De casa de detenção à biblioteca da cidade

FevereiroEm fevereiro, a cidade de São Paulo ganhou um espaço cultural maravilhoso. Em local simbólico, a antiga Casa de Detenção, a Biblioteca de São Paulo abriu as portas e já se firmou como polo de cultura na capital paulista. Se você ainda não foi, vá!


O ano é eleitoral, de entrega de obras empacadas, de melhoras e avanços pra cidade, de “presentes” e modernizações. A ideia é tudo ficar pronto a tempo de arrecadar votos, mas isso já é coisa sabida. Durante toda a manhã e o início da tarde de segunda-feira (8), houve a cerimônia solene, para poucos convidados e imprensa, com direito a comes e bebes finos e show de Tulipa Ruiz, seu irmão Gustavo e seu pai, Luiz Chagas, ex-integrante do Isca de Polícia de Itamar Assumpção, para celebrar a entrega da mais moderna biblioteca do Brasil. O governador do Estado de São Paulo, José Serra, e o secretário da Cultura, João Sayad, compareceram ao lado de outras autoridades e abriram oficialmente a Biblioteca de São Paulo, que ocupa agora o lugar da antiga Casa de Detenção de São Paulo.Popularmente conhecida como a tenebrosa cadeia do Carandiru, ficou famosa por suas polêmicas rebeliões e o histórico massacre dos 111 presos, número até hoje questionado pelos presentes no dia 2 de outubro de 1992. Dizem ser mais de 250 os mortos. A chacina virou até rap: Diário de um detento, dos Racionais Mc’s, e também está na letra de Haiti, de Caetano Veloso e Gilberto Gil. Contudo, por mais incrível que possa parecer, antes de ser instaurado o caos no local que por algumas décadas viveu apenas histórias de rebeliões, assassinatos, péssimas administrações e superlotação, a Casa de Detenção, erguida na década de 1920, na Zona Norte de São Paulo, já foi considerada um presídio modelo, ilustrando até cartões-postais da cidade.Por duas décadas, de 1920 a 1940, o presídio, então chamado Instituto de Regeneração, foi padrão de excelência nas Américas, atraindo a visita de inúmeros políticos, estudantes de direito, autoridades jurídicas e até mesmo personalidades, como o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss.Os problemas começaram na década de 1940, quando a penitenciária excedeu sua lotação máxima de 1.200 detentos. Ainda assim, em 1956, em uma das várias tentativas de resolver a superlotação, foi construído um novo prédio, que elevou a capacidade para 3.250 detentos. O que, certamente, não amenizou a situação, já que o cenário só piorou, com crises e rebeliões. O fundo do poço aconteceu no massacre de 1992, quando o complexo já não comportava mais os 8 mil presos amontoados.Dez anos depois, em 2002, iniciou-se o processo de desativação do Carandiru, com a transferência de presos para outras unidades. Hoje, o presídio já está totalmente desativado e deu lugar ao Parque da Juventude. Parte das ruínas da antiga casa de detenção foi mantida para visitação. Além disso, o parque abriga um complexo esportivo e recreativo, duas escolas técnicas e, agora, a Biblioteca de São Paulo.A Biblioteca, que passa a funcionar a partir de hoje para os habitantes de São Paulo e, principalmente, para os da Zona Norte, ocupa uma área de 4.257 m2, dentro do Parque da Juventude, ao lado da saída do metrô Carandiru. Com um projeto arrojado, iluminado e moderno, ela inaugura no Brasil um conceito inovador de bibliotecas, inspirada nas de Santiago e Bogotá. O espaço se assemelha muito ao ambiente das livrarias megastore, pois, segundo o secretário de Cultura, João Sayad, descobriu-se que o povo estava lendo mais dentro das modernas livrarias do que nas austeras e antigas bibliotecas. Dessa forma, foi pensado também o seu acervo, que não foca os clássicos, mas sim os mais vendidos nas lojas, seguindo a ordem ditada pelo consumo no mercado, mas sem se esquecer de obras obrigatórias, como Machado de Assis e Fernando Pessoa. O acervo, por enquanto, conta com 30 mil exemplares, incluindo livros, CDs e DVDs, além de periódicos e jogos. “O nosso acervo é pequeno por dois motivos: um por ser uma biblioteca nova, outro, por esperarmos que ele seja construído segundo a demanda do público. Não queremos ditar nada, ensinar ninguém o que deve ser lido e o que não deve. Se o público procurar best-seller, vamos ter mais best-seller. Se forem livros didáticos, assim será o nosso acervo”, justifica Sayad.A biblioteca é moderna não só por fora, mas também por dentro. Conta com tecnologia avançada, embora restrita. São 100 computadores novos, com acesso a internet, telas widescreen e recursos multimídia, além de rede sem fio em todo o parque. Houve investimento também na tecnologia de ponta, com 7 Kindles (o livro eletrônico da Amazon) e 6 mesas adaptáveis para leitura de deficientes visuais. Todos os serviços são gratuitos para os associados da biblioteca.O público será atraído também pelas atividades culturais que ocorrerão diariamente em seus mais diversos ambientes. Na tenda externa, acontecerão desde Bailes da Terceira Idade, até oficinas de grafite, contadores de histórias para criança na sessão infantil, saraus literários na varanda superior, domingos musicais, com shows diversos e até debates e ciclos de cinema no auditório, com capacidade para 89 pessoas.A Biblioteca de São Paulo será administrada em todos os seus espaços pela Organização Social Poiesis, a mesma que gere a Casa das Rosas, o Museu da Língua Portuguesa, entre outras, e funcionará em horário mais flexível que o comercial, exatamente para atrair um número maior de pessoas.

Biblioteca de São Paulo
Onde: Parque da Juventude
Avenida Cruzeiro do Sul, 2630 – Santana – São Paulo – SP – ao lado da saída do metro Carandiru – linha azul
Funcionamento: de terça a sexta das 9 às 21 horas
Sábados, domingos e feriados das 9 às 19 horas
Site: www.bibliotecadesaopaulo.com.br
Rebelião cultural


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.