Inspirada no documentário As Canções, do mestre Eduardo Coutinho, a paulistana Aidê Resende, 34, acaba de colocar na rede mundial de computadores o portal do projeto Eu Sou o Samba. Nele, pretende reunir, até 20 de junho de 2016, 365 respostas de cidadãos do Estado de São Paulo para a pergunta “Que samba marcou sua vida?”.
Artista plástica de formação, Aidê idealizou o projeto há alguns anos quando atuava no Museu da Imagem e do Som – MIS de São Paulo, como coordenadora do núcleo educativo, e passou a ter maior afinidade com o universo audiovisual. Em 2014, inscreveu o projeto no ProAC, o Programa de Ação Cultural da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, foi contemplada e recebeu uma verba total de R$ 25 mil. Eu Sou o Samba percorrerá 23 localidades diferentes, entre bairros da capital e da região metropolitana, e cidades do interior e do litoral do Estado. Depois de concluídas as publicações, os vídeos ficarão disponíveis na rede por tempo indeterminado (acesse projetoeusouosamba.com.br).
O conteúdo diário veiculado por ela é produzido a quatro mãos com o apoio do amigo Davi Roque de Souza, que divide as tarefas de captação de imagem e de som, e de edição. Na rua, a metodologia de registro dos depoimentos funciona com poucas variáveis. Durante a semana, quando as pessoas passam esbaforidas pelos pequenos sets de filmagem, Aidê procura evitar abordagens e deixa que uma pequena lousa com a frase “Qual é o samba da sua vida?” faça o convite aos transeuntes. Nos fins de semana, quando o relógio dá uma trégua, ela costuma escolher locais de grande concentração, como praças públicas ou feiras, e chamar um ou outro cidadão para deixar seu depoimento. Os quase cem vídeos já registrados atestam que ambas táticas funcionam. “Há pessoas que mal leem a placa e já saem cantando para a câmera. Como a pergunta é à queima-roupa, também há quem diga: ‘Acho que eu sei qual é, mas vou dar uma voltinha para pensar melhor e retorno em instantes’. O mais legal é que a maioria acaba voltando.”
Longe de querer fazer do projeto um tratado sociológico, Aidê afirma que vem flagrando nuances sociais dessa velha paixão do brasileiro. Na Vila Madalena, segundo ela, é comum o registro de sambas de compositores sofisticados, como Paulinho da Viola, ou de mestres da velha guarda, como Cartola e Nelson Cavaquinho. Já em bairros periféricos, sobretudo entre os depoentes mais jovens, a predominância do pagode romântico é latente. Essa pluralidade de quem se deixa tocar pelo gênero, garante Aidê, é fator mais que perceptível. “O samba ainda permeia a sociedade brasileira. Outro dia entrevistei um metaleiro e até dele consegui tirar um. Ele estava no maior look Ozzy Osbourne, explicou que era vocalista de uma banda cover do Black Sabbath, mas fez questão de dizer que As Rosas não Falam, do Cartola, era a canção mais bonita já escrita na história da música.” Ela conclui seu raciocínio citando Nelson Sargento: “Taí a prova de que o samba agoniza, mas não morre”.
Claro, esta reportagem não poderia finalizar sem a revelação da canção que até aqui marcou a vida de Aidê. A romântica Ainda Mais, de Paulinho da Viola e Eduardo Gudin, é a resposta.
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