meses do ano, para Bellissimo “a inadimplência de curto prazo no nosso balanço do fim do ano foi uma das menores da nossa história e inadimplência de curto prazo indica tendência”.

Temerosa de ser qualificada como otimista, Luiza procurou ponderar as declarações e fez questão de dizer que o momento do varejo reflete o público emergente, em que um novo consumidor corre atrás de objetos de desejo como máquinas de lavar e televisores de plasma. Ainda que não queira demonstrar, Luiza Trajano e seus pares do varejo têm razões de sobra para otimismo. As vendas continuam em alta. Só o programa Minha Casa Melhor, de cuja elaboração participou e do qual é defensora, tem potencial para injetar R$ 18,75 bilhões no varejo em três anos.

Criado para ajudar os beneficiários do Minha Casa Minha Vida a equipar e mobiliar a residência, o Minha Casa Melhor oferece R$ 5 mil para cada uma das 3,75 milhões de famílias contempladas pelo programa habitacional. Até o fim do ano passado, os beneficiários já haviam comprado o equivalente a R$ 1 bilhão no primeiro ano de validade do programa. O prazo de pagamento é de 48 meses e os juros, de 5% ao ano.

A sede do Magazine Luiza, concebida para ser “transparente”, é um grande vão central fechado por paredes de vidro, de onde se pode avistar qualquer pessoa trabalhando, inclusive a presidente, cuja porta permanece aberta o tempo todo. Inaugurada em 2010, a sede funciona no andar de cima de uma das lojas da rede e guarda algumas tradições. Os corredores são batizados com nomes das ruas de Franca, no interior paulista, berço do Magazine e da família Trajano. As raras paredes reproduzem fotos da sede original, já demolida, e a chamada Loja 1, que substitui a primeira, no centro de Franca. Um espaço central, denominado Praça Nossa Senhora da Conceição, a principal de Franca, reúne todos os funcionários às segundas-feiras, pontualmente às 10 horas, para cantar o Hino Nacional e o hino do Magazine.

Com três filhos – sendo um deles diretor de marketing da empresa – e quatro netos, Luiza é uma mulher de fé. Em sua sala, imagens de santos se misturam aos porta-retratos da família. Dezenas de miniaturas de elefantes, signo de prosperidade, ficam em um canto da mesa, de costas para a porta, como manda a tradição budista. “Eu ganho muita coisa. Não sou uma pessoa religiosa, mas tenho muita fé. Prefiro que você diga que sou uma pessoa espiritualista.”

 

Brasileiros – Muitos analistas e alguns representantes do comércio reclamaram de 2013, quando o crescimento das vendas foi o menor em dez anos. A senhora achou o resultado ruim?

Luiza Trajano Até acho que o varejo não reclamou muito, não. Lógico que 2013 não apresentou o crescimento que teve em 2011 e 2012, mas o varejo vive uma década muito boa. A indústria reclamou muito mais. O varejo teve um crescimento maior que o PIB e, em janeiro, fevereiro e março, as vendas continuaram crescendo. Estou falando das vendas do varejo. Não posso falar do Magazine porque estou na Bolsa. Mas para o varejo continuou sendo muito bom.

Brasileiros – O que explica esse bom desempenho?

L.T. A gente colocou para dentro da economia mais de 40 milhões de pessoas. A classe média hoje representa 51% da população brasileira. Dizem que vai representar 69% dentro de quatro, cinco, seis anos… As pessoas, na maioria das vezes, não têm bens, 54% das famílias não têm máquina de lavar. As pessoas começaram a ter casa própria há pouco tempo. O que move a economia de um país? É crédito, emprego e renda. Nós tivemos um aumento do emprego. Em 2002, tínhamos dez milhões de desempregados, terminamos o ano passado com 4,9 milhões. 

Brasileiros – A tendência, então, é melhorar ainda mais para o varejo?

L.T. É… Melhorar o mercado. O varejo acompanha. 

