A greve dos juízes e o exemplo de Rogério Ceni

EM TEMPO (14H55): MORREU, AOS 79 ANOS, MEU AMIGO JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA, EX-VICE PRESIDENTE DA REPÚBLICA, UM DOS MELHORES BRASILEIROS QUE CONHECI NA VIDA. VAI NOS FAZER MUITA FALTA.

“Dá para falar algo sobre esta greve escandalosa, Kotscho?”, pergunta o leitor Fabio de Oliveira Ribeiro em mensagem ao Balaio enviada às 10h20 desta terça-feira.

Falar o quê, caro leitor, diante da ameaça das excelências de parar o Judiciário, se não lhes for concedido um aumento de 14,79%, o que elevaria o atual salário dos ministros do STF de R$ 26,7 mil para R$ 30,6 mil (base da remuneração dos juízes que é escalonada a partir deste teto) num país onde o salário mínimo foi recentemente reajustado para R$ 545,00?

Na verdade, desde ontem eu estava querendo escrever sobre os 100 gols de Rogério Ceni, um sujeito que, na contra-mão do oba-oba e do vale tudo no Brasil do BBB e da marquetagem, prova aos mais jovens que ainda vale a pena ser honesto, trabalhar muito para alcançar seus objetivos e vestir de verdade a camisa de quem lhe paga o salário.

São dois exemplos oferecidos em extremos opostos da grande geléia nacional – o da inacreditável greve dos juízes e o da dedicação fora do comum do goleiro são-paulino ao seu oficio.

E o que tem uma coisa a ver com outra?, poderão perguntar os leitores que já perderam as esperanças de viver num país mais justo e mais decente sem ter que sair do Brasil.

Pois tem tudo a ver. Sou dos que ainda acreditam na educação pelo exemplo daquilo que se pode e daquilo que não se deve fazer na vida. Goleiro não precisa ser artilheiro, pode tomar seus frangos, mas juíz tem a obrigação de dar o exemplo pela posição que ocupa e pela instituição que representa.

Seria mais lógico esperar que o bom exemplo viesse dos nobres membros do Judiciário, um dos três pilares da República, que deram um ultimato ao Congresso Nacional: até o dia 27 de abril, ou sai o aumento ou eles cruzam os braços.

Como vivemos no Brasil, o bom exemplo vem do futebol, de um atleta que certamente ganha várias vezes mais do que os juízes que ameaçam entrar em greve. Claro que não dá para comparar o salário mínimo de um operário, com os proventos de um juiz e a fortuna paga a um jogador de futebol consagrado.

Não me refiro neste caso a valores financeiros, mas a valores morais. Rogério Ceni é sempre o primeiro a entrar em campo para os treinamentos do São Paulo e o último a sair, não faz média com a mídia, não joga a torcida contra a diretoria, assume suas falhas, que não foram poucas, estimula os mais jovens, nunca ameaçou deixar de jogar para receber aumento salarial.

Por isso mesmo, foi poucas vezes chamado para a seleção brasileira e não é considerado um campeão de simpatia pelos colegas de imprensa. Tem opiniões próprias, costuma brigar por elas, o que o leva faz muitos anos a ser respeitado e idolatrado pelos torcedores.

De acordo com o relato de Mariângela Gallucci, do Estadão, não é a primeira vez que a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) recorre ao Supremo Tribunal Federal para conseguir um aumento. O mesmo aconteceu em 2000, quando o STF concedeu auxílio-moradia aos juízes, o que, na prática, representou aumento de salário e evitou a greve.

Agora, a Ajufe defende que o próprio Supremo conceda o aumento “diante da omissão do Congresso”. A briga promete ser boa e longa. O projeto de reajuste salarial do Judiciário ainda nem está na pauta do Congresso.

Chova ou faça sol, Rogério Ceni mais uma vez estará em campo nos próximos dias com a camisa tricolor – contra o Santa Cruz, amanhã, no Recife, e o Mirassol, domingo, em Barueri.

Viva o cidadão Rogério Ceni! Que os jovens servidores do Judiciário se mirem neste exemplo.


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