Itamar Assumpção no cinema e de graça

Estreia nesta sexta-feira 8, em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Salvador e Santos, o tão esperado filme sobre Itamar Assumpção. Daquele Instante em Diante é um documentário inédito sobre Itamar Assumpção, dirigido por Rogério Velloso, filme que abre a série Iconoclássicos inspirados na vida ou na obra de cinco artistas brasileiros. O projeto do Itaú Cultural apresentará até o final do ano Ex Isto, de Cao Guimarães, baseado no romance Catatau de Paulo Leminski – o único exibido anteriormente – Assim é se lhe parece, sobre o artista plástico Nelson Leirner dirigido por Carla Gallo, Evoé, de Tadeu Jungle e Eliane César sobre José Celso Martinez Correia, e Mr. Sganzerla – Os Signos da Luz, dirigido por Joel Pizzini sobre o também cineasta Rogério Sganzerla. Cada filme será exibido durante um mês, em sessões diárias gratuitas nos cinemas da rede. Em 2012, serão liberados para outras salas em outras cidades e, em seguida, reunidos em um box para venda.

O título do filme de Itamar é tirado de sua música Por que que eu não pensei nisto antes? (” Pensei seduzir você daquele instante em diante…”) e inaugura mais uma ala no palácio de prazeres legado pelo artista – antecedido por Pretobrás – songbook, partituras, biografias e ensaios em dois volumes, e Caixa Preta, box com a discografia completa, além de dois CDs com canções inéditas. De fato, do instante em que o filme se inicia, Velloso vai pouco a pouco seduzindo o público. Sem malabarismos. O documentário contém os ingredientes usuais, depoimentos e imagens de arquivo exibidos em ordem cronológica. O diferencial fica por conta do assunto- Itamar, rico e controverso e, principalmente, do olhar do diretor.

Premiado nacional e internacionalmente, Rogério levou três anos para reunir e produzir material e mais de um trimestre montando a cornucópia de informações. Como amigo e colaborador do focalizado eu falo sobre o assunto de cadeira – como no filme, onde apareço sentado. Itamar era uma metralhadora giratória, inesgotável e ambulante em termos de criação e opinião. Consequentemente, as pessoas a sua volta se sentiam próximas sem se dar conta do tamanho da encrenca. A justaposição dos depoimentos aliada às intervenções sempre bombásticas de Itamar, em vez de resolverem as questões colocadas, abrem áreas de discussão. Explico. : se o assunto é “por que Itamar não fez sucesso?”, as respostas principiam citando sua intransigência e, de repente, passam a tratar da inadequação do mercado para com os verdadeiros artistas e acabam por sugerir o contrário. Ele “fez sucesso”. E o próprio aparece afirmando isso.

Enquanto exibe imagens e define em depoimentos a trajetória de Itamar, de ‘gênio explosivo” a “maldito”, mas guardando a intenção de virar “clássico”, de artífice arranjador a cancionista, mas sem deixar de ser intérprete, intempestivo, boca dura, provocador e ao mesmo tempo caseiro, pai de família e orquidófilo, Velloso não perde o entrevistado de vista. Ora é a poeta Alice Ruiz que não encontra um caderno com poesias dos dois, a filha de Itamar, Anelis, fritando uma linguicinha, a cantora Suzana Salles servindo um cafezinho e sua colega Tatá Fernandes se lembrando de um show maluco, Arrigo Barnabé dando detalhes, o publicitário Ricardo Guará dando sua versão, o professor Luiz Tatit conceituando, o guitarrista Luiz Waack às lágrimas procurando músicas perdidas no computador, eles falam e se traem. Os olhares, as segundas intenções, a saudade, as boas risadas, Velloso flagrou o pessoal de guarda baixa. É bonito.

Um dos maiores achados de Velloso foi deixar de lado as estrelas. Ele deu um perdido nos “nomões”. Nem Zélia Duncan, nem Macalé, que aparecem generosos, dão depoimentos. Funciona como se Itamar não precisasse de aval. Sua obra, seu “em torno”, fala por si. Ele fala por si. Muito, por sinal.

Poucos mencionam, mas Itamar erigiu uma auto-elegia no último show que dirigiu e apresentou em varias cidades. Alquebrado pelo câncer que o levaria em junho de 2003, convidou a amiga Elke Maravilha para, toda de branco, interpretar a morte que vinha buscá-lo. “Ainda é cedo”, bradava para em seguida cantar com suavidade os versos de Alice, “devia ser proibido, uma saudade tão má, de uma pessoa tão boa”.

Quem não o conhece vai se sentir envergonhado, no mínimo. Quem já o admira, não diga que eu não avisei.


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