Brasileiros – A senhora disse que o que segura a economia são três fatores: crédito, emprego e renda. No Brasil, houve um encurtamento de crédito nos últimos anos…

L.T. Não, não houve. Houve um alongamento de crédito, depois inadimplência, movida muito pelo automóvel em 60 meses, sem entrada. Por isso, o prazo médio caiu para 30 meses. Todos nós, varejistas, vivemos de banco ou de cartão. O pequeno, o médio e o grande. Quando há inadimplência é assim. Não tem jeito. Eles apertam o crédito. Houve um período de 2013, principalmente no primeiro semestre, de aumento da inadimplência. Na medida em que o pessoal foi pagando as dívidas, todos os bancos foram reabrindo a oferta de crédito. O varejo está com o nível mais baixo de inadimplência dos últimos cinco anos. 

Brasileiros – A inadimplência, aliás, lhe rendeu uma polêmica em janeiro…

L.T. Mas eu não queria falar sobre isso. Por favor. Eu não quero me expor, dizer que eu ganhei, perdi, nada disso…

Brasileiros – Hoje, é possível vender a crédito como há dois anos?

L.T. Está voltando aos mesmos patamares. As pessoas também experimentaram o que é o poder do crédito. Dois anos atrás, elas usaram quatro, cinco cartões. De repente estão aprendendo a não gastar mais do que ganham. Estão aprendendo. Principalmente essa nova classe média. O que ela tem de muito sagrado é o crédito. Não quer perdê-lo. Ela viu que ficar muito endividada é ruim. São pessoas que nunca tiveram nada e, de repente, têm três, quatro cartões. A vontade de comprar é grande, porque 54% da população não têm máquina de lavar automática. Só 7% têm televisão de tela plana. Todo mundo tem direito a ter o que os outros têm. 

Brasileiros – A senhora considera que esse aprendizado está concluído?

L.T. Eu acho que aprendizado é para o resto da vida. Você sempre vai aprender, mas acho que no crédito as pessoas estão começando a aprender. Crédito não é responsabilidade só de quem toma. É também de quem dá. E quem dá sabe muito bem apertar quando as coisas não vão bem. O Brasil tem uma estrutura de tecnologia de credit score invejável. Eles conhecem a vida das pessoas, projetam quando vai ter inadimplência, sabem o que fazer quando não se realiza o primeiro pagamento. Os bancos têm uma engenharia técnica de aprovação de crédito impressionante. Projetam tudo. É toda uma equação muito desenvolvida. Acho até que tem hora que breca demais. É muito mais para o breque que para o acelerador. 

Brasileiros – Mesmo com esse aprendizado de gastar menos do que ganha, essa classe média continua tendendo a consumir?

L.T. Se você não tem uma coisa, você não gostaria de ter? Só 7% têm televisão de tela plana. Você não gostaria de ter uma casa própria, se não tivesse? É sagrado. Precisamos construir 23 milhões de unidades no programa Minha Casa Minha Vida em dez anos, para atingir um nível de igualdade social de países desenvolvidos. Ficamos muito tempo parados e com muita gente à margem da economia. Nesses últimos 20 anos, que a inflação começou a ser controlada, é que começamos a atender tudo isso.

Brasileiros – Se esses 40 milhões de brasileiros que ascenderam à classe média ainda não chegaram ao topo do consumo, qual é o caminho? Qual é a aspiração desse público e do cliente do Magazine Luiza?

L.T. Primeiro é ter a casa própria. A maior aspiração, se você fizer pesquisa, é a casa própria. Outra coisa é educar os filhos. Nunca a educação foi tão forte. Os pais não tiveram oportunidade e eles querem muito que os filhos estudem. Só depois vem os bens. Se você tem a casa própria, você quer ter televisão, máquina de lavar, geladeira nova, sofá novo, como todo mundo. 

Brasileiros – O programa Minha Casa Melhor…

L.T. Esse programa é um dos mais maravilhosos que já se criou. Esse novo consumidor que entrou no mercado não tinha histórico de crédito. Ele começou a ganhar agora, começou a comprar a crédito agora. Hoje, ele tem salário, renda. Acontece que os credit scores de banco só aprovam financiamento para quem tem histórico de compras. Essa nova classe média não tinha histórico, apesar de não ter nenhum problema de SPC e Serasa. Mas a cada cem clientes novos que entravam nas lojas do varejo no Nordeste, só dez eram aprovados. Não é que os 90 rejeitados fossem ruins, mas não tinham histórico de crédito. Aqui no Sudeste, só 17% são aprovados. Então, mais de 50% das pessoas no Nordeste e 40% no Sudeste ficavam sem comprar por falta de histórico de crédito. As pessoas recebiam o imóvel do Minha Casa Minha Vida e não tinham crédito para mobiliar. Juntos, indústria, varejo, defesa do consumidor e governo montaram o Minha Casa Melhor. O governo ofereceu R$ 5 mil por determinados produtos, que nós temos de respeitar. A gente também cedeu em preço. Ninguém achou ruim, nem os bancos. Estamos formando um novo consumidor. As únicas condições são estar em dia com o Minha Casa Minha Vida e não ter restrição de crédito.

