A paraense Fafá de Belém é uma das cantoras mais populares e longevas da música brasileira. Neste ano, ela comemora 35 anos de carreira de muito sucesso ininterrupto, com algumas crises, como nos revela nessa entrevista exclusiva. Em uma dessas crises, Fafá perdeu a voz e foi para Portugal, em 1997, para ver que direção sua carreira deveria seguir. Não se arrependeu e hoje se diz muito grata com Portugal por tê-la abraçado carinhosamente em um dos momentos mais difíceis dessa trajetória.
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O ano de 2011 será de comemorações e se inicia a partir desta noite, com três shows no Auditório Ibirapuera (ver serviço no final da matéria). As músicas que ela cantará serão exatamente do DVD que gravou recentemente. Fafá receberá convidados, como a sua filha, a também cantora Mariana Belém. No repertório, as várias músicas e gêneros que a fizeram tão popular e amada pelo público, mas criticada pelos ditos especialistas.

“Foi uma carreira com muitos desvios, mas com muita sinceridade”, diz, antes de começar a entrevista. Ela conta do início, em 1975, com a música Filho da Bahia (Walter Queiroz), que gravou para a trilha sonora da novela Gabriela, da Rede Globo, da importância de Roberto Santana na sua carreira e da vontade de trabalhar com ele novamente, apesar de Santana, segundo ela, ser uma pessoa muito difícil de negociar. Fafá reconhece que sua trajetória sempre esteve atrelada à Rede Globo, e não entende por que há muito tempo não grava para as trilhas sonoras de novelas, já que, entre outras coisas, é recordista de clipes para o Fantástico.

Com vocês, um pouco da Fafá de Belém e sua irrepreensível gargalhada, que ecoou pelos quatro cantos do restaurante durante a nossa entrevista.

Brasileiros – Como começou sua carreira?
Fafá de Belém –
Em 1973, Roberto Santana, um baiano porreta, me conheceu em Belém do Pará, onde nasci. Eu tinha 16 anos na época. Ele foi para minha cidade atrás de um compositor, mas também como olheiro da (gravadora) Philips. Foi Roberto quem lançou Quinteto Violado, Elba Ramalho, entre outros. Ele é um pesquisador e um cara genial. Hoje, é também pai do Lucas Santana! Um temperamento difícil, mas uma pessoa a quem devo muito da minha carreira. Muito duro, muito rigoroso, inegociável, horrível. Chorava, chorava, chorava (risos). Roberto, nessa época, era empresário do Vinicius de Moraes e do Toquinho. Ele estava em Belém do Pará procurando um compositor, que não me lembro se era o Paulo André ou o Milton Chaves. Tinha um grupo de músicos que se reunia todo final de tarde no bar chamando Tonga, de Avelino do Vale. Esse grupo ficava até oito horas da noite tocando violão, antes que o bar abrisse para o jantar. Roberto foi lá e me viu cantar nessa roda. Estava cantando Vapor Barato. Ele me convidou para gravar e eu disse que não. Ele disse que tinha achado minha voz bonita, e eu disse que já sabia, no alto da minha arrogância juvenil. Estava usando um cocar vermelho de pena, meu saião largado e meu casaco de general (risos). Eu pensei comigo: “Esse cara está querendo outra coisa”. Eu olhei para ele, depois de muita insistência, e disse para ele procurar meu pai. Saímos de lá antes de o bar abrir, pois eu era menor. Quando cheguei em casa naquela noite, Roberto estava conversando com meu pai. Durante os dois anos seguintes, ele ficou trocando cartas comigo e com meu pai sobre a possibilidade de eu começar uma carreira de cantora. No início de 1975, fui de férias para o Rio. Depois de um tempo, acabou a grana e eu precisava voltar para casa, mas não queria pedir dinheiro ao meu pai. Recebi um convite para cantar em um show como backing vocal, mas tinha de ter uma autorização dos meus pais, e fui pedir à minha mãe, dona Eneida, que fez escondida do papai. Só que meu pai foi ao Rio de Janeiro a trabalho e ficou sabendo do show. Era a primeira vez que ia subir em um palco como profissional.

Brasileiros – E o que aconteceu?
F.B. –
Ele, que era advogado, foi lá a trabalho e alguém contou sobre o show. Ele foi para o show, e não gostou, mas eu cantei assim mesmo. No final, ele me procurou e disse que aquilo tinha sido obra da minha mãe, coisa da Eneida. Eu prometi para ele que ia voltar para nossa cidade para as Bodas de Prata deles. Voltei para Belém e aproveitei para fazer um curso de teatro. Nessa época, o Roberto Santana me chamou para substituir a cantora Elba Ramalho nas apresentações do grupo Quinteto Violado. Eu disse: “Não. Quando eu estrear, vai ser sozinha, caso decida ir para o Rio de Janeiro”. Tinha minha vida em Belém e não pensava em sair de lá.

