Nas quebradas do Capão

A “parada” não foi fácil para Caio Blat, protagonista do filme Bróder, que estreia nesta quinta-feira (21) nos cinemas. “Por ser branco, tive essa ‘responsa’ de ser mais preto que os pretos”, afirma o ator, usando uma linguagem próxima a de seu personagem. Desafio, ou grande sacada, o fato é que o diretor Jeferson De colocou um branco no papel principal de um filme que fala de uma região onde a maioria é negra. “Foi o melhor discurso sobre igualdade racial que ele poderia ter criado, mesmo sem colocar nenhuma palavra sobre o assunto na fala dos personagens”, defende Caio Blat.
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Apesar de filmado em uma das regiões mais violentas da periferia de São Paulo, o filme fala essencialmente de amizade. Não qualquer amizade, mas do laço puro e forte que atinge o grau da mais genuína irmandade. Bróder conta a história desses manos da periferia. Não de qualquer periferia, mas do Capão Redondo, no Campo Limpo, a 23 km do centro da capital paulista. E a localização, neste caso, não é mero cenário.

O enredo, pouco complexo, engana. Um dia na vida de três amigos que se conhecem desde a infância. Mas não se trata de um dia qualquer, é o aniversário de Macu, personagem vivido por Caio Blat. A festa de aniversário, organizada pela mãe, papel defendido pela competente Cássia Kiss, chega ao mesmo instante em que o jovem dá seus primeiros passos no crime.

E pra completar a agenda de Macu, tem o encontro com os manos das antigas – um universo à parte. Um deles é Jaiminho, que se deu bem na Espanha jogando futebol. De volta ao País, às vésperas de ser convocado para defender a seleção brasileira na Copa do Mundo, o cara aparece cheio de dólares e com um baita carrão, como se fosse a coisa mais comum do mundo. O outro amigo também já não mora na região, virou vendedor de seguros, mas permanece tão ou mais duro do que antes. Para completar o drama, casamento em crise, filho pequeno e luz cortada em casa.

Enfim, são 24 horas nas quebradas do Capão. Tempo mais do que suficiente para o desenlace de uma trama nada singela. “É uma história simples, mas profunda”, admite Jeferson De.

O drama de Macu envolve sua primeira missão no crime, ocultar uma criança sequestrada. Quando seu mano, estrela do futebol espanhol, aparece em cena, se torna imediatamente alvo dos criminosos. É então que o jogo vira. O ápice do filme é justamente nesse ponto, quando os limites da amizade são colocados em cheque. “Vou trair ou não o meu amigo?”, observa Jeferson.

Assim como seu personagem, Caio Blat teve de sapatear para driblar o cerco que se formou ao seu redor tão logo pisou no bairro. Os questionamentos e exigências da comunidade do Capão não foram poucos: “O que vocês querem filmar aqui? A miséria? A polícia entrando? Isso a gente não admite. No final, perguntaram quem representaria ‘os moleques’ do bairro”. Todos os dedos presentes apontaram para Caio Blat.

A forte cobrança, segundo Blat, está ligada à força do bairro. “São décadas de muita perda, muita luta, toda família do Capão tem um garoto problema como Macu, alguém preso, ou que está no crime”. O ator, que passou alguns meses morando no bairro para as filmagens, diz que a tensão está o tempo todo no ar. “O clima às vezes fica tão denso que dá a impressão de que o ar poderia ser fatiado”, define, com precisão.

Vik Muniz é um Bróder


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