Brasileiros – Os críticos dizem que é um programa paternalista, que promove o endividamento desse público.

L.T. Como é endividamento se ela tem R$ 5 mil para comprar em dois ou três anos, não precisa comprar de uma vez. Pode comprar um fogão agora, começar a pagar. Se comprar todo o limite de R$ 5 mil, paga cento e poucos reais por mês, só. O prazo é de 48 meses. Geralmente não se compra os R$ 5 mil. O beneficiado compra uma coisa agora e espera um pouco para comprar outra. As pessoas fazem essas críticas porque não analisam o programa direito. 

Brasileiros – Em geral, a população com menos recursos é mais fiel ao pagamento da dívida?

L.T. O nome deles é muito sagrado. Por isso ninguém quer comprar e não pagar. Ter o nome limpo é um patrimônio dessa nova classe média. Ela quer manter isso. 

Brasileiros – A senhora sempre foi otimista em relação a esses programas do governo…

L.T. Eu não sou otimista, sou realista. É muito fácil falar contra o Minha Casa Minha Vida e ter duas ou três casas. Tivemos uma escravidão muito séria, e as pessoas foram jogadas. Vinte anos depois da libertação dos escravos, elas não tinham casa, escola, comida. Eram analfabetas e não tinham trabalho. Foram jogadas na rua. A gente precisa entender que pessoas que vêm de uma família muito pobre não têm como adquirir casa própria se não tiver ajuda. Você pode ver quanto custa o aluguel de dois cômodos. No programa, as pessoas recebem uma casa com dignidade pagando R$ 90 por mês. Não é otimismo, é benefício social. Para melhorar a criminalidade, precisa ter igualdade social. E uma casa é sagrada. Qualquer um quer ter uma casa para morar.

Brasileiros – Qual o papel do varejo para ajudar o País a se desenvolver?

L.T. O varejo é o maior gerador de emprego do País depois do governo. Em 2013, 26% da mão de obra foi dada pelo varejo.

Brasileiros – A senhora já disse algumas vezes que o varejo brasileiro é ainda pequeno. Até onde ele pode chegar?

L.T. O que disse é que ele é como criança. Tem poucos anos. Faz pouco tempo que começou a se desenvolver. Algumas redes puderam crescer, mas o varejo brasileiro começou a se desenvolver depois que teve um mercado maior. Você vai a Heliópolis, tem dez mil pequenos empreendedores. Em Paraisópolis tem oito mil. Pizzaria, padaria, feirinha, cabeleireira, lavanderia. Tudo de empreendedores de lá. Porque teve consumo. Se antigamente, o Magazine Luiza abria uma loja em uma cidade, para 50 vagas, duas mil pessoas ficavam semanas na fila. Hoje, aparecem umas cem, 120. Acabou, porque metade dos desempregados entrou na economia. Estamos no pleno emprego.

Brasileiros – A senhora sente falta de mão de obra?

L.T. Não. Não estou sentindo falta. Mas já não ficam duas mil pessoas na fila para 50 vagas. Hoje sai gente do emprego para vir para o Magazine, mas não gente desempregada. O emprego aumentou. Automaticamente, as pessoas têm mais opção. Elas não estão mais necessitadas de um emprego a qualquer custo. Então, quando chega uma empresa que oferece mais, elas podem se dar o direito de mudar. Não é otimismo. É realismo. Digo que nós temos muito tributo. O custo Brasil é elevado, nós temos 1,5% só de custo para administrar a burocracia do País, mas tenho de mostrar o lado positivo.

Brasileiros – E mão de obra qualificada para o varejo? Existe?   

L.T. Nunca me preocupei com isso, porque o Magazine Luiza adora formar pessoas. Temos treinamento, parceria com faculdade. Damos bolsa de estudo para qualquer matéria há mais de 15 anos, de 30% a 70%. Temos diretores aqui que começaram como office-boy, temos gerente que começou como pequeno aprendiz. 