Brasileiros – Nessa época, você ainda estudava?
F.B. –
Estudava. Pensava em ter uma profissão que eu pudesse levar para o mundo. Aí, o cantor Sérgio Ricardo, que estava em Belém do Pará, me viu cantar e disse que cantava muito bem. Eu disse: “Ai, meu Deus, mais um para dar em cima de mim!”. Nessa ocasião, tinha um empresário que disse que pagava as despesas do hotel, naquela época o máximo do patrocínio, se eu aceitasse o convite do Sérgio Ricardo. Demos o show, eu e Sérgio, e depois ele foi embora de Belém. O Roberto Santana voltou a investir no convite para eu cantar, dizendo que já tinha um espetáculo pronto. Um ano antes, ele tinha feito uma temporada de verão com o Caetano Veloso e Gilberto Gil, que virou um disco emblemático. Roberto queria fazer de novo essa temporada com gente nova e um cantor tradicional, que era o Sérgio Ricardo. Seria, então, eu, Sérgio Ricardo e Walter Queiroz. Vai, não vai, vai, não vai, acabou que fui para a Bahia passar duas semanas e que viraram três meses. Foi aí que a cantora Maria Creuza, que ia gravar a música Filho da Bahia para a trilha sonora da novela Gabriela, da Rede Globo, teve uma crise renal e não pôde gravar. O Roberto Santana disse que tinha uma cantora: eu. O pessoal da Globo do Rio de Janeiro me mandou buscar na Bahia para gravar a música. A partir daí, eu conto o início da minha carreira, os 35 anos.

Brasileiros – Tanto o Roberto Santana como o Sérgio Ricardo gostaram da sua voz e do seu talento. Por que você desconfiou dos dois, no sentido de achar que eles queriam lhe paquerar?
F.B. –
Desconfiar não, porque eles queriam me pegar mesmo! (Fafá solta a sua já conhecida gargalhada)

Brasileiros – Eles poderiam querer isso também, mas sabiam do seu talento para cantar…
F.B. –
Eles sabiam do meu talento, mas queriam um pouquinho mais do que meu talento. Eu disse: “Peraí rapazes, eu sou uma menina ainda e vocês não fazem meu tipo” (gargalhadas).

Brasileiros – Roberto Santana foi muito importante na sua carreira…
F.B. –
Roberto Santana foi a pessoa mais importante da minha trajetória artística e continuará sendo.

Brasileiros – Como é o convívio de vocês hoje?
F.B. –
De vez em quando, nos falamos. Em um dia desses, ele me telefonou muito emocionado para falar sobre ele, porque é muito polêmico, tem muita personalidade. Me ensinou a ser profissional, ensinou a ter norte, entendeu? Eu devo muito a ele. Ensinou a não desistir, a não fazer graça. Ele foi e é, como eu falei anteriormente, muito importante na minha carreira. Sonho um dia em voltar a trabalhar com Roberto.

Brasileiros – Fazendo a pesquisa para essa entrevista, vi que foram poucos os anos em que você não gravou um disco, um CD. Os hiatos são de um, no máximo dois anos…
F.B. –
Exatamente, querido. Não suporto essa obrigação de você ter de ter talento uma vez por ano para gravar um disco. Acho uma coisa horrível.

Brasileiros – Durante esses 35 anos de carreira, houve muitas crises?
F.B. –
Claro que tiveram. Uma dessas crises foi quando eu fui para Portugal. Foi uma trajetória muito pertinente. Nessa fase da minha carreira eu pensei: “O que é que eu estou fazendo?”. Não fui embora para Portugal depois da crise, cheguei lá em plena crise, que foi violentíssima e o país me abraçou.

Brasileiros – Isso foi no ano de 1997?
F.B. –
Foi. No mesmo ano em que perdi meu pai, Seu Fefê, como carinhosamente o chamávamos em casa. Fui ficando, ficando. Naquele momento, o negócio da música não era nem peixe, nem gato. Não era nem pau, nem cacete. Eu sempre tive liberdade de ir e vir. Sempre fui muito rebelde. Isso tem um custo, como sabemos. Lembro que, em 1995, gravei a música Tô P… da Vida (que fez sucesso primeiramente com o grupo juvenil, Polegar) e quase me crucificaram (começa a cantarolar um trecho da música). Realmente, eu estava P… da vida nessa época, 1995 foi um ano muito difícil para minha vida particular e profissional. Um dia, cheguei em casa e pensei comigo: “Eu quero realmente trabalhar de segunda a segunda e mal ter tempo de ver minha filha? O que isso está me dando? Não vou querer mais isso!”. Foi quando me retirei completamente e perdi a voz. Isso eu deixo para contar em uma entrevista maior, porque a história é longa. Sei que, pela primeira vez na minha vida, eu tinha perdido a voz.

Brasileiros – Sua carreira sempre esteve atrelada à Rede Globo: começou de fato em 1975, quando você grava Filho da Bahia para a trilha da novela Gabriela, passando pelos vários clipes que fez para o Fantástico, além das outras músicas que entraram em trilhas de outras novelas…
F.B. –
Eu sou um fruto da Rede Globo. E fico às vezes sem entender por que há tantos anos não faço parte das trilhas sonoras das novelas. Eu nasci como cantora na trilha sonora da novela Gabriela. Sou recordista de apresentações de clipes para o Fantástico. Não sei o que aconteceu, mas vamos “recosturar” isso. Uma novela como Araguaia não ter uma música minha não dá para entender. Tenho, inclusive, uma música com o nome da novela. Hoje são outros conceitos, outras formas de negócio, trabalhar de uma forma diferente. Às vezes, fico triste com isso, mas bola para frente (Fafá finaliza com uma extensa gargalhada, que toma conta do restaurante nos Jardins, em São Paulo, onde foi realizada a entrevista).

SHOW FAFÁ DE BELÉM
Quando: dias 14, 15 e 16 de janeiro
Horário: Sexta e sábado, às 21h. Domingo, às 19h
Onde: Auditório Ibirapuera
Avenida Pedro Álvares Cabral, s/nº – Parque do Ibirapuera, portão 2 – São Paulo (SP)
Ingressos: R$ 30,00 e R$ 15,00 (meia-entrada)
Telefones: (11) 3629-1014 / (11) 3629-1075
Informações: info@auditorioibirapuera.com.br


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