Brasileiros – Houve uma época em que varejo e indústria brasileira não se entendiam muito bem. Havia uma disputa, uma queda de braço para ver quem tinha mais poder…

L.T. Acho que isso já é passado. Em 1995, criei uma carta de intenção, em que a gente tinha de ganhar junto, e o consumidor também. Detesto essa relação, porque todos saem perdendo. O mercado passou a ser competitivo. A tecnologia trouxe tanta informação ao consumidor que ou você se une para que todos saiam ganhando ou todos vão perder. É uma questão de necessidade. Qualquer consumidor pelo telefone sabe o preço de qualquer coisa. 

Brasileiros – Então, a crítica se faz da desindustrialização do Brasil…

L.T. Eu acho que tem indústrias que sofrem muito, mesmo. Outras não. Mas a indústria que depende de concorrência da China e com impostos está sofrendo. Tem indústria com custos muito altos, os investimentos são complicados. Ainda há muito a fazer, mas é um País com potencial. 

Brasileiros – É possível uma parceria do varejo com a indústria para enfrentar também esses problemas?

L.T. Possível é, lógico. Mas não sei se é necessário. Eu vejo que é necessário ter uma ligação entre indústria e varejo para que a gente possa trabalhar melhor a competição e fazer melhor para a cadeia toda: quem fabrica, quem transporta, quem distribui, quem vende e o consumidor. 

Brasileiros – A senhora tem uma série de atividades: cuida do seu negócio, participa do Conselho de Desenvolvimento, dá palestras…

L.T. Estou no Comitê Olímpico… 

Brasileiros E está no Comitê Olímpico. Como consegue conciliar todas essas atividades no seu dia a dia?

L.T. Você vai ficando mais experiente. As coisas são mais fáceis. Você vai aprendendo todos os dias. E, por outro lado, sou descentralizadora… 

Brasileiros – A senhora gosta de delegar?

L.T. Muito. Apesar de que ninguém acha, pelo meu jeito de ser. Acredito nisso. Não quero que as pessoas sejam como eu, mas acredito que quando elas entendem, fazem o que precisa ser feito.

Brasileiros – O que a senhora busca com sua participação nesses órgãos e conselhos oficiais?

L.T. Tenho uma visão muito clara de contribuir com meu País. O Brasil não é só dos políticos, é nosso. Se uma coisa é sua, você precisa ajudar, não só criticar. A minha postura é de estar junto, de falar o que sinto, de elogiar quando precisa e de ajudar a construir.

Brasileiros – São mais de 700 lojas pelo País e o e-commerce, tudo integrado. O Magazine foi, no começo, a única rede que não trocou a razão social quando abriu o e-commerce. Por quê?

L.T. – Meu filho (Frederico Trajano, diretor de Marketing) que toma conta dessa parte, e o Marcelo Silva, que é o nosso CEO, e eu também, acreditamos muito nisso, porque, tendo um CNPJ só a gente tem facilidade de distribuir a partir de vários centros. O cliente se torna um. Mas isso não tem verdade. Cada um precisa fazer o que acredita e ponto. O Magazine Luiza começou a vender pela televisão, em 1991, através da loja eletrônica. Nós temos uma cultura de vender por tecnologia que não é de hoje. A gente nem sabia que ia aparecer a internet, mas já tinha uma proposta multicanal. 

Brasileiros O crescimento desses outros canais não assusta?

L.T. Não. A gente acredita que o cliente vai ser único e que você vai ter de atendê-lo ou por loja de rua, ou por telefone ou por internet. O desafio do varejo é como tratar esse consumidor, em qualquer segmento. 

Brasileiros – Um número tão grande de lojas faz sentido diante de tantos canais de venda?

L.T. Concordo com você que nos últimos três anos se discutia muito o que seria das lojas físicas. Hoje, discute-se qual o formato das lojas físicas. As pessoas compram na internet, mas gostam de ter contato com o produto. Então, fala-se muito em as lojas físicas se transformarem mais em um local para contato. Das pessoas que compram pela internet, 57% vão a uma loja física antes.

Brasileiros – A senhora tem alguma ideia ou algum projeto para mudar as lojas do Magazine pensando nisso?

L.T. Já estamos fazendo algumas experiências… Inauguramos nossa primeira loja virtual em São Paulo, que é a loja eletrônica, em Heliópolis. Esta semana completamos o primeiro ano da Escolinha Walita, para dar cursos para as mulheres, porque toda loja nossa tem um centro de promoção onde as mulheres dão curso, tem curso de vinho, curso de tudo. Temos essa cultura de levar o entretenimento e a educação para dentro da loja. 

Brasileiros – O foco é a mulher?

L.T. Não. Meu foco é o consumidor. Dos consumidores, a maioria hoje, quem decide hoje é a mulher. Não é porque sou mulher. Eu defendo as mulheres em outras coisas…

Brasileiros – Quais?

L.T. Eu sou a favor de quota para mulheres em conselhos, que hoje só temos 7%. Não por mim, porque não preciso de quota para estar em conselho, mas pelas minhas colegas que vão fazendo 55, 60 anos e não vão estar em conselho. Sou a favor do consumidor. Tenho uma linha direta com o consumidor. Ele reclama: “Você me chamou pra ser feliz e eu não sou”. Tanto faz homem como mulher. Por que o foco hoje está voltado para elas? Porque a mulher hoje está decidindo até o carro que a família vai comprar. 

Brasileiros – O diálogo com o consumidor é constante?

L.T. Se você entrar no nosso site, vai ver o e-mail do SAC. Se ele não te atender, tem meu e-mail. 

Brasileiros – Qual é o volume de reclamações?

L.T. As pessoas têm um respeito muito grande a quem se abre. Elas só me mandam mensagem quando não há solução para o problema delas em outro lugar. Quando começo a receber muita reclamação, é sinal de que a coisa na empresa não está boa. É um termômetro. Devo receber dez ou 12 reclamações por dia, e 99,9% são de pessoas que já tentaram ou a loja ou o SAC ou o Reclame Aqui e não conseguiram. 

Brasileiros – A arquitetura da sede do Magazine permite que todos se vejam e facilita o acesso entre as pessoas. Isso é uma filosofia de vida?

L.T. Mesmo em Franca, a primeira porta que você vê, sempre aberta, é a minha. E isso há mais de 20 anos. O varejo é muito simples, você não pode ficar complicando, com sala fechada. Varejo é termômetro, é povo, é público. Não pode mudar. Fui criada assim, minha tia é assim, minha família é assim. Varejo é dia a dia, é vender, é estar com o cliente. 

Brasileiros – Essa pulsação vai se alterar de alguma maneira com essa série de grandes eventos no Brasil, como Copa do Mundo. Isso traz alguma mudança para o varejo?

L.T. O turismo, a construção civil e o varejo são os setores que mais geram o primeiro emprego, principalmente para as pessoas que não têm escolaridade e não tiveram acesso a isso. O Brasil recebe seis milhões de turistas por ano. A França recebe 60 milhões. Fui à África, porque teve uma Copa do Mundo. Fui convidada pela Cielo. Hoje, tenho muita vontade de levar meus netos à África. Jamais teria ido se não tivesse sido convidada. Assim é uma Copa do Mundo. Sou do conselho diretor do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos. Não tenho nada a ver com esporte, mas a montagem, o alojamento, o transporte, tudo que se pensar é feito pelo Comitê. Faz um ano e meio que estou lá. Tudo que a gente fizer é que vai levar o nome do Brasil. É uma coisa muito grande. Eu não quero entrar em custo de estádio, nada disso. Estou no evento. E o evento traz turismo. A Inglaterra mostrou que, depois da Olimpíada, aumentou em 20% ou 30% o número de turistas, depois dos jogos. Isso é muito importante. O turismo gera emprego. No Brasil, então, é aquele primeiro emprego: garçom, camareira. 

Brasileiros – Qual sua expectativa para o varejo neste ano e nos próximos?

L.T. Os próximos anos dependem muito de taxa de juros, de custo Brasil. Não gosto muito de previsões, mas este semestre vai ser muito melhor que o semestre passado, que foi muito ruim.  Pela Copa do Mundo, vai ser muito melhor. E o segundo vai ter um crescimento menor. 

Brasileiros – Pela eleição?

L.T. Não é nem pela eleição, mas porque já teve um desenvolvimento melhor no primeiro semestre, termina a Copa e dá uma desaquecida.  


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